SÁBADO

Os Low falam sobre o seu novo álbum e a digressão que passa por Lisboa

A cada álbum, os Low renovam-se, mas sem alinhar em modas. Double Negative – que mostram a 29 de Setembro, iniciando uma digressão europeia, no Lisboa Ao Vivo – prova-o de novo. Pretexto de conversa.

- Por André Santos

SÃO 25 ANOS de carreira espalhados por quase duas dezenas de álbuns originais, compilaçõe­s que reúnem trabalhos menos conhecidos e até discos temáticos. Os Low passaram por editoras como a Vernon Yard, Kranky e assentaram na Sub Pop há uma década e picos. Não ficaram mais acessíveis ou comerciais, mas sim disponívei­s. São mais experiment­ais agora do que alguma vez foram, mas essa experiment­ação criou ferramenta­s que tornam as suas músicas mais arejadas – como se a porta de entrada e as janelas fossem maiores. As suas valsas lentas, por vezes solitárias (uma das canções-chave dos Low chama-se precisamen­te Do You Know

How To Waltz?), libertaram-se da tensão, dando lugar a canções mais expostas, menos vulnerávei­s. De caminho a banda quebrou com o slowcore, género lento, minimal, muito popular no meio alternativ­o no rock dos anos 90, e experiment­ou vários produtores – que ficaram, invariavel­mente, ligados ao som dos Low. Uma coisa, porém, manteve-se: o formato trio, três, como o número de letras que se conta em Low. Formados em 1993 pelo casal Alan Sparhawk e Mimi Parker, foram aceitando um +1 na relação – o baixista, variável ao longo do tempo: actualment­e é Steve Garrington. Apesar disso, são um exemplo de estabilida­de. Em conversa ao telefone, a propósito de Double Negative, álbum lançado há duas semanas, e do concerto no Lisboa Ao Vivo, este sábado, 29 de Setembro, é inevitável perguntar a Alan Sparhawk se imaginou que a banda cumprisse 25 anos. “É uma surpresa continuar a tocar. Contávamos lançar um álbum ou dois, criar algo importante para nós, mas não esperávamo­s chegar onde chegámos. Ainda hoje, quando fazemos um novo álbum, é algo estranho para mim pensar que a banda é conhecida no meio indie-rock e continua a crescer”, responde. Alan mede o que diz. Não o faz para se proteger, tem a voz de alguém que pensa muito no que vive e já viveu, ao jeito de obsessão. Além disso, é preciso no que diz: as palavras são medidas, mas saem a bom ritmo, parece tudo calculado, no sítio certo, tal e qual como as letras que escreve para os Low. Esse é o lado mais minimal dos Low e que se manteve ao longo destes 25 anos: frases curtas, pensamento­s que parecem desconecta­dos mas que na voz de Alan e Mimi chegam aos ouvidos com um sentido demolidor. Alan é uma pessoa com transparên­cia de raciocínio, e a sua escrita não é críptica ou densa, mas eficaz. Fala naturalmen­te sobre isso, sem desconfort­o, apesar do desconfort­o que lhe causa escrever, quando se menciona as evoluções

“Estousempr­e àprocurado quetenhopa­ra dizerede comooescre­ver.Éumprocess­omorosoe nosprimeir­os anosfoidif­ícil lidarcomis­so”, revelaAlan Sparhawk

ligeiras na sua escrita desde I

Could Live In Hope até hoje: “Quando me sento a escrever ainda sou a mesma pessoa, sempre sem assunto, ou com uma dificuldad­e em expressar mais do que digo. Sei que o escrevo é muito minimal e críptico, mas é assim que o meu cérebro pensa sobre as coisas. Estou sempre à procura do que tenho para dizer e de como o escrever. É um processo moroso e nos primeiros anos foi difícil lidar com isso. Ainda hoje demora muito tempo, escrever é um processo que me destrói emocionalm­ente. Bato sempre no fundo quando passo muito tempo a escrever.”

Double Negative – o novo álbum, pretexto desta da conversa e mote do regresso dos Low a Portugal – foi impulsiona­do pela eleição de Donald Trump, confessa Sparhawk: “Quando aconteceu, senti que tinha de dizer alguma coisa, quanto mais não fosse para tentar perceber o que se estava a passar e como eu poderia lidar com isso. O que é que vai mudar, quais são as motivações para continuar, qual é o significad­o da música no meio disto tudo? A ideia é perceber como é que podes criar algo que pode mudar o que se está a passar, ao nível social e político… e é algo que, para mim, é difícil de engolir e pronto. Não me quero resignar, a viver apenas mais um dia.” Este é também o segundo álbum com a mão de B. J. Burton (que já trabalhou com Bon Iver, Megafaun ou The Tallest Man On Earth, entre outros), um produtor que causou uma revolução no seu som. Em Ones And Sixes (2015) o som dos Low tornou-se mais espaçoso, menos condiciona­do pela guitarra, baixo e bateria. Outros sons invadiram as suas canções – e toda a história nasceu da vontade do próprio produtor: “Ele contactoun­os, disse que queria trabalhar connosco, e nós estávamos numa fase em que queríamos experiment­ar com novos sons. Aliás, foi sempre assim quando decidimos mudar de produtores. Foram eles que nos contactara­m, o Steve Albini, o Dave Fridmann… e é óptimo, porque queremos sempre trabalhar com novos produtores, experiment­ar coisas novas.” É normal que os produtores tenham vontade de trabalhar com os Low: é música com bom esqueleto, que se adapta a visões diferentes mantendo a identidade. Kramer, o lendário produtor dos Galaxie 500, percebeu isso de imediato, trazendo o seu som e métodos para os primeiros álbuns dos Low (I

Could Live In Hope é um dos mais bem conseguido­s em que trabalhou). “O Kramer ajudou-nos no início a tornar o nosso som mais ecléctico. Acabávamos de gravar uma canção e ele queria logo passar para a seguinte. Isso deu-nos muita confiança para acreditarm­os no que estávamos a fazer”, lembra. Assim começaram as primeiras valsas. Agora, 25 anos depois, ainda tocam valsas únicas, “à Low”, mas para salas cada vez maiores. Este sábado, podemos ouvi-los à beira-Tejo, no Lisboa Ao Vivo.

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Com 25 anos de carreira, o trio não dá mostras de cansaço – pelo contrário, continua a surpreende­r, renovando-se sem se desvirtuar
 ??  ?? DOUBLE NEGATIVE Pop-rock • Ed. Sub Pop €16,90 CONCERTO: LISBOA AO VIVO • Sáb., 29/9, 22h • €22
DOUBLE NEGATIVE Pop-rock • Ed. Sub Pop €16,90 CONCERTO: LISBOA AO VIVO • Sáb., 29/9, 22h • €22
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