A tenebrosa democracia brasileira
Lula da Silva foi condenado em todas as instâncias da justiça brasileira a 12 anos de prisão. O seu processo e respectiva sentença foi analisado e decidido por mais de uma dezena de juízes. A sua defesa apresentou recursos em todos os patamares possíveis. O habeas corpus foi utilizado até ao limite. Lula defendeu-se nos tribunais, nos órgãos de comunicação social e conseguiu transformar o seu processo numa causa política à escala planetária. Os tribunais, como uma das expressões essenciais da democracia brasileira, funcionaram melhor e mais rápido do que em muitas outras latitudes, incluindo a portuguesa, onde se permite aos arguidos endinheirados atrasarem a justiça anos a fio. Basta analisar, já não o processo de Isaltino Morais mas as manobras dilatórias de Armando Vara, no Face Oculta, e de José Sócrates, no Marquês. Uma parte da esquerda portuguesa, porém, insiste em ver no processo de Lula “um golpe da direita reaccionária, racista, fascista”. Para essa esquerda, o caso do mensalão, um verdadeiro atentado ao processo de decisão parlamentar em democracia, deve fazer parte do golpe. O assalto à Petrobras, esse sim um golpe bilionário, nunca existiu ou existiu apenas na parte em que foi praticado pela direita. Sim, a direita também meteu a mão no baú! A influência da Odebrecht, não apenas no Brasil mas em mais de 20 países de todo o mundo, incluindo Portugal, com a sua já célebre fábrica de corrupção, também nunca deve ter existido. Pelo menos para corromper algum político de esquerda...
Por favor, guardem esse vosso fanatismo como quiserem mas não o transformem numa característica identitária de toda a esquerda. A forma como o processo Lula (e o processo Sócrates) são entendidos por essa esquerda – que atravessa o BE e o PCP – representa um verdadeiro insulto à inteligência de quem vota à esquerda mas não enfileira na manada obediente dos pregadores de serviço. Basta ouvir o inacreditável comentador Sócrates na TVI para perceber como uns estão ao serviço dos outros e vice-versa.
A síndrome de Nero em Alvalade
O Sporting é por estes dias o palco de um conflito verdadeiramente canibal. A piromania (e mitomania) de Bruno de Carvalho transformou o clube no território de uma guerra sem quartel que só acabará num divã de psicanálise ou, pior, quando tudo tiver ardido. Atacado por uma verdadeira síndrome de Nero, Bruno de Carvalho ameaça incendiar tudo se não conseguir concentrar o poder absoluto na sua pessoa. Seria apenas um problema pessoal e, portanto, nada grave, se o Sporting não fosse uma instituição de grande história, de enorme responsabilidade social e de reconhecida utilidade pública. Bruno de Carvalho não tem a culpa toda. Ocupou um espaço que lhe foi deixado pelos notáveis do costume – que gostam de ir à bola mas não de ter os incómodos próprios de gerir um clube –, e criado por outros, que precisam de aplicar algum excedente orçamental sem dar muito a cara. É uma criatura com alguns criadores que agora não sabem como voltar a metê-la dentro da caixa. Estão bem uns para os outros. O clube é que não tem culpa.
A festa do cinema italiano
Ao fim de 11 anos, a Festa do Cinema Italiano, que todos os anos se celebra em Portugal pelo mês de Abril, é um grande exemplo de cultura, criação e manutenção de públicos. É também um belo exemplo de uma Itália onde a cultura procura sobreviver com os apoios do Estado mas, tantas vezes, apesar dele. O cinema é uma das melhores narrativas dessa resistência heróica.