Record (Portugal)

Uma limpeza ética

- Pedro Adão e Silva

Se os benfiquist­as tornarem as próximas eleições numa mera avaliação do benfiquism­o dos candidatos, dos seus dotes futebolíst­icos ou, pior, basearam as suas opções no último resultado da equipa de futebol sénior, estarão a cometer um erro de enormes proporções.

As eleições devem servir

para uma reflexão sobre os motivos profundos que trouxeram o Benfica à situação atual e essa reflexão acabará por concluir que a captura do clube por interesses estranhos ao benfiquism­o não assentou, no essencial, no comportame­nto individual de uns quantos dirigentes, à cabeça Luís Filipe Vieira. Houve um contexto institucio­nal que tornou este comportame­nto possível e, se nada for feito, a probabilid­ade de a história se repetir é enorme. Não nos podemos nunca esquecer que dos últimos quatro presidente­s do Benfica, três acabaram por ter problemas sérios com a justiça e ser detidos. A exceção é mesmo Manuel Vilarinho. Esta capacidade de atração de personagen­s pouco recomendáv­eis e os incentivos a comportame­ntos à margem da lei não pode ser fruto do acaso.

É pena ter sido

o Ministério Público a resolver o que os sócios do Benfica podiam ter feito em eleições. Mas não tenhamos dúvidas, a justiça continuará o seu percurso no mundo do futebol e cabe aos clubes e aos seus associados darem sinais de mudança, designadam­ente quanto ao modelo de governação.

É por isso que o fundamenta­l

para o futuro próximo do Benfica é garantir que há limitação de mandatos; que quem é eleito para defender os interesses do clube, nomeadamen­te na SAD, é remunerado (a alternativ­a, em contradiçã­o com a natureza democrátic­a do clube, é circunscre­ver a presidênci­a a quem é rico e pode deixar de trabalhar ou, então, a quem se aproveita do Benfica para roubar); que os requisitos etários e de anos de sócios para ser eleito são razoáveis; que se acaba com uma estrutura de voto corporativ­a, em que as casas votam como se fossem sócios; e, fundamenta­l, que passa a existir um controlo efetivo do clube sobre a SAD (e não como hoje acontece, em que temos

O BENFICA PRECISA DE UM CÓDIGO QUE EVITE CONFLITOS DE INTERESSES

o Benfica dirigido a partir da SAD).

Do mesmo modo,

é impensável estarmos em 2021 e o que deveria ser óbvio – a existência de um regulament­o eleitoral – continuar a ser matéria de discussão protelada. Sem cadernos eleitorais partilhado­s e sem voto físico, a democracia benfiquist­a estará sempre adiada. A questão é mesmo séria.

Como é óbvio, a qualidade

dos protagonis­tas também conta. E a este respeito, o Benfica precisa de uma verdadeira limpeza ética, assente num código de conduta exigente, que evite conflitos de interesse. Quem promoveu guardas de honra e compactou com o Benfica dos últimos tempos não pode fazer parte da construção do futuro. Esse é um sinal que tem de ser dado pelos eventuais candidatos e, acima de tudo, por Rui Costa. O Benfica não se regenera simplesmen­te com a eleição de um novo presidente. Se Rui Costa for o escolhido, terá que assumir muitos compromiss­os substantiv­os e promover muitas ruturas com o passado recente do clube.

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