CUCHA & WINNIE
PARA CUCHA CARVALHEIRO, O MONTE DE TERRA QUE “ENGOLE” WINNIE NESTES LINDOS DIAS! “É UMA AMPULHETA QUE SE VAI ENCHENDO À MEDIDA QUE O TEMPO PASSA”
ANDOU ANOS “a namorar” Happy Days, a peça de Samuel Beckett que protagoniza, a partir de quinta-feira, 12, na Sala Mário Viegas do lisboeta São Luiz – onde chegou a ensaiar, mas nunca estreou, o papel de Pozzo de À Espera de Godot, do mesmo autor, justamente com Mário Viegas. “Circunstâncias da vida foram adiando o espectáculo, mas acho que tenho uma estrelinha”, confessa Cucha Carvalheiro ao GPS, continuando: “Na verdade, acho que agora, quase com 70 anos, estou mais preparada do que nunca para interpretar este texto, que requer não só maturidade artística como também idade, pois é sobre o tempo, o envelhecimento.” Mais: no ano passado, fez um monólogo que ela própria escreveu Cândida ou o Pessimismo, “porque não havia dinheiro para ter mais gente em cena” e, sem ser propositado, “foi o aquecimento perfeito, o treino ideal para a Winnie”. MUITAS VEZES traduzida como “Dias Felizes”, Happy Days ressurge no São Luiz como Lindos Dias! “com exclamação incluída, para manter a componente irónica da expressão original”, diz Cucha (que para a encenação desafiou Sandra Faleiro, que a tinha dirigido em O Jardim Zoológico de Cristal), citando a justificação do tradutor, o músico-poeta João Paulo Esteves da Silva. Neste clássico de fôlego, Winnie encontra-se enterrada – até à cintura no primeiro acto, tirando objectos da mala (de um batom a um revólver) enquanto comenta a vida, ocasionalmente virando-se para o quase mudo marido (aqui, Luís Madureira), e até ao pescoço, imobilizada, no segundo e último. “Aquele monte de terra é uma ampulheta, que se vai enchendo à medida que o tempo passa, mas para mim são também escombros de um teatro em ruínas, já que o teatro como eu o conheci, com companhias que eram famílias, espectáculos em repertório e longas carreiras, acabou”, remata a nova intérprete da cobiçada personagem de Beckett.