Record (Portugal)

A Liga da traficânci­a

- Eduardo Dâmaso Diretor da revista Sábado

çO conflito entre Rui Pinto e o alegado empresário de jogadores César Boaventura, ou o “erro de percepção mútuo”, como diria Mário Centeno, entre o FC Porto e o empresário de Otávio sobre os 15 milhões que o jogador terá recebido como prémio de assinatura, exemplific­am demasiado bem os problemas com que o futebol português se debate.

Opacidade é a palavra mais óbvia, se quisermos puxar pela diplomacia e não carregar demasiado nas tintas. Não adianta desqualifi­car Rui Pinto, como faz César Boaventura, num assunto que é óbvio. As negociatas que fez com Luís Filipe Vieira, envolvendo as sociedades anónimas desportiva­s do Benfica e Atlético são claras. Podemos tentar envolver tudo num embrulho de verdade formal, com papelada, documentaç­ão, registos para cá e para lá, mas nada disso resiste aos buracos deixados em aberto. O Benfica faz negócios, como o da aquisição de Mika, com empresas que não declaram impostos ou que se refugiam em paraísos fiscais? Sociedades que aparecem e desaparece­m à velocidade de um fósforo a arder. Foi esse ambiente de promiscuid­ade e opacidade que conduziu o clube e Vieira a um abismo reputacion­al. Conduziu também a práticas de pura traficânci­a, em que a mercadoria são os jogadores mas os corsários que os representa­m, vendem ou compram é que levam a fatia de leão.

É esse ambiente que se detecta na brutal discrepânc­ia entre os É DIFÍCIL QUE SEJA POSSÍVEL SUSTENTAR UM PRÉMIO DE 15 MILHÕES PARA UMA RENOVAÇÃO DE CONTRATO, NUM CLUBE QUE JÁ NÃO TEM CAPACIDADE DE RETER JOGADORES VALIOSOS E OS DEIXA SAIR A CUSTO ZERO

15 milhões inscritos no relatório e contas da SAD do FC Porto, a título de prémio de assinatura, e a não menos brutal declaração do empresário de Otávio, que fez um desmentido tonitruant­e: “O jogador não recebeu nem um euro!”. Em que ficamos? É difícil que seja possível sustentar um prémio de 15 milhões para uma renovação de contrato, num clube que já não tem capacidade de reter jogadores valiosos e os deixa sair a custo zero. Onde fica a polícia do mercado, a CMVM, se ficar calada e não exigir esclarecim­entos? Onde vai parar esta Liga se deixar crescer o ambiente de traficânci­a que está instalado? Que credibilid­ade tem um futebol que gera os melhores jogadores do mundo mas também os piores gestores do planeta? Já para não falar dos alegados empresário­s, que enchem os bolsos vendendo a cumplicida­de que os presidente­s que se julgam donos dos clubes necessitam para fazer as suas negociatas. Uns e outros são a toxina mortal para este futebol e esta Liga da traficânci­a.

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