Assinava já empates para ir ao Mundial
çComo comenta as polémicas contas do FC Porto, nomeadamente a do prémio de assinatura de Otávio?
Em qualquer profissão estão os craques, os muitos bons, os bons, os bonzinhos, os maus e os horríveis. Mas há várias profissões de máxima responsabilidade em que os maus e horríveis duram muito pouco e têm que se dedicar a outra coisa, mesmo os que são licenciados. Uma delas são os advogados de direito desportivo. Conheci muitos, desde os bonzinhos aos craques e tive o privilégio de trabalhar com autênticos génios. Quando era diretor desportivo do At. Madrid, o clube estava na segunda divisão, no pior momento da sua história, com intervenção judicial e quem mandava e controlava o clube era o governo de Espanha. As engenharias financeiras que estes génios inventavam, dentro da legalidade, faziam com que o governo as aprovasse. Muitas destas ideias foram pioneiras e hoje utilizam-se em todo os clubes. Graças a eles, o clube –sem 1 euro – sobreviveu 2 anos debaixo de água, mas conseguiu sair do inferno. Digo isto, Pedro, porque não sou licenciado em direito desportivo e para dar uma opinião sincera sobre a tua questão tinha que falar com um destes génios para tentar explicar-te bem como funcionam alguns negócios do futebol, que se podem fazer de várias maneiras e com engenharias financeiras diferentes. Mas vamos lá ver se consigo algo, mesmo admitindo que para mim seria mais fácil explicar com a boca do que escrevendo... Os clubes, nos prémios de assinatura, pagam a uma empresa que trata dos interesses dos jogadores e são elas a suportar os impostos no país onde estão sediadas as empresas e nunca os clubes. O mesmo acontece com as comissões que os clubes pagam ao agente do jogador ou intermediário. São sempre estes a pagar os impostos da cifra acordada. O clube só paga o IVA, se a empresa for do mesmo país. Os clubes só pagam impostos do contrato do jogador que entra na liga e federação... Por exemplo, os jogadores que não recebem 1 euro no prémio de assinatura e fazem um contrato de 4 anos a ganhar 2 milhões de euros líquidos por ano, o custo bru- to que sai ao clube por ano são 4 milhões de euros. Nos 4 anos de contrato o custo bruto para o clube seriam 16 milhões e o joga- dor receberia 8 milhões líquidos. Agora, se um jogador quer ganhar estes 8 milhões líquidos em 4 anos e o clube diz que não pode gastar 16 milhões e o máximo a que pode chegar neste período de tempo são 14 milhões, neste caso têm que ir para o plano B ou C. Então, com uma estrutura de engenharia financei- ra perfeita, sempre dentro da lei, pode fazer-se de várias maneiras. Por exemplo: se dos 14 milhões de euros que o clube tem orçamentado para os 4 anos me- teres 1,5 milhões anuais no contrato que entra na liga e federação, o clube paga 6 milhões e o jogador recebe 3 líquidos. Sobram 8 milhões que serão pagos ao jogador durante os próximos 4 anos, em tranches em agosto e dezembro, como prémio de assi- natura. Se destes 8 milhões que a empresa do jogador tem de pa- gar impostos, num país onde a taxa seja só 25 por cento ou menos, somas os 3 milhões líquidos que vai receber e verás que o jogador pode ganhar ainda mais que os 8 milhões líquidos que pretendia. E o clube pode também poupar facilmente 2 milhões e ter o jogador no plantel. Só falei do prémio de assinatura, mas, se juntas os direitos de imagem, mais engenharias financeiras podem ser feitas, ajudando a solucionar situações que pareciam impossíveis.
Se o FC Porto, dos 15 milhões do prémio de assinatura que tem de pagar ao Otávio, pagasse mais 15 de impostos já teriam um custo bruto de 30 milhões, mais o contrato que vai entrar na liga e federação de 8 milhões líquido para o jogador em 4 anos, o que representaria mais 16 milhões! Se o jogador não fosse vendido durante esse período teria um custa de quase 50 milhões! O Otávio ganharia mais dinheiro que maioria dos jogadores portugueses no estrangeiro: Com salários assim voltavam todos a Portugal... Temos que ser realistas e hoje, do novo contrato, não sabemos quanto vai ganhar o Otávio líquido por ano. A única coisa que sabemos é que até 2025 o FC Porto vai ter um custo bruto de 15 milhões. Vamos imaginar que nesta primeira época o custo bruto seja de 3,5 ou mesmo 4 milhões. Se Pinto da Costa não renovasse com Otávio por esse valor, aí sim seria estranho e polémico. Mas fez o que tinha de fazer e em março renovou o contrato. O Otávio é um jogador muito importante para o Sérgio Conceição como era eu para o Artur Jorge, mas, se amanhã chega uma proposta interessante será vendido como eu fui e dezenas de craques que passaram pelo clube. Se fores adepto portista, podes dormir descansado. O clube podia perder dinheiro se não renovasse, mas agora, com contrato até 2025, se o Otávio não tiver nenhuma lesão grave o FC Porto ganhará sempre dinheiro, porque Pinto da Costa tem a faca, o queijo, o garfo e prato na mão. Tem o controlo total da situação. Se em agosto o FC Porto tinha uma proposta pelo o Otávio de 25 milhões (mais 5 em objetivos fáceis de concretizar) e não o vendeu, imagina quanto deve estar preocupado Pinto da Costa sobre as polémicas contas do FC Porto e o prémio de assinatura de Otávio...