OS HOMENS QUE TRAMARAM SALGADO
Em três depoimentos explosivos, José Maria Ricciardi, o empresário Pedro Neto e o contabilista Machado da Cruz afirmaram que o ex-líder do BES ameaçou Passos Coelho e Portas, comprou Sócrates e destruiu a PT.
Os testemunhos de Ricciardi, Pedro Neto e do contabilista Machado da Cruz que incriminaram Ricardo Salgado
São quase 10 horas de depoimentos recolhidos pelo Ministério Público (MP) e que visam directamente Ricardo Salgado, o antigo presidente do Banco Espírito Santo (BES), na Operação Marquês. Os testemunhos de José Maria Ricciardi, do empresário Pedro Pereira Neto e do antigo contabilista do Grupo Espírito Santo (GES), Francisco Machado da Cruz, contêm revelações surpreendentes sobre os meandros dos negócios que envolveram o BES, o antigo primeiro-ministro José Sócrates e os investimentos ruinosos da Portugal Telecom (PT). Um mundo de ligações perigosas, acordos e negociatas de bastidores, contratos fictícios e muito dinheiro suspeito à mistura. Mas não só.
No caso do controverso depoimento de Ricciardi, o antigo presidente do BESI chegou até a relatar diversos episódios ao procurador Rosário Teixeira e ao inspector tributário Paulo Silva que terão envolvido Ricardo Salgado, Pedro Passos Coelho e Paulo Portas num jogo de alegadas ameaças e pressões da parte do então poderoso banqueiro que liderava o BES. Isto pouco antes da derrocada do império financeiro controlado pela família Espírito Santo. A SÁBADO considera que há manifesto interesse público na divulgação destes relatos, aproximando-os o mais possível daquilo que os respectivos intervenientes disseram aos investigadores. Os relatos já são do conhecimento de todos os arguidos constituídos num processo cujo fim da investigação deverá novamente ser adiado, para Setembro. Questionado por escrito pela SÁBADO se queria comentar o conteúdo dos três testemunhos recolhidos pelo MP na Operação Marquês, Ricardo Salgado não respondeu até ao fecho desta edição. Já Paulo Portas, que foi apontado ao MP por Ricciardi como visado num dossiercomprometedor na posse de Salgado e do BES quando estava no Governo, reagiu assim à SÁBADO: “Obviamente não conheço conversas entre terceiros nem depoimentos de quem quer que seja. Nunca ouvi falar disso, nem naquela altura nem depois. E como já tenho uma espécie de cátedra em dossiers inventados, não lhes atribuo relevância - parece-me até que se tivessem fundamento não faltaria quem os tivesse usado ao longo de 20 anos de vida política.”
Por escrito, Portas reconheceu que esteve no BES após o anúncio da “demissão irrevogável” de 2013, mas que isso teve apenas uma interpretação: “Nos dias seguintes (e não no dia seguinte) ao meu pedido de demissão encontrei-me com, pelo menos, uma dezena de personalidades - empresários, financeiros, dirigentes sociais, diplomatas - que quiseram expressar-me as suas preocupações quanto à situação política. O dr. Ricardo Salgado foi um deles - mas não o único do sector - e isso foi noticiado e é tão público como o local do encontro (o banco que então dirigia). Não tem portanto qualquer segredo ou mistério.” Também Pedro Passos Coelho negou na prática o conteúdo do episódio relatado por Ricciardi ao MP. Apesar de dizer que não comenta “declarações ou depoimentos prestados seja por quem for e cujo conteúdo desconhece”, o actual líder do PSD quis deixar claro à SÁBADO que “nunca foi ameaçado pelo dr. Ricardo Salgado e muito menos envolvendo qualquer referência a ministros.”