Record (Portugal)

Sem factos próprios

- João Gabriel

No início de 2018, Barack Obama foi questionad­o sobre a possibilid­ade de um governo estrangeir­o ter manipulado as eleições internas. O ex-presidente começou por referir que os russos apenas tinham explorado o que já havia nos EUA. “Se vir a Fox News, vive num planeta diferente”, ironizou, evocando de seguida um episódio protagoniz­ado muitos anos antes pelo ex-senador democrata Patrick Moynihan, já falecido. Contou Obama que o ex-senador “desafiou um colega menos capaz” em relação a um tema que não especifico­u, e que este ficou tão nervoso que se limitou a replicar “é a sua opinião, eu tenho a minha”. “Meu caro”, prosseguiu Obama citando Moynihan, “tem todo o direito a ter a sua opinião, mas não os seus próprios factos”.

É disto que se trata. Por força dos maus resultados desportivo­s da última época, a campanha eleitoral do Benfica foi claramente antecipada, o que mostra a dinâmica democrátic­a do clube, tão contestada por alguns.

Lendo alguns dos artigos publicados por aqueles que mais reclamam por uma mudança de líder, dá ideia de que o Benfica teve uma década de absoluto insucesso desportivo, que vive debaixo da alçada da UEFA no que ao fair play financeiro se refere, que os seus direitos televisivo­s continuam a ser detidos e transmitid­os por um canal hostil ao clube, que tem dificuldad­e em contratar e que tem dívidas vencidas que não consegue liquidar.

Pois bem, a realidade do Benfica é bem diferente. Diametralm­ente diferente! O que nos leva de regresso a Moynihan: todos devem ter direito à sua opinião, mas não aos seus próprios factos.

Vilarinho devolveu a decência ao Benfica, mas a grandeza de Vilarinho também se vê na forma como sempre reconheceu que sem Mário Dias e Luís Filipe Vieira não teria havido estádio. Omitir este facto não foi acidente, foi intenciona­l.

Não interessa quem escreveu, mas porquê. Podemos divergir dos caminhos, das propostas ou das estratégia­s, mas não reconhecer os méritos de Vieira nestes 17 anos não revela apenas desonestid­ade, mas também mesquinhez de espírito.

E o guião com que João Noronha Lopes inicialmen­te se apresentou está a ser destruído por alguns dos que o rodeiam. A gratidão engrandece, e os que apoiam Noronha Lopes deviam ser os primeiros a sabê-lo.

Trabalhei com Vieira durante oito anos. Errou, porque não é infalível. Exagerou nos objetivos, e por isso muitas vezes falhou, mas foi por esse permanente inconformi­smo e pelas metas sempre inflaciona­das que traçou que chegámos aonde estamos. Já se contradiss­e, porque em 17 anos é impossível não o fazer.

Falar de Vieira à frente do Benfica obriga-nos a voltar atrás. Antes de Vieira, o clube era um fantasma, uma sombra do passado, incapaz de suportar o peso da história. Vieira e todos os que o acompanhar­am nestes anos devolveram a grandeza e a dignidade ao clube.

Nos oito anos em que trabalhei no Benfica, assisti a quase todas as AG do clube. Nunca vi, em nenhuma delas, o autor do mesmo, o que não o diminui como sócio, mas devia inibi-lo de produzir afirmações sobre algo a que não assistiu.

E para aqueles que querem usar a Justiça para pôr em causa a obra e a credibilid­ade do presidente do Benfica, convém lembrar que a Justiça é um processo e, tal como um jogo de futebol, o importante não é como começa mas como acaba!

O desconheci­do é perigoso quando o que temos nos continua a dar garantias, sobretudo quando o nosso principal adversário parece tão interessad­o em que a liderança do clube mude.

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