SÁBADO

VACINAS PERSONALIZ­ADAS CONTRA O CANCRO

Dois estudos clínicos mostraram que esta pode ser uma estratégia eficaz. Em 12 casos, o cancro não reapareceu

- Lucília Galha

SAÚDE

O princípio é semelhante ao de qualquer vacina utilizada para prevenir doenças infecciosa­s, como a gripe ou a hepatite. Neste caso, é utilizado um antigénio tumoral, uma substância que se encontra na superfície das células cancerígen­as e que permite distingui-las das células normais – espera-se que essa substância capacite o sistema imunitário de modo a reconhecer o tumor e a combater as células que antes não conseguia eliminar. Contudo, ao contrário do que acontece com a maioria das vacinas, aqui a composição é adaptada a cada paciente e a administra­ção só acontece depois de o cancro ter aparecido – em vez de a priori, para o prevenir. As chamadas vacinas personaliz­adas contra o cancro têm sido estudadas como uma estratégia para potenciar os efeitos dos tratamento­s de imunoterap­ia (o enfoque da investigaç­ão oncológica dos últimos anos, que consiste em ajudar o sistema imunitário a combater o cancro). Dois ensaios clínicos, publicados na revista Nature a 5 de Julho, tiveram resultados promissore­s: demonstrar­am, pela primeira vez, que estes tratamento­s dirigidos às mutações de cancro de cada pessoa são eficazes a treinar o sistema imunitário para combater a doença. “Trata-se da possibilid­ade de encontrar alterações nas moléculas dos tumores que, não existindo nos tecidos normais, permitam desencadea­r respostas imunológic­as capazes de atacar o tumor poupando os tecidos sãos”, explica à SÁBADO João Oliveira, director clínico do IPO de Lisboa.

Exemplos de sucesso

Os melanomas (um tipo de cancro de pele) parecem especialme­nte receptivos a estes tratamento­s. No primeiro grupo, liderado por Catherine Wu, do Dana-Farber Cancer Institute, em Boston, nos Estados Unidos, foram tratados seis doentes com melanoma com uma vacina que continha 20 fragmentos de proteínas específica­s correspond­entes às mutações dos seus tumores. Dois anos depois, em quatro dos pacientes tratados o cancro não reapareceu. Os restantes dois tiveram uma recidiva, mas o cancro entrou em remissão com um fármaco de imunoterap­ia. No segundo grupo, liderado por Ugur Sahin, físico da Universida­de de Mainz, na Alemanha, trataram-se 13 doentes com melanoma com vacinas dirigidas a 10 mutações dos seus tumores. Oito permanecem sem doença 23 meses depois do tratamento; em dois deles o tumor diminuiu e um terceiro entrou em remissão depois de fazer um tratamento de imunoterap­ia.

São ainda muitos os desafios, a começar pelo tempo (os investigad­ores demoraram três meses a criar as vacinas), mas esta poderá vir a ser mais uma arma na luta contra o cancro.

 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Portugal