A borbulha de Neymar
A DATA E O CONTRATO ASSINADO COM O BRASILEIRO EM 2017 PASSAM PARA A HISTÓRIA, SIMBOLICA E MATERIALMENTE, COMO OS FACTOS QUE INICIARAM A BORBULHA QUE LEVOU O BARCELONA E OUTROS GRANDES EUROPEUS À RUÍNA
O jornal ‘El Mundo’ publicou este mês os valores e as cláusulas do contrato assinado por Neymar em 2017. Foram 489. 228. 117 euros, pagos através do financiamento de um fundo soberano que tem atrás o emir do Qatar. A data e o contrato passam para a história, simbólica e materialmente, como os factos que iniciaram a borbulha que levou o Barcelona e outros grandes clubes europeus à ruína. E que está a falsificar a concorrência desportiva.
Depois desta borbulha inflacionista activada pela contratação de Neymar, o Barcelona pagou mais de meio milhão de euros pela renovação de Messi. E quem não é apoiado pelo privilégio de ter um oligarca ou um emir a definir a (in)finitude do cheque não consegue acompanhar a pedalada dos chamados ‘clubes-Estado’, particularmente do Manchester City, o Paris Saint-Germain ou o Chelsea. Ninguém consegue, por exemplo, tirar Mbappé do PSG. Ao Real Madrid já não chega um construtor civil milionário, como Florentino Perez, e a UEFA todos os dias mostra, abundantemente, que a sua noção de fair- -play financeiro é pouco menos do que uma palhaçada.
A importância deste fenóme- no, no entanto, está muito para lá do futebol. É inaceitável que, tanto as grandes organizações que lideram o futebol como as principais potências europeias e mundiais no plano político e económico, tolerem este estado de coi- sas em relação a países que violam grosseiramente os direitos humanos.
Da Rússia, vimos esta semana confirmada uma evidência quanto a um conhecido crime de Estado: a morte, por envenenamento, de um dissidente em Londres. Dos emiratos ára- bes, como o Qatar ou a Arábia Saudita, permanecem as sombras da conivência (para não ir mais longe) com o terrorismo islamita ou com assassinatos, como o do jornalista Jamal Khashoggi. Se o futebol não serve para uma diplomacia assente em sanções políticas e económicas, serve para quê!? Sobretudo quando já perdeu a relação de autenticidade e paixão com os adeptos e os povos, como é o caso de alguns destes clubes. E de que se queixava, há dias, Guardiola.
A finalizar, uma nota doméstica, que, não querendo entrar em adivinhações, só muito dificilmente não estará relacionada com uma tentativa de fuga às regras do fair-play financeiro. Rui Pinto está carregado de razão quando diz que o negócio da venda de dois jovens da formação do FC Porto ao Vitória de Guimarães, por 15 milhões de euros, deveria ser investigado. Se investigado por um verbo forte, então, melhor esclarecido. Até agora, o que se sabe, é só fumaça.