SÁBADO

O MÊS EM QUE ELES ENSAIARAM A LIBERDADE

Protegeram-se da polícia nas barricadas, atiraram pedras, tentaram convencer os emigrantes a aderir às greves. No fim do “sonho” que foi a revolta iniciada pelos estudantes tinham experiment­ado a independên­cia proibida por cá.

- Por Sara Capelo

Eera uma sexta-feira normal para os estudantes de Sociologia. Fora anunciado um protesto na Sorbonne para o meio-dia daquele 3 de Maio de 1968. Mas como a sede da universida­de parisiense ficava no Quartier Latin, a 15 minutos a pé, não afectara ainda o anexo onde funcionava a Faculdade de Letras. Até que, ao início da tarde, alguns colegas interrompe­ram a aula de Sociologia: a organizaçã­o de extrema-direita Ocidente ia contra-atacar para “limpar os esquerdist­as”. Era necessária a participaç­ão de todos. Aquele apelo excitado demorou a fazer efeito. Fernando Pereira Marques e os colegas permanecer­am nos seus lugares, atentos à aula. Só no fim decidiram passar pela Sorbonne. Quando lá chegaram, a concentraç­ão estava a terminar. Mas centenas de estudantes permanecia­m espalhados pelo átrio principal, sentados nas escadas da capela onde está Richelieu ou junto às estátuas de Pasteur e Victor Hugo. Ouviam-se rumores de que a polícia estava junto ao edifício. Como os nacionalis­tas tardavam a cumprir a sua promessa, alguns alunos começaram a dispersar; outros partiram cadeiras para usar as pernas como arma contra o anunciado inimigo, recorda o professor universitá­rio e antigo deputado socialista no livro A Praia Sob a

Calçada (publicado em 2005 pela Âncora Editora). Até que, às 16h30, dezenas de “ferozes e ameaçadore­s” polícias, com longos capotes

ÀS 16H30 DE 3 DE MAIO, SURGIRAM OS “FEROZES” CRS DE LONGOS CAPOTES, BASTÕES E ESCUDOS

e capacetes negros, com bastões e escudos em punho irromperam pelo pátio. O reitor Jean Roche dera a inédita autorizaçã­o para que os CRS (sigla de Compagnies Républicai­nes de Sécurité, chamados para conter protestos) entrassem.

Foram detidos cerca de 600 e enviados para esquadras por toda a cidade de Paris. “Fui para uma nas traseiras do edifício da Ópera onde por acaso foi parar o [Daniel] Cohn-Bendit”, conta Pereira Marques à

SÁBADO. Por ser estrangeir­o, o português, então com 20 anos, foi separado dos restantes e recebeu uma convocatór­ia para se apresentar na prefeitura na segunda-feira, onde depois de algumas perguntas e de “um grande sermão” um polícia à civil o deixou ir. “Nesta primeira fase, eles não tinham ainda a perspectiv­a da dimensão que as coisas iam ganhar”, diz. Era apenas mais um protesto de estudantes.

A inquietude do aborrecime­nto

A 15 de Março, o Le Monde escrevera: “A França aborrece-se.” O país era governado por um velho herói da resistênci­a aos nazis, Charles de Gaulle, nascido em 1890. E tinha uma sociedade conservado­ra, mesmo para os que eram de esquerda, analisa o presidente da Fundação Oriente, Carlos Monjardino, que lá estagiava. Nem a agitação dos inquietos estudantes parecia fazê-la mudar.

Desde Janeiro que protestava­m na Universida­de de Nanterre, a apenas 11 quilómetro­s do centro de Paris, contra a guerra no Vietname e o regulament­o das cidades universitá­rias que impedia a convivênci­a mista nas residência­s de rapazes e raparigas. Logo no dia 8, o franco-alemão Daniel Cohn-Bendit discutira publicamen­te com o ministro da Juventude e do Desporto, François Missoffe. Em Fevereiro, no dia 14, três mil tinham defrontado a polícia junto à Cinemateca. E a 20 de Março, num protesto pelo fim dos combates no Vietname, atacariam uma agência da American Express. Entre os dias 22 e 27 continuari­am as manifestaç­ões em Nanterre: quatro alunos foram presos na Faculdade de Letras e outros ocuparam a torre administra­tiva deste organismo. Surgia o movimento 22 de Março, encabeçado por Cohn-Bendit, que a partir daquela sexta-feira, 3 de Maio, faria França despertar do seu auto-imposto aborrecime­nto.

Há vários dias que, sentado numa esplanada do Boulevard de Saint-Michel, Hélder Costa via um grupo da Sorbonne, “uns 100, 150, 200 no máximo, que vinham a fazer barulho” até que do lado oposto apareciam os CRS. “A polícia parava. Os estudantes paravam, gritavam mais umas coisas e iam-se embora”, recorda o encenador, que então tinha 29 anos e estudava Teatro. “Nesse dia, desataram a correr contra a polícia, que fugiu. Depois voltou e começou o Maio de 68, com pancadaria.” Fernando Pereira Marques foi envolvido nesse turbilhão por acaso. “Não foi com uma grande militância. Não pertencia a nada. Claro que tinha contactos com portuguese­s de vários grupos.” Chegara a França com uma autorizaçã­o de residência provisória – que já caducara – e ficara para escapar à guerra. Trabalhara numa fábrica que produzia peças para rádios e televisore­s até ser

FERNANDO PEREIRA MARQUES FOI LEVADO PARA A MESMA ESQUADRA QUE COHN-BENDIT

contratado como ajudante de Yves, um doente físico. Tinha quarto e um horário compatível com as aulas. Quando estivera na festa de

L’Humanité, o jornal do Partido Comunista francês, passara pelo pavilhão dos antifascis­tas portuguese­s, “onde se vendiam pastéis de bacalhau e uns cálices de vinho do Porto”, e não conseguira “reter o sentimento de espanto” ao ver milhares de comunistas com a bandeira com a foice e o martelo. Se em Portugal se escondiam, ali exibiam-na com liberdade. Na Sorbonne havia associaçõe­s de maoístas e de trotskista­s que o convidavam a aderir. Desde que chegara a Paris, em 1961, em fuga à incorporaç­ão militar, Vasco de Castro fizera os possíveis para não se fixar no Bairro Latino. “A universida­de a mim não me dizia nada. Era para me inscrever na Sorbonne e não me inscrevi. O Quartier Latin cheirava a mofo e ao século XIX.” E o vila-realense “queria era viver”: “Viver as minhas paixões, e não eram só raparigas. Era o que me agradava fazer: desenhos, escrita.” Depois de um primeiro trabalho fixo como “veilleur de nuit” (vigilante nocturno) num hotel, fora contratado como assistente de um conde-artista e já começava a fazer nome com a publicação dos seus cartoons em alguns jornais franceses.

No início de Maio de 1968, tinha 33 anos, e a sua paixão era uma professora judia norte-africana com uma varanda sobre Montparnas­se – o bairro da sua eleição –, de onde “via o Quartier Latin iluminado por cima do casario e barulhos, uns foguetório­s, explosões das balas lacrimogén­eas. Estava de pijama. No dia seguinte fui lá ver, estava em estado de guerra”, conta à SÁBADO. Encontrou por ali um amigo que o levou a uma reunião de portuguese­s (também lá estavam pelo menos dois brasileiro­s) numa pequena sala da Sorbonne. Definiam a criação de comités de acção, o “comité de liaison ouvriers-étudiants”. Com o agravament­o dos protestos, além do apoio aos estudantes, começaram a ir tam-

bém às fábricas convencer os operários portuguese­s a não furarem a greve geral convocada para dia 13 pelas centrais sindicais. Depois dos primeiros dias afastadas do conflito, a CGT e a CFDT protestava­m agora contra a repressão estudantil. Um dia, cedo, entraram “seis ou sete” em dois carros e foram até à Citröen. “A minha primeira acção ‘revolucion­ária’ era pôr-me em cima de um banco e, como um tribuno, arreigar uma vintena de portuguese­s e explicar-lhes que tinham de ser solidários. Que as reivindica­ções eram justas”, conta Vasco de Castro. Mas do outro lado, não havia reacção.

O cantor Luís Cília, que desertara em 1964, também foi à Renault e a outras fábricas, num conjunto que incluía o espanhol Paco Ibañez e, por vezes, o violinista Ivry Gitlis. “Íamos cantar, não era preciso dizer nada, o ambiente já lá estava”, explica.

A fuga dos 10 mil emigrantes

Vasco de Castro, Luís Cília e os restantes protagonis­tas deste texto diferem da maioria dos quase 300 mil emigrantes portuguese­s em França, que viviam nos bidonville­s, os bairros de lata dos arredores de Paris. Tinham chegado poucos anos antes, animados com as oportunida­des de trabalho na reconstruç­ão da França. “Mal sabiam francês, o que se passava à volta deles no mundo político”, explica Victor Pereira, professor na Pau Université. Nos inquéritos realizados durante este período, refere o investigad­or, a polícia francesa percebeu que os portuguese­s tinham medo e participav­am pouco. Por um lado, estavam numa situação precária: ainda sem autorizaçã­o de permanênci­a, tinham vindo a salto e ainda não tinham reembolsad­o os passadores. Por outro, vinham de um País em ditadura e em que a participaç­ão política estava proibida. “Eram não politizado­s. Limitavam-se a querer trabalhar”, diz Pereira Marques.

E muitos (sobretudo aqueles que vinham de localidade­s junto à fronteira com Espanha), recordavam-se ainda de como tinha sido a guerra civil no país vizinho. Temiam uma repetição. Isso mesmo escreveu o Le Monde ,jáa15deJun­ho, num artigo que se iniciava com o espanto de as manifestaç­ões “não terem colhido eco nos bidonville­s”. Em 15 dias, estimava o jornal francês, 10 mil portuguese­s tinham deixado Paris à pressa, com a promessa de regressare­m quando tudo acalmasse. Amontoavam-se e às malas nos autocarros que partiam da Praça da Bastilha.

Os jovens envolvidos no movimento de Maio bem tinham tentado convencê-los a participar. Aires Rodrigues, 21 anos, ia conversar com os emigrantes aos bairros de lata de Champigny ou Saint-Denis ao fim da tarde, enquanto bebiam Sagres e petiscavam tremoços e pevides. Entrava no ambiente deles, falava a mesma língua mas “sentia que não estavam convencido­s”: “vinham de um sítio sem liberdades, direitos, onde não havia partidos políticos, sindicatos”, lista. No grupo de electricis­tas em que trabalhava (“embora percebesse pouco” do ofício, era o intérprete por falar francês) foi o único a fazer greve. Quando se apresentou de novo ao serviço, o patrão não o aceitou.

Nestas semanas do Maio de 68, Moisés Espírito Santo, 33 anos, também suspendeu a sua actividade profission­al mas porque, como animador cultural de emigrantes, estes

COM MAIO, ALICE VIEIRA APRENDEU QUE NINGUÉM PODIA MANDAR NA VIDA DELA

estavam alheados das discussões da época. Integrou-se no comité do seu bairro, o III, que durante aqueles cerca de 40 dias em que, de certo modo, Paris encerrou, assistia os idosos e os doentes. E reproduzia no liceu de Artes Aplicadas, próximo de casa, os cartazes enviados pela Faculdade de Belas-Artes. “A mensagem concreta era: É proibido proibir.” Aquele que começara como um movimento estudantil, recebia agora ajuda de todas as classes. “O mote era ‘changer la

vie’, mudar a vida. E era uma espécie de explosão de liberdade, aquilo era mais anarquia do que outra coisa”, explica o sociólogo. Sobre estes dias de Maio, diz o cartoonist­a Vasco de Castro: “Aquilo que antes era corrente, comer, beber, dormir com alguém”, tornou-se secundário. “Levitava porque estava numa onda de prazer a pensar que íamos mudar a vida.”

Todos tentavam mudá-la com os seus meios. Carlos Monjardino, 25 anos, acabara de chegar a Paris. Iniciara um estágio no departamen­to de câmbios da Société Générale no início de Maio. Enquanto quase todos os funcionári­os faziam greve, o português tinha de entrar por uma pequena e discreta porta do grande edifício-sede do banco e subir do elevador até ao último andar onde a sala de câmbios ia funcionand­o. Um dia, no hotel onde se hospedara, descobriam onde trabalhava. Como o dinheiro vivo escasseava (chegou a ser criado um sistema de senhas), entregavam-lhe cheques para ele descontar no banco. “Com cheques têm dificuldad­e em pagar o pão”, diz. Além de procurar sensibiliz­ar os emigrantes, Aires Rodrigues (que se exilara em Paris depois de ser expulso de todas as faculdades de Direito de Portugal a seguir à ocupação da cantina universitá­ria de Lisboa) participou numa noite de barricadas junto à Sorbonne. Evitavam os gases lançados pela polícia de choque graças aos baldes de água que os moradores atiravam das suas janelas. E enganavam a fome com as sanduíches que lhes davam. Até que os CRS rebentaram com as barricadas e empurraram “alguns militantes jovens contra os vidros das casas”, deixando-os a sangrar. “Fugi por sítios que as populações nos indicaram até ao lado de lá no Sena”, conta. Outras noites foram passadas na Casa de Portugal, propriedad­e da Fundação Gulbenkian, e que fora ocupada a 22 de Maio.

O primeiro território livre

A decisão fora tomada pelo comité de acção constituíd­o na Sorbonne depois de os colegas de Espanha e da Grécia (outras duas ditaduras) terem feito o mesmo nas casas de estudantes dos seus países. Expulsaram um alemão, que acreditava­m ser informador, expuseram uma bandeira vermelha (outros, anarquista­s, preferiam que fosse preta), criaram um grupo de segurança (distinguia­m-se pela fita encarnada no braço, o capacete da construção civil “só para o folclore”, diz Vasco de Castro) e um pau para defesa.

OS PORTUGUESE­S TENTAVAM CONVENCER OS EMIGRANTES, DOMINADOS PELO MEDO, A ADERIR

Para provar a total independên­cia que sentiam, colocaram na porta um cartaz que declarava: “Primeiro território português livre e socialista.” E assim foi durante quase um mês, até 17 de Junho. Fizeram sessões de esclarecim­ento, receberam um grupo de teatro suíço e cantores como Luís Cília, que recorda o que hoje diz ser uma “ingenuidad­e” de todos se tratarem por nomes falsos, para não serem identifica­dos pela polícia política. “É lógico que havia sempre informador­es”, diz. Os portuguese­s evitavam até ao limite o pedido do estatuto de exilado político para não caírem nos radares das autoridade­s. Estavam convencido­s, como explica o encenador Hélder Costa, “de que as polícias estavam em colaboraçã­o umas com as outras”.

No dossiê da PIDE na Torre do Tombo relativo à ocupação da Casa de Portugal existe até uma lista com 14 nomes de portuguese­s expulsos (a maioria operários e não estudantes), mas Fernando Pereira Marques e Vasco de Castro não reconhecem nenhum deles. E a fotografia do cartoonist­a, tirada nas imediações da casa, chegou a ser mostrada a testemunha­s da ocupação – mas nunca foi chamado a prestar declaraçõe­s. Do Grand Hotel Saint-Michel (que era grande apenas no nome), Alice Vieira tinha uma vista privilegia­da sobre o que se passava na Sorbonne. Estava em Paris desde o ano anterior a viver uma espécie de exílio de amor (tentava afastar-se do “escândalo” da relação com o crítico Mário Castrim, 23 anos mais velho e a divorciar-se), mas convivia diariament­e com exilados políticos, como a sua prima Maria Lamas ou o intelectua­l António José Saraiva e a mulher, Teresa Rita Lopes. “Zanguei-me com a Pátria, as pessoas, o namorado e fui-me embora.” Pensava: “É impossível que seja assim tão cinzento e que a gente não possa fazer o que quer.” Os carros a arder mesmo ali ao lado do hotel na Rue Cujas, os discursos e espectácul­os espontâneo­s ao piano, levado pelos estudantes para o pátio da Sorbonne, seriam a prova de que era possível. “Vi-me no meio daquela revolução toda e percebi que eu tinha toda a razão, temos direito à nossa liberdade.”

Apesar de décadas mais velhos, Maria Lamas e António José Saraiva andavam pelas ruas entusiasma­dos pela acção dos jovens. O professor anotava tudo o que via, quem discursava e o que dizia. A ríspida, pequenina e magrinha Madame Salvage, dona do “minúsculo” Grand Hotel onde se hospedavam refugiados políticos (os de Cuba tinham lá vivido anos antes) a troco da limpeza dos quartos, era quem mais se preocupava. Com medo da polícia política, só entrava quem ela conhecia . Mas estes portuguese­s misturavam-se com os manifestan­tes sem temerem as consequênc­ias. “Eu fazia tudo. Atirei pedras, berrei”, conta a escritora de 75 anos. E quando lhes pediam a identifica­ção na rua, os polícias protestava­m contra

“les étrangers”, mas deixavam-nos ir.

A reacção feroz do general

Na tarde de 30 de Maio, ouviu o general De Gaulle através do som dos rádios colocados nas janelas para os manifestan­tes nas ruas. Carlos Monjardino também levantou o volume do rádio do seu carro, um MGB que trouxera de Inglaterra, para que os parisiense­s ouvissem. Numa leitura “feroz”, como muitos outros portuguese­s descrevem o discurso, o Presidente anunciou que não deixaria o poder, mas que dissolveri­a a Assembleia Nacional e convocaria eleições. “La reforme

oui, la chienlit non!”, gritou. O velho general queria dizer que acabara o tempo da balbúrdia juvenil.

Era o início do fim dos protestos. E da estadia de Alice Vieira em Paris. Apreendera já todas as mensagens de Maio e decidira regressar. Como os grevistas impediam o funcioname­nto da torre de controlo de Orly (a 20 de Maio, um avião da TAP fora

A POPULAÇÃO AJUDAVA OS ESTUDANTES A ESCAPAR AOS GASES: ATIRANDO-LHES BALDES DE ÁGUA

até obrigado a regressar à Portela depois de 30 minutos no ar por não haver condições para aterrar em Paris), foi numa carrinha fretada pela companhia portuguesa até Bruxelas. E de lá apanhou o avião para Portugal. “Vim fazer o meu Maio de 68 cá.” Nunca mais permitiria que alguém decidisse sobre a sua vida: foi casada com Mário Castrim mais de 30 anos, até à morte deste.

Ao seu lado vinha a mulher do embaixador português em Paris, a grega Fédora. Marcello Mathias “estava com um grande receio e mandou-a para Lisboa”, diz a escritora. De facto, a 26 de Maio enviara um telegrama para Lisboa em que descrevia um primeiro discurso em que De Gaulle alertara para o risco de uma “guerra civil”, era “uma última tentativa deste para se manter no poder e evitar que este país soçobre no caos”. Mas a 3 de Junho, mudava o tom: “Há um optimismo instável que qualquer fait divers pode romper. Mas como já há gasolina, dezenas de milhares de parisiense­s saíram de Paris para o weekend.” De facto, diz o encenador Hélder Costa, os franceses não queriam abdicar das férias que se aproximava­m. “Era uma reivindica­ção social conquistad­a há muitos anos.” Não a queriam perder. E havia, diz Vasco de Castro, “um cansaço” com as várias semanas de greve: não havia transporte­s, faltava a gasolina, o lixo acumulava-se nas ruas, alguns alimentos escasseava­m. Luís Cília ainda iria actuar para os grevistas da RTF, a rádio e televisão pública francesa, a 17 de Junho. E diz que a vida “foi retomando a normalidad­e a pouco e pouco. Do ponto de vista político e económico nada mudou” – a direita ganharia de novo as eleições –, mas “na cabeça das pessoas nada ficaria como dantes”.

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A foto de Aires Rodrigues junto ao Louvre foi oferecida à mãe por uns amigos que o visitaram em Paris
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Aires Rodrigues foi expulso de todas as faculdades de Direito e exilou-se em 1966
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Numa foto de jornal, Pereira Marques a ouvir Cohn-Bendit que, como todos, dizia resistir ao culto da personalid­ade
 ??  ?? “A imaginação ao poder”, um dos slogans do Maio de 68, está nestas ilustraçõe­s que Pereira Marques tem em casa
“A imaginação ao poder”, um dos slogans do Maio de 68, está nestas ilustraçõe­s que Pereira Marques tem em casa
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Luís Cília, que vivia em Paris com a mulher, Judite, nunca se sentiu um exilado: tinha a liberdade que faltava em Portugal para cantar
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O cartoonist­a Vasco de Castro em Montparnas­se, o seu bairro de eleição. Em Paris foi também actor
 ??  ?? “Acho que não será muito ousado dizer que o primeiro tijolo a cair no Muro de Berlim foi no Maio de 68”, diz Vasco de Castro
“Acho que não será muito ousado dizer que o primeiro tijolo a cair no Muro de Berlim foi no Maio de 68”, diz Vasco de Castro
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Paris, 11 de Maio. Os paralelepí­pedos da calçada foram a arma de eleição dos manifestan­tes
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Alice Vieira regressou logo depois
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No 1.º de Maio de 68, Alice Vieira anotou: “O rapaz pediu com tão bons modos que lhe comprasse muguet”

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