Uma limpeza ética
Se os benfiquistas tornarem as próximas eleições numa mera avaliação do benfiquismo dos candidatos, dos seus dotes futebolísticos ou, pior, basearam as suas opções no último resultado da equipa de futebol sénior, estarão a cometer um erro de enormes proporções.
As eleições devem servir
para uma reflexão sobre os motivos profundos que trouxeram o Benfica à situação atual e essa reflexão acabará por concluir que a captura do clube por interesses estranhos ao benfiquismo não assentou, no essencial, no comportamento individual de uns quantos dirigentes, à cabeça Luís Filipe Vieira. Houve um contexto institucional que tornou este comportamento possível e, se nada for feito, a probabilidade de a história se repetir é enorme. Não nos podemos nunca esquecer que dos últimos quatro presidentes do Benfica, três acabaram por ter problemas sérios com a justiça e ser detidos. A exceção é mesmo Manuel Vilarinho. Esta capacidade de atração de personagens pouco recomendáveis e os incentivos a comportamentos à margem da lei não pode ser fruto do acaso.
É pena ter sido
o Ministério Público a resolver o que os sócios do Benfica podiam ter feito em eleições. Mas não tenhamos dúvidas, a justiça continuará o seu percurso no mundo do futebol e cabe aos clubes e aos seus associados darem sinais de mudança, designadamente quanto ao modelo de governação.
É por isso que o fundamental
para o futuro próximo do Benfica é garantir que há limitação de mandatos; que quem é eleito para defender os interesses do clube, nomeadamente na SAD, é remunerado (a alternativa, em contradição com a natureza democrática do clube, é circunscrever a presidência a quem é rico e pode deixar de trabalhar ou, então, a quem se aproveita do Benfica para roubar); que os requisitos etários e de anos de sócios para ser eleito são razoáveis; que se acaba com uma estrutura de voto corporativa, em que as casas votam como se fossem sócios; e, fundamental, que passa a existir um controlo efetivo do clube sobre a SAD (e não como hoje acontece, em que temos
O BENFICA PRECISA DE UM CÓDIGO QUE EVITE CONFLITOS DE INTERESSES
o Benfica dirigido a partir da SAD).
Do mesmo modo,
é impensável estarmos em 2021 e o que deveria ser óbvio – a existência de um regulamento eleitoral – continuar a ser matéria de discussão protelada. Sem cadernos eleitorais partilhados e sem voto físico, a democracia benfiquista estará sempre adiada. A questão é mesmo séria.
Como é óbvio, a qualidade
dos protagonistas também conta. E a este respeito, o Benfica precisa de uma verdadeira limpeza ética, assente num código de conduta exigente, que evite conflitos de interesse. Quem promoveu guardas de honra e compactou com o Benfica dos últimos tempos não pode fazer parte da construção do futuro. Esse é um sinal que tem de ser dado pelos eventuais candidatos e, acima de tudo, por Rui Costa. O Benfica não se regenera simplesmente com a eleição de um novo presidente. Se Rui Costa for o escolhido, terá que assumir muitos compromissos substantivos e promover muitas ruturas com o passado recente do clube.