Os números vão falar por ele
HENRIQUE ARAÚJO NÃO SE PERDERÁ POR PRESENÇA CONSTANTE E DIVERSIDADE DE ARGUMENTOS. ESCOLHEU SER ESPECIALISTA DE UMA FUNÇÃO QUE EXIGE PERÍCIA, PRESTÍGIO CRESCENTE E ESTATUTO CONSOLIDADO. SERÁ UMA AUTORIDADE NA MATÉRIA
HA NÃO DEVE TER MEDO DO FUTURO, PORQUE ESTÁ CONDENADO A SER UM ENORME PROTAGONISTA
çO golo é valioso de mais para ser encarado sem a responsabilidade das coisas sagradas; obriga a um crescimento rápido, à precisão de gestos e movimentos e ao desenvolvimento de um determinado temperamento associado a valores adultos como experiência, serenidade e maturidade. O primeiro foco dos avançados mais jovens é o recurso ao espírito juvenil da participação, do altruísmo e do recreio com a bola, porque a habilidade e entrega incondicional prestigiam aos olhos exteriores. Henrique Araújo tem um deambular sigiloso nas zonas de ataque, que não pressupõe interesse na participação do bordado da construção; quando entra em cena é para consolidar o perigo da iniciativa (foge da marcação, recua, dá-se ao jogo e toca a bola sempre com o critério, aumentando a ameaça) ou para ser ele próprio a concretizar, por norma a um toque.
Quando acelera e escolhe um
destino para se desmarcar é porque tem encontro marcado com a bola num lugar que o instinto definiu – raramente falha as intenções ou se engana no caminho. O seu padrão futebolístico, rico mas pouco diversificado, mede-se melhor pela pontaria do que pela magia; mais pelo talento de se tornar feroz e implacável no ataque ao espaço e à bola do que pela contribuição criativa. HA não tem pudor em reclamar, sem tocar a mesma música de quem o rodeia, um lugar de destaque na orquestra. Tem bons motivos para fazê-lo. Caracteriza-se por uma inteligência humilde que lhe permite esconder as limitações e potenciar as virtudes, seguindo o princípio para a vida de que os sentidos devem estar sempre despertos para aprender – mais ainda quando tem apenas 20 anos.
HA é um predador à procura do
momento para o golpe fatal; é-lhe indiferente que seja ele a provocá-lo ou que o consiga por distrações alheias – todos à volta sabem que o descuido pode ter consequências nefastas, porque ele está ali com objetivos inconfessáveis: aproveitar com instinto felino e frieza glaciar cada instante em que possa aplicar os dotes tremendos de finalizador. Nunca é intimidado pelo jogo, muito menos pela bola, prova de quem tem uma técnica cristalina, que lhe permite descobrir soluções para cada dificuldade.
O golo não permite alimentar
os ímpetos juvenis de se mostrar, participar na obra e zelar pelo equilíbrio estrutural do coletivo. HA não se perderá nessas vias de presença constante, contribuição sustentada e diversidade de argumentos. Escolheu ser especialista de uma função que exige concentração, perícia, prestígio crescente e estatuto consolidado, de modo a tornar-se uma autoridade que inspire os seus e faça tremer os outros – em 2021/22, contando todas as competições em que participou, assinou o impressionante registo de 22 golos em 39 jogos.
Os avançados de tenra idade
costumam seduzir-se pelos valores genuínos que os enaltecem como futebolistas e seres humanos, mas que os prejudicam como goleadores. HA interpreta a função indiferente ao que pensam os outros, porque foi precoce no entendimento de que uma equipa se fortalece com a harmonia de virtudes diferentes, cabendo-lhe contri- buir, especializando-se, no momento mais aclamado e valioso do futebol: o golo. A vida dá muitas voltas mas, mesmo numa fase embrionária da carreira, ninguém acredita que tenha reservado lugar na história como virtuoso da bola. Não deve ter medo do futuro, porque está condenado a ser protagonista. Os números vão falar por ele. Se tiver as oportunidades merecidas no ataque da potência em que o Benfica de Roger Schmidt ameaça tornar-se, essa expressão grandiosa pode consolidar-se no imediato.