SÁBADO VIAJANTE

A Sicília de Leonardo Sciscia e da família Florio

Um clássico dos anos 60 que marcou a literatura italiana e as narrativas sobre a máfia, outro mais contemporâ­neo, que marca a explosão mediática do interesse sobre a bela mas contraditó­ria ilha mediterrân­ica. Excelentes companhias de viagem.

- POR EDUARDO DÂMASO

TODO O MUNDO SICILIANO

ASicília é um mundo, A sempre o soubemos. Podemos conhecê-la através de todo o tipo de lugares-comuns da indústria turística. Tem praias de sonho, águas cálidas do Mediterrân­eo, história por todos os cantos, património clássico de gregos e romanos, fenícios e normandos e uma gastronomi­a que a eleva ao altar dos deuses de todas as latitudes.

Há cidade mais bela que Taormina e os seus postais eternos do Etna e do Teatro Grego, imortaliza­da por Woody Allen mas hoje pela série White Lotus, que a transformo­u no grande polo de atração do mais desejado dos turistas, o norte-americano?! Há cidade mais misteriosa, clássica, arrepiante e bela que Palermo?

A Sicília é um manancial inesgotáve­l de clichés turísticos. Mas também é uma ilha carregada de densidade histórica, de simbolismo­s e contradiçõ­es que a fazem oscilar entre a luminosida­de humanista e uma negritude lunar incontorná­vel. E esse é o caminho mais fascinante para verdadeira­mente conhecer a bela ilha mediterrân­ica.

Seguindo por aqui, peguemos na obra do grande Leonardo Sciascia. O Dia da Coruja, um clássico de Sciascia, sem desmerecer Todo Modo, O Contexto, O Conselho do Egipto, foi finalmente editado em Portugal, pela Presença. Il Giorno della Civetta (Turim, Einaudi, 1961), edição original, é o livro que representa toda a força novelesca e política de Sciascia. O maestro de Racalmuto é mais do que um dos grandes escritores que desmontara­m a máfia. Sciascia foi mais longe. Criou a metáfora da sicilianiz­ação do mundo: qualquer sítio pode ser a Sicília sempre que o poder é gerido a partir da dupla verdade, moral e contabilid­ade.

As deambulaçõ­es do continenta­l capitão Bellodi na investigaç­ão do assassinat­o de Colasberna representa­m essa geografia de todas as ancestrais tensões italianas.

No país que inventou o fascismo e consagrou a democracia cristã como única solução admissível em democracia, Bellodi é republican­o, honesto, antifascis­ta (estamos em 1960) e cai no paraíso dominado pela astúcia da sobrevivên­cia. Um grande guia da ilha e, sobretudo, do mundo siciliano. ●

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O DIA DA CORUJA LEONARDO SCIASCIA Presença

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