DESENCONTRO
A distância rasura. Aconteceu com Alberto de Lacerda (1928-2007), ausente de Portugal desde 1951. Lisboa foi um intervalo entre Lourenço Marques e Londres. O périplo americano e as peculiares idiossincrasias do autor acentuaram a fractura com os media e a universidade portuguesa. Injustiça óbvia, sendo um grande poeta. No ano em que Lacerda faria 90 anos, Luís Amorim de Sousa organizou uma antologia a que chamou Labareda. O volume inclui poemas dos 11 livros publicados em vida do autor. Este núcleo inclui os dois tomos de
Oferenda (1984 e 1994) e ainda 28 poemas inéditos que o antologiador
foi buscar ao espólio. Antes surgem outros quatro, extraídos de dois títulos omissos da bibliografia: O Pajem Formidável dos Indícios, datado de
2010, e A Luz Que Se Escondeu
no Escuro, de 2016.
É estranho que, num legado tão vasto (“deixou inéditos para cima de mil poemas”, lêse no prefácio), Luís Amorim de Sousa tenha escolhido os 28 poemas que escolheu. Foi o melhor que encontrou? Não teria sido preferível ater-se à obra publicada? Um dos mais importantes livros de Lacerda,
Mecânica Celeste, está representado com 14 poemas. Todos sabemos que antologiar significa seleccionar, mas Luís Amorim de Sousa conseguiu a proeza de deixar de fora os poemas mais significativos de Mecânica Celeste. O leitor desta antologia não tem oportunidade de ler Depois de veres Guerra e Paz de Sergei Bondarchuk, Vem, Vimos, Vietnam, Os pés nus correspondem em grinalda e outros. Porquê? Porque os versos falam de merda, caralhos, cus, conas, orgasmos, putas relaxadas, escarros e, last but not
least, do “Império britânico cagando”? Porquê insistir no transcendental? W