A mudança numa traquitana
Rui Costa é, neste momento, o dono da bola. Se tiver vontade, pode gerir o jogo a seu prazer e, fundamental, está ao seu alcance mudar estruturalmente o Benfica, fazendo na Direção os mesmos passes de rutura que lhe víamos fazer em campo. E a ambição tem de ser mesmo essa: romper com o passado recente – nas práticas, nos protagonistas e na exigência.
Se bem que Rui Costa
se tenha desdobrado em declarações que marcam uma rutura com a opacidade que tem sido regra (por exemplo, dando conta de que é preciso transparência em relação às transferências de jogadores), a afirmação mais surpreendente continua a ser de José Eduardo Moniz, na carta em que anunciou que não seria recandidato: “Fez-se mais pelo espírito democrático do Benfica nestas semanas, do que em muitos anos”.
Tendo em conta
que os protagonistas do Benfica das últimas semanas são os mesmíssimos que acolitaram Luís Filipe Vieira durante mais de uma década, o reconhecimento do óbvio – as práticas democráticas do Benfica envergonham os pergaminhos do clube – não deixa de espantar. Mas, como sempre, mais vale tarde do que nunca e, agora, é o momento de mudar.
Rui Costa tem a seu favor
o facto de ser um ex-atleta e um ídolo dos adeptos, o que o coloca numa posição singular. Tendo sido parte do vieirismo, Rui Costa tem, contudo, uma condição diferente da dos seus colegas de direção. Se isso não o isenta de responsabilidades, torna-o viável como o principal agente da transformação do Benfica. Por isso mesmo, podia liderar uma mudança estrutural e devia tê-lo feito sozinho, formando listas sem nenhum dos nomes que fez parte do elenco de Vieira e abrindo um novo ciclo no Benfica. A forma como José Eduardo Moniz – que era visto como o seu principal conselheiro na Direção – abdicou de continuar nos órgãos sociais tornava o exercício mais fácil.
NESTES MOLDES, NÃO SE VÊ COMO RUI COSTA PODE FAZER A TÃO FALADA MUDANÇA
Não o fez e optou por uma evolução na continuidade, preservando elementos do passado e procurando introduzir alguma mudança. Infelizmente, sabemos como esses processos evoluem e o mais provável é termos, no essencial, continuidade e pouca ou nenhuma mudança.
A lista que apresenta
é uma autêntica traquitana, que mistura dirigentes que, no mínimo, por terem sido coniventes com Vieira, para protegerem o Benfica, se deviam ter afastado, com representantes de um movimento que nunca passou de um simulacro tosco de oposição. Apoiado numa traquitana, não se vê como é que Rui Costa vai concretizar a mudança que tem apregoado e que o colocaria num lugar único na história do Sport Lisboa e Benfica.