Eis o evangelho anticristão de Pippo Delbono
Vangelo é a mais recente criação de palco do italiano Pippo Delbono. A peça imagina uma missa lírica pouco católica e está em cena a 15 e 16 de Julho no Teatro D. Maria II, em Lisboa, integrado no Festival de Almada
Antes de morrer, a mãe do encenador, dramaturgo, actor e realizador italiano Pippo Delbono pediu-lhe, perguntando: “Pippo, porque não fazes uma peça sobre Jesus?” Assim nasceu Vangelo, ainda que não exactamente como esperava a mãe ultracatólica e conservadora de Pippo Delbono. A peça estará em cena no Teatro D. Maria II a 15 e 16 de Julho, integrada na programação do Festival de Teatro de Almada. Na peça que o italiano criou em Zagreb, com actores da sua companhia – a histórica Compagnia Pippo Delbono – há lugar também para bailarinos e actores do Teatro Nacional Croata. Por isso o espectáculo é falado e cantado em croata e em italiano, e por isso tem tido legendagem electrónica nos teatros por onde passou desde a sua estreia mundial, em Janeiro de 2016. Lisboa não será excepção.
“Vangelo é um espectáculo com dança, música e cinema”, explica Pippo Delbono ao GPS por telefone a partir da Sicília, onde estava a acompanhar outro Vangelo: o documentário cuja estreia internacional aconteceu no festival Doclisboa em 2016. “O filme entra no teatro e inventa uma linguagem teatral, não é o cinema que se vê por aí”, explica, salientando que o filme e a peça não são objectos independentes: “Há alguma interferência entre ambos.” No documentário, Pippo é um director artístico que visita um centro de refugiados. Ao ouvir histórias e incertezas destes refugiados quanto ao seu futuro, Pippo tem a ideia de encenar um evangelho através das vidas destas pessoas – algumas aparecem na peça em forma de vídeo.
A peça surge tanto das histórias quanto da música original composta por Enzo Avitabile. “Para mim a música é fundamental na dramaturgia”, conta Pippo. “Não é que faça teatro e depois pense na música. A música e a palavra valem o mesmo para mim... As palavras alimentam a música e a música alimenta as palavras.”
A peça “pode ser entendida como uma missa, mas não católica”, conta o italiano, budista desde 1989, e que já não entra numa igreja “há muitos anos”. Em Vangelo há um líder, uma figura que tanto pode estar no fundo da sala a dar indicações, como pode estar entre o público ou mesmo em palco. Essa figura é Pippo. “Nesse sentido, sou como um padre.” Um antipadre? Pippo percebe mal, mas apressa-se a responder. “Anticristo? Sim... como um anticristo.”
“A PEÇA PODE SER ENTENDIDA COMO UMA MISSA, MAS NÃO CATÓLICA”, DIZ AO GPS O ACTOR E ENCENADOR ITALIANO PIPPO DELBONO