O LÍDER DA CONTRATAÇÃO
Começou na SIC precocemente, aos 16 anos, a ajudar nos bastidores do programa Os Donos da Bola. Vinte anos depois atinge o topo da carreira
Daniel Oliveira, 37 anos, o entrevistador da pergunta-chave “o que dizem os seus olhos?”, que tantas vezes deixava os convidados a lacrimejar no Alta Definição, atingiu o topo da carreira em Junho. No cargo de director de programas da SIC, revela-se agora como o estratega que convenceu Cristina Ferreira a fazer um
volte-face na carreira. “É uma pessoa trabalhadora, inteligente, autodidacta. Tem a cultura do detalhe que aos olhos de alguns pode ser entendida como centralizador”, elogia à SÁBADO o amigo e ex-chefe Nuno Santos, que assumiu o mesmo cargo na estação entre 2009 e 2012. Primeiro na SIC e depois na RTP, Daniel manteve proximidade com as equipas de projectos e passou por diversas áreas – da coordenação, à produção e informação, passando pela régie e edição de imagem. É um leitor compulsivo de jornais e revistas em versão de papel, tem dois televisores na sala de casa para estar atento à concorrência e gosta, sobretudo, de ver futebol e ficção brasileira. Um assumido workaholic, cultiva o espírito de grupo no meio laboral. “Quando assumiu funções, chamou de imediato todos os actores e apresentadores. Mantém contacto regular com eles e é amigo de alguns”, destaca à SÁBADO quem colabora com ele. Focado na carreira, o já alcunhado “Dono Disto Tudo” da SIC entrou para a estação precocemente (aos 16 anos) como assistente de informação de Jorge Schnitzer em Os Donos da Bola. Para trás, ficava a infância dramática pela toxicodependência dos pais e relatada pelo próprio aos 20 anos no livro 1
Dose Droga... 1 Gr. Esperança? (2001, Texto Editores). Em 2013, lançou pela Oficina do Livro a Persistência da
Memória e a pretexto do romance deu uma entrevista de vida à SÁBADO (publicada na edição de 7 de Novembro desse ano) onde parecia profetizar a ascensão na carreira: “Quero vencer e tenho vencido a maior parte das vezes (...) Numa televisão comercial temos objectivos a cumprir.”
tas vezes, o papel de boa conselheira”, lançou a própria no Facebook, perto das 20 horas de 23 de Agosto (quinta-feira passada), dia seguinte à fuga de informação sobre a saída da TVI.
Era o anúncio em formato não oficial. Cautelosa, serviu-se de um excerto da página 193 do livro de memórias Sentir, lançado em Novembro de 2016 pela Contraponto e quase a chegar aos 100 mil exemplares vendidos. Porque nesta fase contratual, particularmente sensível, os seus advogados estão em conversações com o gabinete jurídico da Media Capital para eventual antecipação do termo do contrato (em vigor até 30 de Novembro). Em análise estão ainda os programas gravados até Fevereiro de 2019, nomeadamente o concurso diário
Apanha Se Puderes que, segundo estimativas de fontes contactadas pela SÁBADO, rondará 20 mil euros por emissão. Significa isto que a TVI pode não estar disposta a deitar fora tantos episódios e, por conseguinte, Cristina poderá entrar na antena da SIC só no próximo ano. A saída de um complexo vínculo contratual pode ficar acordada pelas partes dentro de dias. O escritório AVM Advogados, em Algés, estará a representar a apresentadora. Contactado pela SÁBADO, o defensor Sandro Polónio de Matos respondeu apenas: “Ressalvado o devido respeito pelo vosso trabalho, e compreendendo a actualidade e interesse pelo tema, informo que nada temos a informar ou esclarecer sobre a matéria em apreço (ou sobre qualquer outro assunto que nos esteja confiado pelos nossos clientes).” Na dança das cadeiras, intensificada na rentrée televisiva, a expectativa e incerteza fazem parte. A futura consultora-executiva da direcção-geral de entretenimento da Impresa abriu o marcador do jogo, quando em meados de Julho iniciou as negociações com Francisco Pedro Balsemão (CEO da Impresa, filho do fundador Francisco Pinto Balsemão e chairman do grupo de media )eDaniel Oliveira (director de programas da SIC). Decorreram secretamente, durante um mês, em três ou quatro reuniões fora de Carnaxide. Quando ela deu o “sim”, Daniel Oliveira estava no Rio de Janeiro, na Rede Globo, a comprar a novela Segundo Sol de João Emanuel Carneiro.
Tal como decorreram em sigilo, o acordo deveria ter sido mantido assim nos próximos meses. A apresentadora continuava alegremente a alimentar a imprensa especializada, fosse pelas fotos das férias na Turquia e a bordo de um iate (também divulgadas nas redes sociais); ou pelo guarda-roupa (um vestido com espampanantes folhos em plástico, de uma criadora espanhola, que a
A SAÍDA DE UM COMPLEXO VÍNCULO CONTRATUAL COM A TVI PODE FICAR ACORDADA DENTRO DE DIAS
própria comparou a bóias e levou à festa de Verão da TVI, em Vilamoura, a 21 de Julho passado). O público jamais suspeitava do seu plano de carreira – ainda que Manuel Luís Goucha estivesse ao corrente porque fora avisado pela própria. Assim como a TVI, que não terá feito uma contraproposta.
Contudo, o sigilo acabou por ser quebrado na tarde 22 de Agosto (quarta-feira), quando o Correio da
Manhã noticiou a transferência da apresentadora da TVI para a SIC. O que levou a estação de Queluz a reagir. Em comunicado enviado às redacções, às 19h55 dessa tarde, o canal de Queluz fazia controlo de danos pelo anúncio em letras garrafais: “TVI e Cristina Ferreira não renovam contrato da apresentadora que vigora até 30 de Novembro.” Por efeito-rastilho, as acções do grupo Impresa subiram 4% na quinta-feira (dia 23) e as da concorrência da Media Capital registaram uma descida de 14%. Os fãs reagiram sem consenso. Se uns aplaudiram a transferência nas redes sociais, outros acusaram-na de deslealdade para com Manuel Luís Goucha. Este, por sua vez, apressou-se a falar da polémica, repetindo em directo no Você na TVda passada segunda-feira (dia 27) que ela não traíra ninguém: “O amor que eu tenho pela Cristina em nada ficará beliscado.” Nos tempos mais próximos, Goucha manter-se-á a solo mesmo que o vínculo laboral de Cristina com a TVI permaneça até 30 de Novembro. As revistas da especialidade avançam nomes de potenciais sucessoras para as manhãs de Queluz: Isabel Silva, Leonor Poeiras ou Tânia Ribas de Oliveira (RTP). Não passam, para já, de suposições.
À terceira foi de vez
O que é certo é que este foi o culminar de um longo namoro da SIC a Cristina. A primeira tentativa de a roubar à concorrência deu-se quando Nuno Santos ainda era director de programas da SIC. Os dois chegaram a conversar várias vezes sobre a eventual transferência. Cristina revelou interesse, mas também firmeza. Luís Marques, então administrador da Impresa, veio a público em 2013 dizer que não haveria convite sem a autorização dele. As negociações ficaram sem efeito. Houve ainda outra tentativa, mas sem sucesso. A mudança deu-se com a chegada de Daniel Oliveira à direcção de programas da SIC, em Junho passado. O entendimento entre os dois terá sido fácil. Além de ter agido no timing certo – sabia que o contrato de Cristina Ferreira estava prestes a terminar – Daniel Oliveira beneficiou ainda de outra circunstância: a vontade da apresentadora em mudar. Cristina terá percebido que tinha chegado ao auge na TVI e que a SIC lhe abriria outras portas: enquanto a estação de Queluz de Baixo é líder de audiências, a rival de Carnaxide mantém-se na liderança dos targets comerciais (A/B C D 15/54 e A/B C D 25/54) – as categorias mais valiosas para os anunciantes. Ou seja, poderá rentabilizar ainda mais o seu universo empresarial que inclui o blogue e diversas páginas em redes sociais. Da parte da SIC, a contratação insere-se numa estratégia global do grupo Impresa que passa pela rentabilização das redes sociais e do online como fonte de receita, bem como pela venda de produtos associados. Ela implicará também rigor de orçamentos – que tem variáveis diversas. Para além disso, assim que assumiu funções, Daniel Oliveira começou a renegociar contratos de actores e apresentadores: alguns serão para manter mas outros, ao que a SÁBADO apurou, foram reduzidos com o fim, por exemplo, da exclusividade. Também levou a repensar a estratégia com Júlia Pinheiro, que en-
A TRANSFERÊNCIA PARA A SIC FOI O CULMINAR DE UM LONGO NAMORO; À TERCEIRA FOI DE VEZ
Q caixa melhor no registo tranquilo das tardes segundo vários especialistas. Quando contactado pela SÁBADO, Daniel Oliveira foi lacónico por SMS: “Agradeço contacto, mas não vou falar. Obrigado. Bom trabalho. Daniel.”
Cristina, aquela máquina
Era uma aluna solitária e discreta na Universidade Autónoma, que chegava às aulas num velho carro vermelho em que entrava água da chuva. “Estava ali sossegadinha, sem fazer perguntas. Acho que foi o Manuel Luís que lhe despertou a exuberância”, diz à SÁBADO Ana Pedro, que foi sua professora no segundo ano. Foi consolidando a carreira na TVI e quando atingiu quatro anos de
Você na TV! criou uma empresa de “actividades de comunicação e televisão”, com um capital social de 5 mil euros. Em 2014, transformou-a numa sociedade por quotas. Nasceu a Cristina Ferreira, Lda., que tem ainda como actividades secundárias o comércio a retalho de vestuário e actividades de espectáculo. A empresa através da qual presta os serviços à TVI tem uma saúde financeira fulgurante. De acordo com os dados a que a SÁBADO teve acesso, pelo menos desde 2015 factura mais de 1 milhão de euros. Em 2017 teve um volume de negócios de 1.378.241 euros e resultados líquidos de 561.257,48 euros. Com apenas cinco funcionários tem ainda um activo total de 3.745.742,43 euros, dos quais 1.413.138,70 euros em depósitos bancários. Não bastava a firma, viria a loja da Malveira associada às redes sociais onde também lança tendências, calçado e vernizes; em paralelo com dois livros, um perfume, e desde Março de 2015 a revista mensal Cristina – que em 2017 fez 1.154.911,53 euros em vendas, com um resultado líquido de 183.594 euros.
Menos conhecida é a faceta de sócia da Lovin Content, Lda, a empresa responsável pela gestão das redes sociais de diversos famosos (incluindo as suas contas), juntamente com Tiago Froufe e Inês Mendes da Silva. Esta é também a CEO da Notable, responsável pela gestão da carreira de Cristina Ferreira e de personalidades como Pedro Teixeira, Rita Pereira e Bárbara Guimarães. Em 2016 a Lovin recebeu 269 mil euros em vendas e prestações de serviços e 23.299 euros em resultados líquidos. Mesmo influente e milionária, a Oprah portuguesa (como gosta que a comparem) mantém o apego às origens. A menos de um quilómetro de casa – mandada construir pela própria em 2014 num terreno de família que comprou por 1.000 euros à tia – prolonga a zona de conforto. Moram familiares, o ex-marido António Casinhas tem um stand de automóveis e há uma oficina onde o pai lhe leva o Porsche a arranjar. “Não gosta de grandes confusões. Quer o espaço dela. É um sítio onde se consegue proteger, longe da ribalta”, explica à
SÁBADO a antiga chefe de Cristina Ferreira numa loja de roupa na Malveira, Sónia Correia. As duas chegaram a ser próximas. “Íamos ver colecções juntas, chegámos a ir às compras juntas”, diz, descrevendo-a como “alguém que sabe apropriar a roupa para a situação correcta”. Cristina Ferreira trabalhou na loja da empresária em 2001, 2002 e 2003, enquanto tirava o curso de apresentadora de televisão. Já no início da carreira na TVI, ainda chegou a trabalhar na loja em part-time.
Anos mais tarde, em Março de 2017, Cristina Ferreira abriu a Casiraghi Forever, a sua própria loja. Na altura, a opção de ter uma loja na Malveira não foi bem recebida por Sofia Correia: “Era para ela abrir a loja noutro lugar, mas foi uma querelazinha que já passou. Sei que estamos no coração uma da outra.” Tal como Manuel Luís Goucha estará.
MESMO INFLUENTE E MILIONÁRIA, CRISTINA MANTÉM O APEGO À MALVEIRA; MORA NUMA MANSÃO