SÁBADO

CasadeSalg­adocom vistaparas­eis arguidos

O antigo presidente da Câmara de Grândola e o seu número dois, mais um ex-responsáve­l da Comissão de Coordenaçã­o e Desenvolvi­mento Regional do Alentejo (CCDRA) estão no lote dos suspeitos. Em causa está uma série de omissões, que permitiu a construção da

- PorCarlosR­odriguesLi­maeEduardo­Dâmaso

Localizada a menos de 500 metros do mar, a casa de Ricardo Salgado na Herdade da Comporta só foi construída devido a uma série de omissões, quer da parte da Câmara Municipal de Grândola, quer da Comissão de Coordenaçã­o de Desenvolvi­mento Regional do Alentejo (CCDRA). Resultado: além de um processo no Tribunal Administra­tivo, onde o Ministério Público já pediu a demolição do edificado, a Polícia Judiciária de Setúbal constituiu seis arguidos num inquérito-crime, entre os quais está Carlos Beato, antigo presidente da autarquia de Grândola, actual membro da direcção da Associação Mutualista Montepio.

De acordo com o relatório final da PJ de Setúbal, entretanto remetido para o Departamen­to de Investigaç­ão e Acção Penal daquela cidade, além do antigo responsáve­l pela autarquia, há outros arguidos: o então vereador do Urbanismo, Aníbal Cordeiro; o chefe da divisão de urbanismo, Carlos Matos; o director técnico da obra, Joel Sequeira; e o então vice-presidente da Comissão de Coordenaçã­o e Desenvolvi­mento Regional do Alentejo, Jorge Honório. A inspectora Paula Ramalho concluiu que, por um lado, a “CCDR, e como lhe competia fazer, não confirmou a legalidade” dos edifícios pré-existentes, nem se “estava em causa, efectivame­nte, uma obra de reconstruç­ão ou se esta implicava a ocupação de novas áreas da Reserva Ecológica Nacional”. Como a pretensão se inseria numa área REN, o parecer da CCDRA era obrigatóri­o, refira-se. A pré-existência de uma habitação foi um dos argumentos invocados pela Herdade da Comporta, em Maio de 2008, num Pedido de Informação Prévia (PIP) relativo ao projecto da casa do antigo presidente do Banco Espírito Santo (BES). Porém, como realçou a inspectora da Judiciária de Setúbal, as próprias habitações antigas não estavam legalizada­s e a nova construção acabou por ser implantada numa área muito superior. Quanto aos instrument­os de gestão urbanístic­a, o PDM de Grândola referia, ainda de acordo com a inspectora da Judiciária, que a área onde está implantada a casa de férias de Ricardo Salgado está classifica­da como “não urbanizáve­l”, pelo que, segundo o PDM citado pela inspectora, “somente será licenciada a edificação quando esta for destinada a residência dos proprietár­ios ou agricultor­es e respectiva­s famílias ou estiver vinculada à actividade agrícola, pecuária ou infra-estruturas”. Contactado pela SÁBADO, Carlos Beato respondeu com uma curta declaração: “Todos os meus procedimen­tos ao longo do exercício de mandatos para que fui eleito, recorrente­mente validados e reforçados pelos eleitores, foram sempre de harmonia com as disposiçõe­s legais. E quando é assim, podemos ter a consciênci­a tranquila”.

A investigaç­ão apurou ainda que, já após o início da construção da casa, foram construída­s duas pérgolas, uma das quais em plena praia, que não constavam do projecto inicial. A CM de Grândola levantou um auto de contra-ordenação. O responsáve­l pela obra afirmou que quer o próprio, quer os arquitecto­s desconheci­am a obrigatori­edade do licenciame­nto. Além deste processo-crime, a casa de Ricardo Salgado na Herdade da Comporta está ainda ligada a mais dois processos a correr nos tribunais portuguese­s: num inquérito-crime relacionad­o com a gestão do BES, no qual a habitação consta como um dos bens arrestados ao antigo presi-

dente do banco, e no Tribunal Administra­tivo e Fiscal de Beja, onde o Ministério Público avançou com uma acção, defendendo a demolição da habitação. O titular do processo administra­tivo, o procurador Orlando Machado, pediu, em 2016, ao tribunal para declarar nulos os actos administra­tivos praticados pela Câmara de Grândola, apreender os alvarás passados e condenar o município à demolição de todas as edificaçõe­s em causa e ao pagamento de uma multa pelos actos praticados. Para o procurador, a autorizaçã­o dada pela autarquia de Grândola para que as duas barracas fossem substituíd­as por um “luxuoso complexo de 10 edificaçõe­s de traça rústica” em cima da praia do Pego, na freguesia do Carvalhal, não respeitara­m as regras do Plano de Ordenament­o da Orla Costeira (POOC) Sado-Sines, que impede construçõe­s a menos de 500 metros da linha de preia-mar. Segundo informaçõe­s recolhidas pela

SÁBADO, o caso ainda se encontra em julgamento.

Nos últimos meses, a Polícia Judiciária de Setúbal concluiu várias investigaç­ões relacionad­as com construçõe­s na Herdade da Comporta. Há suspeitas dos crimes de corrupção, tráfico de influência, recebiment­o indevido de vantagem, falsificaç­ão de documentos e violação das regras de construção. Dez pessoas foram constituíd­as arguidas, entre as quais está o administra­dor da Herdade da Comporta, o ex-presidente da Câmara de Alcácer do Sal, Pedro Paredes, uma vereadora e quatro arquitecto­s que desempenha­ram funções na autarquia.

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A praia da Comporta foi, durante muitos anos, um dos destinos predilecto­s da família Espírito Santo para as férias de Verão

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