Record (Portugal)

“CHEGUEI A PENSAR IR PARA OUTRO PAÍS” E NTREVISTA PEDRO PICHARDO

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Não poderá ir a Cuba durante algum tempo. Afinal, quando é que pode lá voltar?

PEDRO PICHARDO – Não sei bem como explicar... mas eu, como atleta, não tinha direito a ter um passaporte normal. Só me davam acesso a um passaporte vermelho. Ainda o tenho comigo. Trata-se de um passaporte oficial do Governo que é entregue a quem sai do país para trabalhar fora por determinad­o tempo. É como se um soldado fosse numa missão. E se foges dessa missão, estás a trair o país. Eu fugi da missão. Por isso, não posso voltar lá. No meu caso disseram que era por um período de oito anos. Mas para que sejam oito anos certos eu tenho de ficar calado... por exemplo não poder estar a falar disto agora com vocês. Mas, contando desde 2017, ano em que me naturalize­i, em 2025 poderia ir a Cuba. Mas se um dia for lá nunca será com o passaporte português, porque não me reconhecem como português. Nesta altura só tenho uma nacionalid­ade, a portuguesa. Se quiser ir a Cuba tenho de ir à embaixada e tirar o passaporte cubano e ver se eles concordam ou me dizem se tenho de esperar mais algum tempo. Supostamen­te são oito anos, mas eles é que sabem.

Se for possível a sua ida a Cuba, seja em que altura for, gostava de lá voltar?

PP – Agora não. Os meus pais estão cá, a minha filha nasceu cá. Os meus irmãos estão lá, mas são mais velhos... na verdade não tenho pensado muito em voltar a Cuba.

Quando se referem a si como desertor, isso incomoda-o?

PP – Eu incomodo-me pouco. Para eu me incomodar com alguma coisa tem de ser sobre comentário­s dos meus pais e família, da minha filha. É muito estranho eu incomodar-me, mas sou assim.

Mas foi sempre assim ou tem a ver com o facto de ser atleta de alta competição, saber que não se pode distrair?

PP – Eu já passei por tanto na vida... fui uma criança que teve de se adaptar, como método de sobrevivên­cia. Passar a focar-me no que queria. Se perder tempo com distrações não se consegue o que se quer na vida.

Não esconde alguma amargura quando fala de Cuba. Mas o que é que trouxe de lá para Portugal que jamais esquecerá e se desligará? PP – Os meus santos, a minha religião, Iorubá. Todas as medalhas e prémios ficaram em Cuba. Estou num país novo, com novos títulos e medalhas.

Aconselha alguém visitar

“TROUXE DE CUBA OS MEUS SANTOS, A MINHA RELIGIÃO. TODAS AS MINHAS MEDALHAS E PRÉMIOS FICARAM LÁ...”

Cuba?

PP – Não. Se alguém me perguntar, não vai querer ir depois do que lhe disser. Porque falarei da realidade do país e não dos locais turísticos. Não haverá alguém que vá a uma praia paradisíac­a em qualquer país e que diga mal. Os turistas não vão a Cuba, vão a uma praia onde ficam uma semana num hotel e dali não saem. Agora se saírem do hotel, então depois venham falar comigo e digam-me que Cuba é bom.

O Pedro pode exercer em Portugal o direito de voto. Já o fez, por exemplo, nas presidenci­ais de janeiro passado?

PP – Não, ainda não votei.

Mas gostava de o fazer este domingo para as eleições autárquica­s?

PP – Nunca pensei muito nisso. Mas, sim, gostava um dia de poder votar, mas nunca gostei de me envolver na política.

Acredito que já tenha conhecido um pouco de Portugal, que sítios que já visitou e gostou?

PP – Gostei muito do Algarve, Albufeira, Monte Gordo... até já visitei Cuba no Alentejo [risos]. Tantas piadas que fizeram com isso que tive de ir lá.

Certamente que recebe muitas mensagem nas redes sociais ou por outras vias. De todas, há alguma que o tenha deixado mais emocionado, ou que tenha marcado a diferença em relação às restantes?

PP – Sim. Uma mensagem que recebi no Instagram de uma rapariga. Respondi-lhe, agradeci-lhe e trocámos algumas mensagens. Ela motivou-me muito quando cheguei a Portugal e depois de toda a polémica da minha naturaliza­ção, com o meu colega de Seleção [Nelson Évora], onde diziam que ou não sou português, ou não falo bem português, ou porque recebi a naturaliza­ção muito rápida... No início foram muitas as mensagens deste tipo que recebi e que me deixaram muito triste. Essa rapariga mandou-me então uma mensagem muito motivadora, com grande apoio.

Essas mensagens que recebeu negativas, algumas chegaram a ser insultuosa­s?

PP – Muitas... E quando aconteceu tudo isso cheguei mesmo a pensar em ir para outro país, caso os insultos e a polémica continuass­em. E disse para mim mesmo: ‘Só vim para aqui praticar desporto, não vim para ter problemas seja com quem for’.

E foi a tal mensagem que recebeu dessa rapariga que o fez continuar em Portugal?

PP – Sim. Foi uma mensagem muito boa, positiva.

Conhecia essa rapariga?

PP – Não, não conhecia. Era anónima, era só uma rapariga do Instagram..

Lê as mensagens todas?

PP – Tudo. Leio e vejo tudo. Eu só treino e estou em casa com a família. Por isso tenho tempo para ler e ver tudo o que dizem sobre mim e ver televisão. Quando acordo a primeira coisa que faço é ligar no canal da CMTV. Vejo e oiço as notícias. Gosto de estar orientado, de sair para a rua e saber o que se passa.

“PARA EU ME INCOMODAR COM ALGUMA COISA TEM DE SER SOBRE COMENTÁRIO­S DA MINHA FAMÍLIA, DA MINHA FILHA”

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PRÉMIO. Pedro Pichardo esteve na nossa redação e recebeu o ‘Record de Ouro’, que lhe foi entregue pelo diretor Bernardo Ribeiro
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DISPONÍVEL. O campeão olímpico à conversa com Record

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