CasadeSalgadocom vistaparaseis arguidos
O antigo presidente da Câmara de Grândola e o seu número dois, mais um ex-responsável da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Alentejo (CCDRA) estão no lote dos suspeitos. Em causa está uma série de omissões, que permitiu a construção da
Localizada a menos de 500 metros do mar, a casa de Ricardo Salgado na Herdade da Comporta só foi construída devido a uma série de omissões, quer da parte da Câmara Municipal de Grândola, quer da Comissão de Coordenação de Desenvolvimento Regional do Alentejo (CCDRA). Resultado: além de um processo no Tribunal Administrativo, onde o Ministério Público já pediu a demolição do edificado, a Polícia Judiciária de Setúbal constituiu seis arguidos num inquérito-crime, entre os quais está Carlos Beato, antigo presidente da autarquia de Grândola, actual membro da direcção da Associação Mutualista Montepio.
De acordo com o relatório final da PJ de Setúbal, entretanto remetido para o Departamento de Investigação e Acção Penal daquela cidade, além do antigo responsável pela autarquia, há outros arguidos: o então vereador do Urbanismo, Aníbal Cordeiro; o chefe da divisão de urbanismo, Carlos Matos; o director técnico da obra, Joel Sequeira; e o então vice-presidente da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Alentejo, Jorge Honório. A inspectora Paula Ramalho concluiu que, por um lado, a “CCDR, e como lhe competia fazer, não confirmou a legalidade” dos edifícios pré-existentes, nem se “estava em causa, efectivamente, uma obra de reconstrução ou se esta implicava a ocupação de novas áreas da Reserva Ecológica Nacional”. Como a pretensão se inseria numa área REN, o parecer da CCDRA era obrigatório, refira-se. A pré-existência de uma habitação foi um dos argumentos invocados pela Herdade da Comporta, em Maio de 2008, num Pedido de Informação Prévia (PIP) relativo ao projecto da casa do antigo presidente do Banco Espírito Santo (BES). Porém, como realçou a inspectora da Judiciária de Setúbal, as próprias habitações antigas não estavam legalizadas e a nova construção acabou por ser implantada numa área muito superior. Quanto aos instrumentos de gestão urbanística, o PDM de Grândola referia, ainda de acordo com a inspectora da Judiciária, que a área onde está implantada a casa de férias de Ricardo Salgado está classificada como “não urbanizável”, pelo que, segundo o PDM citado pela inspectora, “somente será licenciada a edificação quando esta for destinada a residência dos proprietários ou agricultores e respectivas famílias ou estiver vinculada à actividade agrícola, pecuária ou infra-estruturas”. Contactado pela SÁBADO, Carlos Beato respondeu com uma curta declaração: “Todos os meus procedimentos ao longo do exercício de mandatos para que fui eleito, recorrentemente validados e reforçados pelos eleitores, foram sempre de harmonia com as disposições legais. E quando é assim, podemos ter a consciência tranquila”.
A investigação apurou ainda que, já após o início da construção da casa, foram construídas duas pérgolas, uma das quais em plena praia, que não constavam do projecto inicial. A CM de Grândola levantou um auto de contra-ordenação. O responsável pela obra afirmou que quer o próprio, quer os arquitectos desconheciam a obrigatoriedade do licenciamento. Além deste processo-crime, a casa de Ricardo Salgado na Herdade da Comporta está ainda ligada a mais dois processos a correr nos tribunais portugueses: num inquérito-crime relacionado com a gestão do BES, no qual a habitação consta como um dos bens arrestados ao antigo presi-
dente do banco, e no Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja, onde o Ministério Público avançou com uma acção, defendendo a demolição da habitação. O titular do processo administrativo, o procurador Orlando Machado, pediu, em 2016, ao tribunal para declarar nulos os actos administrativos praticados pela Câmara de Grândola, apreender os alvarás passados e condenar o município à demolição de todas as edificações em causa e ao pagamento de uma multa pelos actos praticados. Para o procurador, a autorização dada pela autarquia de Grândola para que as duas barracas fossem substituídas por um “luxuoso complexo de 10 edificações de traça rústica” em cima da praia do Pego, na freguesia do Carvalhal, não respeitaram as regras do Plano de Ordenamento da Orla Costeira (POOC) Sado-Sines, que impede construções a menos de 500 metros da linha de preia-mar. Segundo informações recolhidas pela
SÁBADO, o caso ainda se encontra em julgamento.
Nos últimos meses, a Polícia Judiciária de Setúbal concluiu várias investigações relacionadas com construções na Herdade da Comporta. Há suspeitas dos crimes de corrupção, tráfico de influência, recebimento indevido de vantagem, falsificação de documentos e violação das regras de construção. Dez pessoas foram constituídas arguidas, entre as quais está o administrador da Herdade da Comporta, o ex-presidente da Câmara de Alcácer do Sal, Pedro Paredes, uma vereadora e quatro arquitectos que desempenharam funções na autarquia.