Record (Portugal)

“CARROS ELÉTRICOS SÃO SEXY E COOL”

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Mas também traz mais responsabi­lidade?

AFC – Sem dúvida! Mas não tenho medo da responsabi­lidade, porque represento muitas marcas a nível mundial. Mas obviamente que a responsabi­lidade aumenta, pois é difícil chegar ao topo em qualquer modalidade. Mas mantermo-nos lá será ainda mais complicado, mas estou preparado!

Começou na Fórmula E em 2014. Sente que evoluiu muito?

AFC – Quando comecei a Fórmula E era uma categoria nova, com motores elétricos e valores bem identifica­dos. Na Fórmula E é necessário pôr na balança a eficiência e a rapidez. A afinação do carro é diferente, mas fui buscar muitas coisas a outras categorias em que participei. Mas senti uma evolução grande. Agora estou menos nervoso a entrar no carro antes da corrida. Sei do que eu e o carro somos capazes. Quando o carro não era tão competitiv­o andei algumas épocas a meio do pelotão e isso deu-me também muita experiênci­a. Tornei-me mais completo.

Como explica a demora até conseguir este resultado?

AFC – É uma junção de elementos. Na Fórmula E qualquer um dos 24 pilotos pode, no dia certo, vencer uma corrida, o que torna o campeonato competitiv­o. Basta alguma coisa não estar bem e ressentes-te. No ano passado estava na BMW, com um bom carro, mas tivemos muitos dias maus sem saber porquê e não éramos competitiv­os. Podíamos ganhar uma prova e de repente andar em 15.º. A grande diferença da DS é termos menos dias maus. A DS já é campeã há dois anos e eu sabia que com esta equipa estaria rodeado das pessoas certas.

Quais são as principais diferenças entre conduzir um carro de F1 e um elétrico?

AFC – A Fórmula E tem uma grande ciência, que é a gestão das baterias, a eficiência que temos de ter a guiar o carro. As pessoas vão começar a sentir isso agora pois os carros elétricos vão entrar no dia a dia. Haverá também um grande fator de diversão porque se gerirmos bem um carro elétrico ele terá 400 quilómetro­s de autonomia, mas se gerirmos mal fazemos apenas 200. Essa componente vai trazer divertimen­to às pessoas que utilizem um carro elétrico. As nossas corridas são exatamente isso. Duram cerca de 50 minutos, mas se não gerimos vamos fazer apenas 30. Temos de ser muito eficientes. A Fórmula E é uma categoria mais verde, pois utilizamos apenas seis pneus por fim de semana, enquanto na F1 usam mais de 40. Mas, no fundo, o bichinho da competição é exatamente o mesmo. Temos pilotos que vêm da F1, a grelha é muito competitiv­a. Muitas marcas vêm das 24 Horas de Le Mans ou da F1.

Ao início fez-lhe confusão o som de um motor de Fórmula E?

AFC – Sim! Fez-me falta não haver barulho. Ouve-se muito o vento mas o carro não faz barulho. No início, os carros de Fórmula E tinham cinco mudanças mas agora têm apenas uma. É a maneira mais eficiente de andar com um motor elétrico. A potência é máxima a qualquer tipo de rotação, o que não acontece com um motor a combustão. Os carros elétricos estão a rebentar e a mostrar muita força. A Fórmula E veio mostrar que um carro elétrico é sexy, cool e muito mais rápido do que um carro a combustão. Fui um dos primeiros a acreditar na Fórmula E, mas confesso que não fui o primeiro. No início custou, mas agora é o sítio certo e estou muito contente por ser o campeão em título.

No início muitos desdenhava­m da Fórmula E mas agora há muitos ex-pilotos de F1 a competir.

AFC – Cerca de 70 por cento dos pilotos da Fórmula E já estiveram na F1. Felipe Massa, que foi vice-campeão do Mundo em 2008, atrás de Lewis Hamilton, Vandoorne, Buemi, Di Grassi ou Vergne. Isso traz competitiv­idade e ganhar-lhes é um orgulho.

Depois da festa do título falou das dificuldad­es que viveu e disse que pensou em desistir.

AFC – Isso aconteceu por volta de 2012. Senti que me estavam a faltar apoios para continuar a caminhada até à F1 e comecei a sentir que seria complicado entrar. Falei com o meu pai e decidimos que ia tentar uma última vez. Recebi uma proposta muito boa para correr na GP3, mas pouco tempo depois entrei para a Red Bull Junior Team e em 13 meses testei carros campeões do Mundo de F1 e fiz parte do sucesso da Red Bull como piloto de reserva e de testes. Em 2013 vivi outra fase

“A FÓRMULA E É UMA CATEGORIA MAIS VERDE. UTILIZAMOS SEIS PNEUS POR FIM DE SEMANA, ENQUANTO A F1 UTILIZA UNS 40” “CERCA DE 70 POR CENTO DOS PILOTOS DA FÓRMULA E JÁ ESTIVERAM NA FÓRMULA 1. GANHAR-LHES É UM ORGULHO”

complicada com a não entrada na F1. Tudo apontava para que aquele lugar fosse meu. Foi complicado, psicologic­amente, tal como foram os primeiros dois ou três anos na Fórmula E, sem armas para lutar. Se ficasse em 15.º numa corrida já seria um grande dia. Agora as coisas têm corrido bem. Já no ano passado, na BMW, tivemos um cheiro do que é lutar pelo campeonato e isso deu-me ainda mais força ao tomar a decisão de entrar na DS, que é, sem dúvida, a melhor equipa na Fórmula E, com os melhores motores elétricos. Rodeei-me das pessoas certas para ser campeão.

E o que diria o Félix da Costa de hoje ao dessa época?

AFC – Para nunca desistir! Pensava isso mesmo e sabia que conseguia guiar depressa.

Ser português terá contribuíd­o para não ter entrado na F1?

AFC – Estive muito perto de entrar na F1, na Red Bull. Fiz mais de 4 mil quilómetro­s como piloto de testes e estava realmente muito perto. As coisas também estavam a correr bem nas categorias de ascensão à F1 mas não entrei devido a vários fatores. Não gosto de dizer que foi por ser português. Temos um país pequeno, com menor poder de compra, e isso talvez tenha tido influência, mas ser português fez-me não desistir e voltar à carga. Mas lido bem com isso. A Red Bull não me deu a F1 mas deu-me uma carreira. Não olho para trás com arrependim­ento.

Fez algum trabalho específico na componente mental?

AFC – Sim, há muito anos, quando estava perto da F1. Agora, durante o confinamen­to, decidi trabalhar com um mental coach. Não estava mal psicologic­amente, mas queria fazer tudo para ser campeão mundial.

Foi fácil lidar com a parte física na fase final da época?

AFC – Falava muito no WhatsApp e por videochama­da com o meu preparador físico, a minha fisioterap­euta e o meu nutricioni­sta. Acompanhar­am-me todos os dias! O desgaste mental e a ansiedade é que tornaram as coisas complicada­s.

É um dos pilotos mais carismátic­os da Fórmula E.

AFC – Sou um sortudo porque faço o que mais gosto. Na fase em que estava perto da F1 esquecia-me de me divertir e ia para as corridas como se fosse um problema. Quando o capacete entra na cabeça só penso em ganhar, mas agora sempre que há uma oportunida­de para uma parolice sou o primeiro a agarrá-la.

Tinha algum ídolo na infância?

AFC – Não, mas olhava para os melhores como exemplos. Trabalhei perto do Vettel e aprendi muito com ele a nível técnico e de mentalidad­e. Mas creio que é ao Travis Pastrana que vou buscar este meu relaxament­o na abordagem às corridas.

“A RED BULL NÃO ME DEU A F1 MAS DEU-ME UMA CARREIRA. NÃO OLHO PARA TRÁS COM ARREPENDIM­ENTO”

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