A grande conquista de Messi
LA PULGA TRANSPORTA A AURA DIVINA DE UM PERCURSO IMACULADO DE TÍTULOS E HONRARIAS PESSOAIS. FALTAM-LHE ARGUMENTOS PARA CONTRAPOR A PELÉ E MARADONA, MAS A COPA AMÉRICA DEVE SER SUFICIENTE PARA A SÉTIMA BOLA DE OURO DA CARREIRA
çQuando o duelo com o Brasil terminou, as câmaras foram automáticas a incidir sobre o protagonista da noite. A imagem foi a de Messi ajoelhado, cabeça no chão, alvo do primeiro impulso dos companheiros que correram em sua direção para abraçá-lo, beijá-lo, felicitá-lo, agradecerem-lhe... Dir-se-á que o momento condensava o exagero de confundir o supérfluo (glorificação da estrela maior) com o fundamental (Argentina campeã sul-americana). O desenrolar da festa não alterou a irreprimível valorização do feito de Leo (primeira conquista para o seu país) mas deixou o Mundo mergulhado numa suprema preocupação: mostrou de perto o rosto envelhecido do maior prodígio pós-Maradona, sinal de que o tempo é impiedoso com todos, incluindo com quem está destinado à eternidade.
Messi nunca teve preocupações divinas,
mas viveu a exaltar emoções, a estimular sentimentos e a encher-nos a alma; consolidou-se como génio criador de sucessivos milagres impensáveis e teve a arte de os associar não a uma contribuição supérflua para o espetáculo mas à inspiração que suportou vitórias e títulos. Tornou-se um dos melhores futebolistas da história, porque em mais de cem anos só dois ou três como ele foram capazes de dar a fantasia, assombro e genialidade o tremendo bónus da eficácia – são 1,70 m e 66 kg de jogador, 17 épocas no topo, com 672 golos pelo Barça, mais 76 pela Argentina.
Assegurou um lugar no céu
como promotor de insurreições perpétuas e inesquecíveis; de obras-primas avulsas e golpes fantasmagóricos do mais puro ilusionismo; do assombro que inspira companheiros, multiplica o perigo em cada intervenção, leva adversários à loucura e faz explodir estádios inteiros. Antes só precisava da bola para ser imparável, hoje acrescenta a intimidade com o meio e o sentido estratégico que lhe confere o estatuto de máxima referência coletiva. Ultrapassa oponentes como se fossem pinos, mas essas epopeias de exaltação deslumbrante foram acrescentadas de panóplia inesgotável de passes, tabelas e demais ações envolvendo cada vez mais gente na progressão. Pelé e Diego geraram sensações ainda maiores, mas Messi prova que Deus existe. E que o futebol, para lá de jogo, fenómeno cultural e indústria milionária, pode ser uma expressão de arte inigualável.
Leo é uma voz de protesto
contra o futebol formatado, metalúrgico, sem direito à diferença; um provocador que combate ideias repressivas que trituram o instinto dos grandes criadores; um artista sublime e imperturbável que nos emociona pela via do talento genuíno que está na origem das sucessivas obras-primas que executa. Foi o menino inocente e virtuoso, que se tornou expoente máximo da tendência criativa de quem só se realiza vencendo com imaginação e pureza; é hoje o veterano que agrega a essa atitude pueril de quem só queria ser feliz com a bola colada ao pé esquerdo, o comportamento como denominador comum das equipas que representa. Perdeu alguma espetacularidade mas tornou-se mais adulto, responsável e influente na ação global.
A Copa América não é o Mundial,
mas é a maior competição sul-americana de seleções. Vencê-la é um feito, mais ainda defrontando o rival de sempre, num palco sagrado da história: o Maracanã, onde Messi conseguiu a primeira conquista pela Argentina (entre as 37 em toda a carreira). Pelé leva uma coroa, mais de mil golos e três títulos mundiais de avanço; Diego é o símbolo de um país, o herói amado à escala planetária e o deus que partiu deixando memórias inatingíveis. Leo Messi transporta a aura divina de um percurso imaculado de títulos e honrarias pessoais. Faltam-lhe argumentos para contrapor à concorrência direta, mas a Copa América deve ser suficiente para ganhar a sétima Bola de Ouro da carreira.
LEO É UM ARTISTA SUBLIME E IMPERTURBÁVEL QUE NOS EMOCIONA PELA VIA DE UM TALENTO GENUÍNO