ANNA VON HAUSSWOLFF MISSA DA MORTE
k Dead Magic, o novo álbum de Anna von Hausswolff, sucessor do miraculoso
The Miraculous, são só cinco temas, mas um deles, a peça central Ugly and Vengeful, é como um edifício monumental – um centro cultural, uma igreja, um palacete – metido num bairro residencial: espraia-se ao longo de 16 minutos e tal, que, como pisos de um prédio, crescem em direcção ao céu. Começam lentos, densos, misteriosos, atravessam uma deriva emocional com base no órgão, entram no clímax com percussão repetida e desaguam numa luxuriante viagem instrumental, com ecos de rock progressivo e lamentos quase guturais da compositora e soprano sueca – de voz enorme, mas ao estilo de anjo negro, etéreo (e não dos portentos do R&B e da soul), o que lhe tem valido muitas comparações com Kate Bush. Não são descabidas, mas Anna quer distanciar-se delas e fá-lo virando costas às regras da pop, preferindo o estranho ao sensual e até sussurros ou silêncios (The Marble Eye, a penúltima faixa, é disso exemplar). Assim, concentra o protagonismo do álbum no som opressivo do magnífico instrumento em que interpreta as suas composições: o órgão de tubos de uma igreja novecentista
de Copenhaga, onde gravou o disco ao longo de nove dias, com uma banda tão virtuosa como ela e sob o olhar certeiro do produtor Randall Dunn – que conhecemos dos SunO))).
Tudo o resto é igualmente gótico – do ambiente às letras (assentes em poemas do falecido escritor sueco Walter Ljungquist, autor de uma obra lírica com aura de mistério, a misturar crime, castigo, culpa e depressão) e tanto nos temas mais épicos ou melódicos, como The Truth, the
Glow, the Fall e The Mysterious Vanishing of Electra, como no minimalista Källans återuppståndelse, que fecha o disco. É como se Anna fosse filha de Edgar Allan Poe e Diamanda Galás, neta de Mary Shelley e Bram Stoker, irmã dos Laibach e prima dos Test Department, mas se tivesse 35 enamorado por Arvo Pärt e os seus Misere, Te Deum e afins. Dead Magic traz música assombrosa, atravessada pela ideia de morte e tragédia, e é para consumir sem distracções – como uma missa de Requiem moderna, a exigir reacção solene.