Dizer não à seleção
São cada vez mais os jogadores que optam por abandonar o futebol internacional muito antes de pendurar as chuteiras. Gerd Müller e Cruyff fizeram-no quando ainda era raro, mas os casos multiplicam-se. De Varane e Özil, a Rafa e João Mário
Não é uma decisão que se tome de ânimo mais leve, mas é cada vez mais comum entre futebolistas de elite. Só no último mês, craques como Raphael Varane, Ben White ou o benfiquista Fredrik Aursnes renunciaram ou rejeitaram a chamada às respetivas seleções nacionais, apesar de ainda estarem longe do final da carreira. São cada vez menos os que prolongam o seu percurso internacional até ao dia em que penduram as chuteiras. O adeus precoce, pelo contrário, torna-se mais comum e mais abrupto, despegando-se dos timmings tradicionais, como o final das grandes competições. Os clubes já não têm reservas em declarar-se contra as viagens e jogos-extra a que o futebol de seleções obriga. Deco, diretor-desportivo do Barcelona, avisou recentemente que não faz intenção de permitir que os jogadores dos culés disputem Europeu e Jogos Olímpicos no próximo verão. “Jogar duas competições é demasiado. Vamos tentar que não aconteça”, deixou. Treinadores e futebolistas também não têm problemas em defender a redução das datas FIFA. Convocado pela Noruega para dois jogos particulares de março, Erling Haaland admitiu estar mais concentrado no próximo duelo com o Manchester City frente ao Arsenal e atirou aquele que será um dos principais motivos para a onda de abandonos. “O calendário está sobrelotado, mas a única coisa que podemos fazer é cumpri-lo. Só não se pode esperar o mesmo rendimento. Não podem esperar que dispute 70 jogos e faça mil sprints em cada um. Quanto mais jogos, menor será a qualidade”, atirou. Jürgen Klopp, treinador do Liverpool é outro contestatário. “Queixam-se que os jogos são menos interessantes. Temos de começar a pensar mais nos jogadores que têm de jogar provas sem sentido, como a Liga das Nações. Se ligar a um selecionador e pedir para não chamar este ou aquele jogador, ele dirá que também está sobre grande pressão”, apontou. Mas afinal o que se passa com este, outrora sagrado, espaço das seleções? Internacional português nos anos 70 e 80, Augusto Inácio aponta a Record que representar o país “já não é visto como o ponto mais alto da carreira”, como era numa altura em que ouvir as palavras “estás convocado” eram sinónimo de “alegria máxima” para qualquer futebolista. Há agora “outros fatores” que pesam na mente dos futebolistas na, ainda assim, sempre difícil hora de dizer não à hipótese de representar o país.