Record (Portugal)

“AINDA NÃO PERDI A VONTADE DE JOGAR”

A cada manhã, o mesmo espírito: o desejo de treinar, jogar, competir e ganhar. Tudo como nos tempos felizes de juventude. Miguel Veloso, 37 anos, internacio­nal A português por 56 vezes, joga no Pisa, onde dá aulas aos mais novos. Leão de coração que Itáli

- FILIPE ALEXANDRE DIAS

Aos 37 anos ainda mexe e está agora no Pisa. Por que decidiu iniciar mais esta etapa?

MIGUEL VELOSO - A questão de continuar a jogar foi somente pela paixão que tenho pelo desporto que sempre fiz desde pequenino e por sentir-me bem. Obviamente que são tantas coisas importante­s que é necessário para um jogador poder continuar. Posso dizer que sou sortudo no sentido de que, graças a Deus, nunca tive uma lesão muito grave. E isso obviamente ajuda qualquer jogador a poder continuar ou prolongar a sua carreira. Infelizmen­te que, nos últimos anos no Verona tive pequenas lesões nos gémeos. Foi a única coisa a impedir-me de ter a continuida­de que queria.

Ⓡ A vontade de competir não o larga?

MV - A realidade é que ainda me sinto bem, com vontade de acordar todos os dias de manhã e de fazer aquilo de que mais gosto. E depois há a competitiv­idade que tenho dentro de mim. Mas neste período também tenho a vontade de poder transmitir aos mais jovens aquilo que eu passei na carreira. Poder transmitir-lhes algo também me leva a continuar. Já me vejo muito nesse papel.

Ⓡ Como tem sido passar a ser o professor?

MV- Dá-me prazer. O treinador Ivan Juric, que me levou para o Verona, já me tinha treinado no Génova e ao poder voltar a trabalhar com ele nasceu a minha curiosidad­e para a outra parte, que é a de não ser jogador. A cada ano que passava interessav­a-me cada vez mais pelos métodos. E depois a relação que tenho com os mais jovens, que é ótima. Não sei se é pelo carisma que tenho, pela pessoa que sou, ou por aquilo que fiz na minha carreira, mas todos me respeitam e todos me ouvem. Eu gosto de transmitir conhecimen­to aos mais jovens.

Ⓡ E porquê o Pisa?

MV - O míster Aquilani ligou-me e perguntou se aceitaria dar uma ajuda. Falei, obviamente, com a minha família e acabei por aceitar com enorme prazer.

Ⓡ Como está a ser a experiênci­a num clube com tradição, mas na Serie B?

MV - É uma competição diferente. O míster tem ideias bem definidas, como ter o maior tempo possível a bola. Começámos bem a nível de resultados e depois tivemos derrotas que não nos deixaram progredir também a nível mental. Mas temos melhorado. Não quer dizer que consigamos subir e em primeiro, mas temos tudo para chegar ao playoff.

Depois de atuar nas principais ligas portuguesa, italiana e ucraniana, como é agora disputar um segundo escalão. Já disse que era diferente, mas é mais competitiv­o?

MIGUEL VELOSO - Pelo que tenho visto nestes 12 jogos que realizei, não quero dizer que seja mais difícil, mas tem uma competitiv­idade distinta, onde as equipas ainda estão todas muito atrás. Procuram defender bem, não sofrer golo e depois tentam sair em contra-ataque. Se fazem 1-0, depois têm 11 jogadores atrás da linha da bola. Jogando em casa não quer dizer que ganhes. Por exemplo, no nosso caso, ganhámos mais jogos fora do que em casa .... É muito duro, mas é uma experiênci­a nova para mim.

Ⓡ Mas o regresso breve do Pisa à Serie A é um desejo secreto ou um objetivo assumido?

MV - Encaro esse cenário como possível. Mas todos temos de nos mentalizar de que não será fácil, porque nada é garantido. Vai implicar muito sacrifício, muito trabalho e muita dedicação da parte de todos. Mas, como disse anteriorme­nte, encontrei um clube muito organizado, que dá todas as possibilid­ades aos seus jogadores para poderem melhorar.

Ⓡ O Miguel foi para Itália em 2010 e nunca mais voltou, sendo que pelo meio passou 3 anos na Ucrânia. Portugal ‘perdeu-o’ de vez?...

MV - [Risos] Não, porque obviamente sou português e de Lisboa. Principalm­ente Lisboa, de que tenho tantas saudades. Mas a vida foi assim. A minha esposa é italiana, os meus filhos acabaram por nascer, os dois, em Milão e a nossa estrutura é aqui. Vivemos na Suíça, mas perto da fronteira com Itália.

Ⓡ Quando saiu do Sporting a sua ideia era a de um dia regressar?

MV - Com todo o respeito, queria sair do Sporting porque queria algo mais. Não quer dizer que o Sporting não fosse grande, mas queria viver outras coisas. O Sporting deu-me tudo, como jogador e como homem. A base do que hoje sou, foi o Sporting que ma deu. Devo-lhe isso. Tenho enorme respeito e carinho pelo clube. Portanto, eu desejava sair, mas depois chega aquele momento de ‘eu quero sair, eu quero sair’ e depois quando sais, ficas naquela... ‘E agora?’ Mas Itália também me deu tudo, obviamente. A minha família, a minha esposa, os meus filhos ....

Ⓡ É verdade que esteve para voltar ao Sporting? Pode esclarecer o que se passou?...

MV - Surgiu algo para poder voltar ao Sporting, sim. Mas também é verdade que surgiram também outras propostas para poder sair de Itália. Contudo, atendendo às minhas circunstân­cias familiares, acabei por decidir

“É VERDADE QUE FUI ABORDADO PARA VOLTAR AO SPORTING, MAS POR DECIDI FICAR EM ITÁLIA POR MOTIVOS FAMILIARES”

ficar em Itália. Tinha nascido o meu filho. E então acabei por tomar essa opção. Mas foi somente uma abordagem.

Ⓡ É fácil presumir que está fora de questão regressar a Portugal ....

MV- Quando chegas aos 34, 35, toda a gente pensa que és velho. Por isso, não sei dizer se este será o meu último ano, mas obviamente que a porta está a fechar-se ou a ficar mais pequenina. Mas penso que o final será aqui em Itália.

Ⓡ Com o final próximo já sabe o que vai fazer a seguir?

MV - Penso nisso... e não penso.

Ⓡ Tem um plano ou não?

MV - Não, plano não tenho, sinceramen­te. Durante o período de Covid aqui em Itália, tive a oportunida­de de participar num programa que a federação criou para fazer um curso de treinador de dois anos num só. Mas para poder fazer o próximo nível tenho que deixar mesmo de jogar. Já tenho a base, mas para poder fazer os próximos níveis tenho que deixar de jogar. É uma coisa que nos últimos anos me tem agradado bastante mas, sou sincero quando digo que não tenho um plano até porque gosto de viver dia após dia e depois logo vejo quando as coisas se encerrarem. O meu grande objetivo é este ano poder dar o meu melhor e continuar a demonstrar a todas as pessoas que, apesar da idade, sejas jovem ou sejas velho, podes jogar sem problemas e com gosto. Quero estar disponível para o

“AQUILANI [TREINADOR DO PISA] DIZIA-ME QUE O JORGE JESUS ERA UM LOUCO, MAS QUE ADOROU MORAR EM LISBOA”

Pisa em todos os jogos e dar o maior contributo possível à equipa, mas também poder a fazer crescer alguns jovens da nossa equipa.

Ⓡ Mas mantém que não tem na cabeça definido o momento em que vai parar?

MV - Não, não tenho. Enquanto tiver e sentir esta competitiv­idade todos os dias, esta vontade de de jogar e poder ainda levantar-me e fazer aquilo de que mais gosto, irei continuar. Quando essa vontade desaparece­r, aí vou perceber que chegou o momento.

Ⓡ É treinado por Aquilani, ex-jogador do Sporting, no Pisa. Já falaram sobre o clube?

MV - Sim. Falámos um pouco sobre isso ao início. Ele recordou-me que durante o seu período no Sporting teve o Jorge Jesus como treinador. Disse-me que é um louco, mas que percebe imenso de futebol. Foi por causa do Jorge Jesus que lhe atraiu mais e mais esta ideia de poder vir a ser treinador. E depois. obviamente, disse-me que adorou estar em Portugal e que se vive muito bem em Lisboa.

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LÍDER.Aos 37 anos e pleno de experiênci­a Miguel Veloso é um dos líderes do Pisa e gosta de transmitir tudo o que viveu aos mais jovens

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