SÁBADO

Francisco Varatojo (1960-2017)

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Marta. Chama-se Marta e passa a vida a espirrar de um lado para o outro, às vezes com dores de cabeça, outras só de ouvido, sempre com o nariz entupido. Alergias, alergias, alergias... Até que um dia Marta tropeça num programa matinal de televisão e a sua vida nunca mais será a mesma: Francisco Varatojo explica com o seu ar tranquilo os malefícios dos lacticínio­s durante as alergias. Marta ouve-o e segue-o sem medo: afasta o leite da rotina diária e o resultado imediato é surpreende­nte: a alergia pura e simplesmen­te desaparece. O guru da macrobióti­ca é um homem peculiar, de sorriso permanente e discurso erudito. “Leio desde os cinco anos de idade” – está explicado. Natural de Leiria, é um apaixonado por desporto e também por outras áreas menos convencion­ais, como espiritual­idade e alimentaçã­o. “Aos 16 anos, conheci a macrobióti­ca através de um amigo meu. Depois li um livro de uma autora portuguesa, Rosa Maria Calado, intitulado Macrobióti­ca, Como e Porquê. Por questões relacionad­as com a prática desportiva, já era mais ou menos vegetarian­o e o meu interesse aumentou.”

E de que maneira: um ano depois, Francisco Varatojo viajou para os EUA. “Estudei com o Michio e a Aveline Kushi. Quando regressei a Portugal, em 1980, comecei a trabalhar a tempo inteiro na educação macrobióti­ca: aulas, seminários, consultas, agricultur­a, etcétera.” Começou aqui a nascer o percurso profission­al por excelência, de mãos dadas com a família. “Casei com a Eugénia em 1982 e juntos começámos, em 1985, o Instituto Kushi de Portugal, que mais tarde se tornou o Instituto Macrobióti­co de Portugal.” Ao longo de mais de 30 anos, o Instituto ensina a milhares de pessoas os fundamento­s de uma vida mais saudável e de uma alimentaçã­o adequada.

As perguntas atropelam-se. Para quem estiver interessad­o em iniciar a viagem pelo mundo da comida macrobióti­ca, o que fazer? Francisco é prático, em cinco actos. “1) Aprender a cozinhar, 2) mastigar muito bem, 3) não comer três horas antes de dormir, 4) ler livros e 5) artigos sobre o assunto e ter uma mente aberta.” Há mais. Francisco tem solução para qualquer problema. Para quem

Guru de uma causa, visionário de um conceito de vida, tornou-se uma referência internacio­nal da macrobióti­ca. O mergulho, outra paixão, matou-o: foi vítima de um acidente no Cabo Espichel CONHECEU A MACROBIÓTI­CA AOS 16 ANOS; AOS 25 FUNDOU O INSTITUTO MACROBIÓTI­CO

sofre de muitas enxaquecas, por exemplo. “Recomendo a sopa de miso de cevada, não pasteuriza­da, à qual podes acrescenta­r cebolinho e cenoura. Exclui ainda todo o tipo de alimentos refinados e processado­s, como açúcar, farinhas de forno brancas, carnes de difícil digestão e lacticínio­s.” Para quem sofre de hérnia do hiato, outro exemplo: “Cereais integrais em todas as refeições principais, em especial millet e arroz integral, sem esquecer legumes verdes levemente cozinhados, nomeadamen­te abóbora e cebola com abundância.” O mestre do comer bem para viver melhor também gostava de pôr tudo por escrito, em jornais, em revistas, em livros, vários, como Mente Sã, Corpo São ,ouo Livro de Diagnóstic­o Oriental ,ou Remédios Caseiros. Outra paixão era o mergulho. Na quinta-feira, 6, não voltou do que foi um derradeiro mergulho ao largo do Cabo Espichel. O corpo foi encontrado no dia seguinte. Deixou em choque amigos e seguidores. Anos antes, ao falar da morte de um amigo, ensinara-lhes, afinal, como se superam adversidad­es deste tipo: “Com o tempo… Na vida temos de lidar com situações destas. Aprendemos a lidar com isso. Faz parte da vida.”

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LUIS GRAÑENA

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