Fazer hoje a história de amanhã
RICARDO HORTA PODE ESTAR PRESTES A CUMPRIR O SONHO DE REGRESSAR À LUZ E FAZÊ-LO PELA PORTA GRANDE, COMO ESTRELA DO FUTEBOL. É UMA PEDRA PRECIOSA PARA QUEM O PRETENDE MAS SEM PREÇO PELO QUE REPRESENTA PARA O SP. BRAGA
Desequilibra em ações breves e fantasmagóricas, nas quais interfere na história com um toque, um desvio, um remate, mas também pela via de participações constantes, que orientam e fortalecem a produção coletiva; Ricardo Horta pode ser o executor de uma ação decisiva em forma de tiro, logo como pistoleiro implacável nas leis que dita, ou o maestro à volta de quem a orquestra se une para harmonizar a produção e fortalecer as armas; pode ser o herói cuja responsabilidade é assinar as obras que dão vida aos resultados ou a figura imensa e altruísta que multiplica o valor global e se torna denominador comum do seu desenvolvimento e expressão artística.
Suportado em números esmagadores que o colocam na lenda do Sp. Braga, RH tem decisão para tomar ao fim de seis épocas no clube: ser o príncipe de uma classe operária em luta pela glória máxima, num confronto desigual com as maiores potências nacionais, ou desistir desse propósito e engrossar um dos exércitos mais poderosos, com maiores probabilidades de êxito. No fundo trata-se de escolher entre ser o Erwin Sánchez do Sp. Braga, o génio boliviano que soube esperar até ser campeão no Boavista, em 2001, ou aproveitar a evidência do reconhecimento universal para ser reforço de um dos crónicos candidatos ao título.
RH tornou-se não apenas a referência técnica do mais forte outsider do futebol português, mas o líder absoluto, o capitão indiscutível, a força maior de uma ambição capaz de motivar toda a nação bracarense. O tempo acrescentou talento, qualidade, visão e variabilidade ao seu futebol; conferiu-lhe autoridade e uma liderança esmagadora, que lhe permite transformar sugestões em ordens, opiniões em verdades absolutas, simpatias em paixões arrebatadoras. Tornou-se um jogador especial.
A confiança e o sucesso fizeram-no evoluir para uma figura gigantesca, tão grande que, quando a bola começa a rolar, se confunde com o próprio Sporting Clube de Braga; ele é o homem que carrega todos os sonhos, vontades e ilusões, como congregador de uma ambição coletiva de ousada grandeza, mas que já mostrou ter pernas para andar. Sob a orientação de treinadores conceituados, que ajudaram a consolidar o fenómeno em que se transformou (Carlos Carvalhal é o mais recente capítulo de uma história da qual também fazem parte Abel Ferreira, Sá Pinto e Rúben Amorim), RH é um daqueles raros protagonistas que estão a fazer hoje a história de amanhã.
Com 91 golos (está a dois de ser o melhor marcador de sempre dos arsenalistas, superando Mário Laranjo, que atuou entre 1947 e 1954) e 42 assistências em seis épocas no clube, RH já não é só uma paixão dos amantes do futebol: construiu sólida base estatística para se aproximar do consenso como dos melhores jogadores portugueses, que cumpre na perfeição todas as funções do espaço ofensivo. Sim, não será fácil tirá-lo daquele enquadramento, por ser o rosto mais definido e valioso do projeto liderado por António Salvador, mas o interesse de Rui Costa e Roger Schmidt, que o consideram importante na máquina encarnada para 2022/23, por certo deixará marcas no seu coração benfiquista.
RH pode estar prestes a cumprir o sonho de regressar à Luz e fazê-lo pela porta grande, como estrela do futebol. Mas preveem-se difíceis as negociações, pela habitual intransigência do presidente bracarense em defender os seus interesses mas também por não se saber até onde a águia está disposta a voar para resgatar o jogador. É natural. Um futebolista como RH configura o caso invulgar de uma pedra preciosa para quem o pretende mas sem preço que faça justiça ao que joga e representa para o Sp. Braga.
RH JÁ NÃO É SÓ UMA PAIXÃO DOS AMANTES DO FUTEBOL: A ESTATÍSTICA É ESMAGADORA