Herança, ruptura ou terceira via?
A NOVA EQUIPA DE RUI COSTA TEM DE SER À PROVA DE BALA, COM GENTE DE CURRÍCULO SÉRIO E NÃO COM O CADASTRO DO ‘VIEIRISMO’
Ficou bem a Rui Costa ter dado uma palavra de agradecimento a Luís Filipe Vieira a propósito do Seixal. Foi com ele que nasceu o projecto e já entraram nos cofres cerca de 500 milhões pelas pérolas ali formadas. Curiosamente, na alocução com teleponto em que o príncipe herdeiro anunciou o que já todos sabiam - a sua candidatura -, o prato forte foi o seu benfiquismo, do qual ninguém duvida. E a curiosidade é que todos os leitores se lembram de que o soberano caído em desgraça, e pela imensa maioria renegado, tinha sido sócio dos três grandes e que a determinada altura criou a percepção de que usava apenas o clube a que presidia para escudo dos seus interesses pessoais.
ACEITAR O VOTO FÍSICO E A ABERTURA DA BTV É DE DEMOCRATA, AO CONTRÁRIO DE VIEIRA
O benfiquismo de Rui Costa pode ter sabido a pouco para já, porém, em termos subliminares - e o mais importante da comunicação passa-se nesse patamar - a mensagem é poderosa e promete uma liderança sem pecados nem águas turvas e que decorrerá da sua única paixão. Falta conhecer a estratégia para o futuro, se os vices são os mesmos, a estrutura da SAD (desconfio que Silvio Cervan sairá) e perceber quem terá mais poder na Luz: José Eduar- do Moniz ou Domingos Soares de Oliveira e do segundo, nos últimos anos, saiu a estratégia do novo Benfica, a visão de Marca e o bom relacionamento com o sistema financeiro.
Rui Costa aceitar o voto físico e a abertura da BTV a outros candidatos é, pelo menos, de democrata. Ao contrário dos dias de Vieira onde a opacidade e a mordaça condicionavam a discussão de ideias. Continuo é a achar extraordinário como o novo timoneiro vai contar com um tapete vermelho bem esticado para poder desfilar tranquilamente, somente contestado por Francisco Benitez, pois os tubarões deixaram de sentir o cheiro de sangue e remeteram-se ao silêncio. Fica mal para quem se mostrou paladino da moralidade e bons costumes meter agora a viola no saco apenas porque Jorge Jesus está a ser o Jorge Jesus de sempre e a equipa carbura em pleno, auspiciosamente.
O que é evidente é que o Benfica tem de se concentrar no campo desportivo, é para isso que foi criado. Não pode ser importunado nos seus desígnios de glória pelas constantes visitas da Polícia Judiciária e inconcebíveis e incontáveis processos judiciais. A nova equipa directiva tem de ser à prova de bala, com gente de currículo sério, e não com o cadastro do “vieirismo”. Rui Costa tem três caminhos possíveis: assumir a herança sem mexer muito (o que seria uma desilusão), optar por uma ruptura (um risco porque as grandes instituições não podem sofrer abalos súbitos que representariam instabilidade para os parceiros) ou a terceira via da moderação e bom senso, separando o trigo do joio, ficando com o melhor da herança, mas introduzindo a transparência que o clube precisa. As estrelas dizem-me que o maestro vai entrar nesta estrada.
* Texto escrito com a antiga ortografia