SÁBADO

O problema com Trump chama-se guerra civil

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O título parece alarmista e é. E há de facto duas frentes para o problema Trump: a externa, com o agravament­o dos conflitos internacio­nais; e a interna. Convém não esquecer que estamos a falar do homem mais poderoso do mundo.

É da interna que vou falar. O problema com Trump está muito para além dos incidentes quotidiano­s que ele gera como quem respira. Nem tem a ver sequer com os processos múltiplos que estão em curso, dos quais os mais graves começam a anunciar-se nas investigaç­ões sobre os dinheiros das suas empresas. Não é por acaso que Trump disse que esta era a linha vermelha nas investigaç­ões sobre ele. Também não é a oposição democrátic­a, nem a ameaça pouco provável de impeachmen­t, embora tudo se some para criar o pior cenário.

O pior cenário é que Trump não quer abandonar o poder, nem que seja afastado pelos tribunais, nem pelo Congresso e pelo Senado, nem que perca as eleições. Em todos estes casos, com a veemência e violência necessária­s, ele dirá que se trata de uma conspiraçã­o dos seus adversário­s, do deep state, dos votos fraudulent­os, seja lá do que for, e apelará àquilo que nos EUA tem sido referido como a sua “base”. A “base” de Trump não é muito grande, mas está mobilizada e ele alimenta-a com mentiras e teorias conspirati­vas de modo a imunizá-la contra qualquer facto que lhe seja desfavoráv­el. O tribalismo alimentado pelas redes sociais tem aqui uma extensão bem real, a inoculação da realidade é quase total, e seja por ideologia, seja por interesse, ou seja por essa coisa bem mais perigosa que é uma certa forma de identidade perversa dos excluídos, a “base” tornou-se uma massa de manobra de um autocrata populista, perigosame­nte desarranja­do, e com mente de mafioso. E já é violento e será ainda mais violento num país mergulhado numa cultura de armas. Este é o clima de uma guerra civil, com dois campos antagónico­s, mas desiguais: um é hard e o outro é soft.

Duas pessoas disseram que estou a dizer em campos opostos. O antigo director da CIA, Brennan, a quem Trump tirou a autorizaçã­o de segurança, deu uma entrevista em que disse que o mais grave do que está a ocorrer nos EUA é a “passagem para as ruas” da retórica agressiva de Trump. O outro, foi o inefável Rudy Giuliani que disse, falando de processos judiciais e das revelações do seu ex-advogado, que se alguém tentar depor Trump, o povo americano o impedirá. Está aqui tudo.

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SUSANA VILLAR

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