Darwin, Pongolle e a Selecção
HÁ UMA PESADA EXPECTATIVA SOBRE DARWIN NÚÑEZ, UMA PRESSÃO COLOSSAL SOBRE VIEIRA E ESSE É O PRINCIPAL ÓNUS DE UM CHEQUE DE 24 MILHÕES
ç Na mitologia grega, reza a lenda que um dia Dédalo aconselhou o seu filho, Ícaro, a não voar perto do Sol com asas de cera para que estas não derretessem. Com arrogância, não escutou os conselhos do pai, voou próximo do astro-rei e acabou afogado no mar Egeu.
Com a mesma jactância, e escudado num proclamado poderio financeiro que não se cansa de apregoar, Luís Filipe Vieira decidiu não ouvir os sinais de um mercado em contracção e meteu 24 milhões – a mais cara de sempre no nosso país – por um rapaz que marcou 22 golos na sua carreira (16 na II Liga espanhola).
Bem pode Rui Costa dizer: “Estão a meter números na cabeça do jogador, isso não funciona assim”, para tentar aliviar a pressão sobre Darwin Núñez, no entanto, o príncipe de Florença sabe melhor que ninguém que as expectativas sobre o jovem uruguaio são ainda maiores depois do ridículo desastre da negociação de Cavani e do preço que o Benfica está a pagar para o resgatar de Almería, terra que foi cenário de muitos ‘western spaghetti’ como ‘O Bom, o Mau e o Vilão’ de Sergio Leone.
Por isso me tenho recordado de Florent Sinama-Pongolle. A mais cara contratação de sempre na época, idos de 2009/2010. Foram 6,5 milhões pagos pelos leões ao Atlético Madrid, uma expectativa enorme que redundou num terrível fiasco. Já passaram dez anos e, curiosamente, ainda sorrio com o elenco dos órgãos sociais de José Eduardo Bettencourt. Basta aos sportinguistas com menos memória irem à internet e ver os nomes que estavam no CD, MAG e CFD para perceberem que quem ali andava não pode fazer parte do futuro do Sporting, mas adiante. Certo é que Bettencourt caiu com um estrondo total também pelo fracasso do gasto no francês.
Não estou a antever que Darwin Núñez vá ser um ‘flop’, que fique bem claro.
Primeiro, não sou vidente; segundo, do que já vi reconheço enorme potencial ao uruguaio; por último, terá a sorte de aprender com Jorge Jesus, que já fez crescer tantos jogadores. Porém, quem vê o futebol de maneira racional e pouco cega por clubite, não pode deixar de considerar um enorme risco tão avultado gasto. José Eduardo Bettencourt reconhecia sobre Pongolle: “Tudo o que corre mal é um mau investimento.” Agora, há uma pesada expectativa sobre Darwin Núñez, uma pressão colossal sobre Vieira e esse é o principal ónus de um cheque de 24 milhões.
Já vi alguns Velhos do Restelo afirmarem que a nossa Selecção está a entrar numa curva descendente. Quem o afirma só deve estar a olhar para o bilhete de identidade de Cristiano Ronaldo ou de Pepe. Pois bem, ambos mantêm uma fome de vitórias e de conquistas que alimenta e motiva os mais novos. Depois, um País só entra em declínio quando não vê futuro à sua frente. Ora, no caso do futebol, Portugal tem muito talento jovem. Já entre os consagrados e basta espreitar a lista dos escolhidos por Rui Jorge para perceber que temos diversas minas de diamantes na formação dos nossos clubes. Portanto, vamos continuar a dar cartas. Quem está em decadência há mais de 500 anos são os Velhos do Restelo. Esses já deviam estar calados há muito tempo.
NÃO PODEMOS DEIXAR DE CONSIDERAR UM
ENORME RISCO TÃO AVULTADO GASTO
* Texto escrito com a antiga ortografia