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so, peço o telemóvel a alguém.
Voltando aos problemas de sexualidade, quais são agora as maiores queixas?
Têm a ver com a transexualidade.
Retirada da lista do Manual de Diagnóstico das Doenças Mentais (DSM), em Junho passado. Considera um avanço?
Como médico continuo a pensar que beneficiam com o DSM. Caso contrário, não há intervenção médica – e eles precisam, porque é uma alteração que não tem propriamente mudança, a não ser pela Medicina. Em Portugal, felizmente estamos na fase em que essa intervenção médica é gratuita, integrada no Serviço Nacional de Saúde. Existe uma consulta de Sexologia Clínica no Centro Hospitalar Psiquiátrico de Lisboa, inicialmente fundada por mim no então Hospital Júlio de Matos. Esta consulta é composta por uma equipa multidisciplinar – psicólogas, psiquiatra e endocrinologista – e presta assistência a pessoas transexuais, entre outras. Não tenho intervenção directa na consulta, à excepção de discutir casos mais complexos.
O que falta fazer na sexologia?
Há uma coisa que me parece que não estar a ser feita: a sexualidade na terceira idade. Há cada vez mais idosos, têm menor capacidade sexual e problemas vários – médicos, psicológicos, da própria relação. As pessoas podem pedir ajuda, mas os apelos não são valorizados. Devia haver maior ajuda do médico de família, questioná-los sobre o assunto para fazer a ponte para os médicos das especialidades. Minorias Eróticas e Agressores Sexuais
(2006), com uma listagem exaustiva. Acompanhou casos?
Parafilia define-se como uma excitação sexual de outra origem que não a normal. Tratei uma freira deprimida. Tinha uma personalidade obsessiva, o que não facilitava as coisas. Imagine o que é uma mulher que tem votos de castidade passar horas por dia a masturbar-se. Basicamente, o que tive de fazer foi tratar da depressão e ela ficou bem. Nunca mais a vi, isto já foi há uns anos.
Em 2004, acompanhou o caso de Carlos Silvino, conhecido por Bibi. Foi condenado em 2010, a 18 anos de pena efectiva por pedofilia, no âmbito do processo Casa Pia. Ainda o vê?
Não posso responder, por dever de sigilo profissional.
É a favor ou contra a castração química, uma medida aplicada a pedófilos em alguns países?
Foi feita nos Estados Unidos, em Portugal que eu saiba nunca foi aplicada. Penso que se poderia ser a favor se houvesse capacidade para apoiar essas pessoas de outra maneira. Por exemplo em comunidades terapêuticas ou ambientes capazes de as enquadrar. Elas não sabem relacionar-se.
A Igreja está a reagir adequadamente aos sucessivos escândalos que envolvem sacerdotes?
Penso que a Igreja Católica está organizada no sentido de fornecer, pelos seus meios, uma forma de tratamento ou solução. Há países na América do Sul onde existem casas de correcção, da Igreja, para onde esses sacerdotes são enviados. Não me parece que a Igreja pudesse passar sem tomar atitudes mais ou menos públicas. Se elas são eficazes ou não isso é outra história.
O stress pós-traumático é outra das áreas a que se dedica. Ajudou na redacção da legislação que instituiu o regime de apoio em 1999. O Estado dá resposta aos casos?
Está a dar. Em 1988, ajudei à fundação da Apoiar [actualmente uma IPSS] destinada à ajuda de ex-combatentes. Tem médicos, psicólogos, advogados e assistente social. Funciona numas instalações magníficas dadas pela Câmara Municipal de Lisboa [no Bairro da Liberdade] e está aberta todos os dias.
Quantos ex-combatentes sofrem de stress de guerra?
Há cerca de 130 mil, de um total de 800 mil. Muitos não são diagnosticados. Há doentes que preferem não ir ao médico. Alguns dizem-me: “Tinha vergonha de fa-
Dedicou-se também ao estudo dos comportamentos sexuais desviantes, as parafilias. Publicou o livro “Há cada vez mais idosos, têm menor capacidade sexual e problemas vários. Devia haver maior ajuda do médico de família”
“O autor do artigo escreveu que eu tinha inventado a doença [stress pós-traumático] por razões antimilitaristas. Processei a publicação e ganhei” “Há cerca de 130 mil [ex-combatentes com stress pós-traumático], de um total de 800 mil”
lar.” Foi após um determinado acontecimento da guerra, uma emboscada, a morte de pessoas. Pensou-se que todos tinham ultrapassado. Mas houve uns que vieram para Portugal e continuam a ter pesadelos recorrentes com tudo aquilo que se passou e perturbações de memória.
Uma matéria controversa que o levou a recorrer aos tribunais por causa de um artigo publicado contra si numa revista especializada em 1996. Que aconteceu?
O autor do artigo escreveu que eu tinha inventado a doença por razões antimilitaristas. Achei que isto ia longe demais e processei a publicação. Considerei ofensivo ao meu bom-nome profissional.
Qual foi o desfecho do caso?
Ganhei. O Tribunal Criminal de Lisboa condenou-o por crime de abuso de liberdade de imprensa a uma pena de 290 dias de multa ou 193 dias de prisão e ao pagamento de uma indemnização.
Comemorou a vitória?
Foi talvez o dinheiro que melhor me soube gastar em toda a minha vida. Fiz uma festa com amigos.
Perante uma carreira tão preenchida, sobra-lhe tempo para a família?
Temos uma casa no Algarve para toda a família, onde passamos férias. É muito perto da praia.
Tem quantos filhos?
Quatro, de três casamentos. Dois do primeiro, uma do segundo e outra do terceiro.
Uma das filhas é a actriz Marina Albuquerque. Acompanha a carreira dela?
Sim. Não é para fazer propaganda, mas acho-a muito boa actriz, uma profissional exigente consigo própria. Ainda agora esteve no Teatro Nacional. Tenho muito orgulho nela.
Tem netos?
Seis.
Não tenciona ter a reforma em pleno, ou seja, deixar as consultas de clínica privada?
Quero manter-me activo no exercício da minha profissão. Gostaria de ser ainda capaz de escrever um livro de divulgação sobre a psicopatia.