O sucesso de Adoro Bolos e a ligação à moda
...mas parece. Pela maneira de cantar, pelas letras e até pela ligação à moda. A comparação não pesa ao autor (alter ego de Tiago Miranda) do recente álbum Adoro Bolos. Por Markus Almeida
O“aquário” da Galeria Zé dos Bois, em Lisboa, estava à pinha para o primeiro concerto de sempre de Conan Osiris. No ar a expectativa de não se saber o que esperar da mistura ao vivo de kizomba, electrónica experimental, música de carrinhos de choque e melodias do Médio Oriente, sobre versos românticos cantados a evocar António Variações. A data (2 de Março) esgotara quase um mês antes. Embora já tivesse dois álbuns no currículo, foi só com Adoro Bolos, editado a 31 de Dezembro de 2017, que começámos – a imprensa, a Internet, algum público – a olhar para ele.
“Senti que as pessoas [no concerto] estavam a tentar perceber que energia é que eu ia emitir. Quando comecei, à capela, com Borrego [o primeiro tema do álbum], elas ficaram numa de ‘Uau, ele existe mesmo’ e entraram em engrenagem para o resto do show”, conta à SÁBADO, um mês depois, sentado numa pastelaria na Avenida da Liberdade, em Lisboa. Apesar da estreia com casa cheia a abrir a noite para a cabeça-de-cartaz, a brasileira Linn da Quebrada, Conan estava tranquilo. “Estava mais nervoso quando toquei em casa de um amigo e não estava preparado”, conta. Desta vez tinha feito o trabalho de casa e quando a canção chegou ao refrão – “Eu é que sou borrego/ Borrego borrego [cinco vezes]/ A culpa nunca foi tua/ Eu é que sou borrego” –, já o público invadira o palco em festa. “Senti conexão.” Conan Osiris é Tiago Miranda, “um rapaz de Lisboa”, de 29 anos, que aprendeu a fazer música sozinho, “por tentativa e erro”, em casa com o seu computador e que estudou Design Gráfico em Castelo Branco. “Foi por acidente. Nem sabia bem a diferença entres Artes Plásticas e Design... Acabou por não ser bem a minha cena, mas deixei-me ficar porque curtia o sítio e os amigos.” Foi lá que conheceu Rúben de Sá Osório, então a estudar Moda e que se tornou o seu estilista. “Quer queira quer não, vou acompanhando a moda e descobrindo cenas através dele”, diz Conan, antes de definir o seu estilo pessoal como “a mãe do Kevin [de Sozinho em Casa] a ir para o aeroporto, vestida à pressa”.
Adoro Bolos foi escrito em Abril e produzido entre Setembro e Dezembro, em casa, mas a abordagem foi profissional desde o início. A trabalhar numa sex shop há seis anos, Conan marcava férias para ficar em casa a compor. “Oitenta por cento
“SENTI QUE AS PESSOAS ESTAVAM A TENTAR PERCEBER QUAL ERA A ENERGIA QUE EU IA EMITIR”
MARCAVA FÉRIAS PARA COMPOR. “OITENTA POR CENTO DAS FÉRIAS ERAM PARA TRABALHAR...”
“ESTAVA MAIS NERVOSO A TOCAR EM CASA DE UM AMIGO SEM ME PREPARAR [QUE NO PRIMEIRO CONCERTO]”
das minhas férias eram para trabalhar... É fodido ser português.” As suas principais ferramentas de trabalho são o gravador do telemóvel – “vais gravar a entrevista com o dictafone do iPhone?”, perguntou, mostrando-se familiarizado com a app – com que grava a voz das canções e um computador com o programa Fruity Loops. Se, por qualquer motivo, o programa deixasse de funcionar, o problema seria grave. “Primeiro
chorava, no dia seguinte contemplaria o suicídio e no dia seguinte ia aprender harpa e resolvia a minha vida a ser a Joanna Newsom II.” A Joana Newsom que Conan refere foi um ícone da música indie na viragem do século. O músico nunca é directo nas suas influências, prefere remeter para o seu Instagram (#conanosiris), mas vai deixando escapar alguns nomes, como Sigur Rós ou a artista de kuduro Noite e Dia. Ouvindo o seu álbum como um objecto coeso e único, tudo faz sentido. Quanto à forma de cantar, as comparações com Variações são inevitáveis. Nada que o incomode. “Só tenho de respeitar e sentir-me feliz por alguém sentir alguma coisa em relação a mim”, diz.
A definição de ter impacto
Enquanto Conan comia uma torrada de três andares e bebia um galão, voltámos ao primeiro concerto e perguntámos-lhe em que momento, depois de dois álbuns discretos, sentiu que Adoro Bolos ia ter este impacto (o termo usado foi “estar a bater”). Resposta: “Tenho um critério diferente... Se para mim e para os meus estiver a bater, está a bater.” Não poderia este “bater” ser a atenção mediática dos últimos três meses, reflectida em entrevistas e críticas ao álbum, idas à televisão, tempo de rádio e um concerto de estreia esgotado semanas antes? “Reparei que estava a esgotar e que houve frenesim, mas não posso atribuir isso a mim porque o concerto também era da Linn.”
A 9 de Fevereiro, a Zé dos Bois anunciava que os últimos bilhetes estavam disponíveis na loja de discos Flur, que de imediato foi inundada de pedidos para “o concerto do Conan”, relata à SÁBADO um dos sócios da loja – que “nunca vira algo assim”. “Isso é engraçado de se saber...”, reage Conan, algo embevecido, “mas lá está, tu tens essa informação, já eu não fazia ideia”.