Record (Portugal)

“NADA PODIA CORRER MAL NAQUELE DIA”

-

Mais de mês e meio depois da conquista do ouro olímpico, que emoções e momentos ainda retém desse momento histórico?

PEDRO PICHARDO – O momento mais importante, além do último salto, quando já sabia que tinha ganho a medalha de ouro, foi quando a recebi, quando ouvi e cantei o hino português. Foi toda esta cerimónia. Foi muito importante para mim. Lembro-me que, a outra ocasião em que cantei o hino, seja o português ou o cubano, foi em 2012, quando fui campeão mundial júnior. Neste intervalo não tinha cantado o hino. E chegar a um país novo, que é o meu país agora, e cantá-lo foi uma emoção muito grande... porque todos estavam à espera de ver se eu sabia ou não cantar. Por isso vai ser uma lembrança que vai ficar na minha cabeça para sempre.

O Pedro já sabe a letra e a música toda do hino português?

PP – Sim, sei tudo. Mas por causa do sotaque há algumas palavras que não digo da maneira correta, mas vai melhorar com o tempo... ainda só estou cá há quatro anos e já vi muitos que estão cá há mais tempo do que eu e não sabem cantá-lo.

Mais do que saber as palavras todas, considera que o mais importante é ‘sentir’ o hino e isso transparec­er para as pessoas?

PP – O mais importante para mim é o que eu sinto cá dentro, como me sinto português. Em conversa com a minha agente, a Daniela, estava a dizer-lhe isso mesmo: ‘Eu sinto-me português, na minha cabeça não está aquele cubano’. As pessoas podem achar que estou a negar o país onde nasci, mas, para mim, sou e sinto-me português, apesar de ainda não falar bem a língua.

Em Tóquio’2020, o Pedro foi sempre apontado favorito à conquista do ouro. Esse facto colocou em si uma pressão acrescida ou algum receio de poder não conseguir o título olímpico?

PP – Receio não, mas um pouco de pressão sim. Sabia que tinha um país a olhar para mim, não podia falhar naquele dia. Era a única maneira que tinha para agradecer ao país que me acolheu. Com resultados. Nada podia correr mal naquele dia.

Essa pressão sempre funcionou como motivação, vontade de não querer falhar, de retribuir?

PP – Sim, claro. Em todas as situações gosto de ter pressão, de ter aquela rivalidade. Caso contrário acontece o que tem sucedido nas últimas competiçõe­s, onde faço um, dois saltos. Vejo que não há muita rivalidade, por isso não vale a pena estar a fazer os seis saltos. Se não houver pressão para mim fica mais complicado.

O facto do Christian Taylor, campeão no Rio’2016 e no Mundial’2019, não ter estado em Tóquio’2020, colocou em si algum sentimento de alívio?

PP – Não, de maneira nenhuma, porque estava à espera de uma maior luta com o atleta do Burkina Fasso [Fabrice Zango]. Já tínhamos tido um bom confronto antes e estava à espera que sucedesse também nos Jogos Olímpicos. Mas como já sou atleta há muitos anos, consigo perceber quando algum atleta não está em boa forma. E no aqueciment­o reparei que alguma coisa se passava com ele. Fiquei tranquilís­simo, mas à espera de a prova começar para ver se se confirmava. E não me enganei. Ele saltou bem, mas estava à espera de mais, que fizesse 17,80/17,90 metros.

Já que fala de marcas, o recorde mundial de Jonathan Edwards, com 18,29 metros, de 1995, está ao alcance?

PP – Acho que não é difícil. Eu e o meu treinador, o meu pai, estamos a trabalhar para melhorar algumas coisas e obviamente levam tempo. Eu não conseguia saltar mais de 17,90 desde 2018. E mesmo nesse ano só consegui uma vez, 17,95, e este ano consegui aproximar-me mais da minha marca e estabilizá-la [17,98 em Tóquio’2020, que é recorde nacional]. O trabalho que estamos a fazer está a dar resultados. No próximo ano é continuar com uma boa saúde física e continuar a tentar. Se conseguir juntar algumas coisas que estamos a trabalhar devo chegar lá.

Como atleta cubano o Pedro já passou os 18 metros, fasquia que agora coloca como objetivo enquanto português. Para si será mais importante bater o mítico recorde mundial do Edwards ou conquistar novo título olímpico em Paris’2024?

PP – É uma pergunta complicada. Se me tivesse feito essa pergunta há seis anos, obviamente que iria escolher bater o recorde mundial, porque no passado o meu pensamento era o de fazer grandes saltos e não de conquistar títulos. Mas hoje, no país onde estou, tenho percebido e entendido que é preciso ter títulos. Quando cheguei a Portugal já tinha grandes saltos, mas não tinha títulos. E muitos pensavam: ‘Salta bem, mas não tem títu

“SEI TUDO [HINO PORTUGUÊS]. JÁ VI MUITOS QUE ESTÃO CÁ HÁ MAIS TEMPO DO QUE EU E NÃO SABEM CANTÁ-LO”

“QUANDO CHEGUEI A PORTUGAL JÁ TINHA GRANDES SALTOS, MAS NÃO TINHA TÍTULOS. ISSO TAMBÉM ME MOTIVOU”

los’. Isso também me motivou a chegar aos títulos e este ano levei tudo para casa (Europeu, Jogos Olímpicos, Liga Diamante, recorde nacional, melhor marca mundial do ano). Gostaria de bater o recorde mundial, mas se não o conseguir, prefiro a medalha olímpica. É um recorde muito antigo e não será fácil chegar lá. Só seis passaram a barreira dos 18 metros.

Até aos Jogos Olímpicos de Paris’2024 são apenas três anos...

PP – Quero continuar a ganhar tudo. Agora que percebi a importânci­a de conquistar títulos quero ganhar tudo, vou trabalhar para que isso aconteça.

 ?? ??
 ?? ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Portugal