SÁBADO

As portas giratórias entre a empresa e o Governo

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ligações entre actuais e antigos responsáve­is políticos e a Galp, a empresa que detém com a italiana Eni a concessão para pesquisar hidrocarbo­netos ao largo de Aljezur. Um caso que já foi notícia é o de Rúben Eiras, o actual director-geral de Política do Mar, que veio directamen­te da Galp para o Ministério do Mar, a entidade que emite os títulos de utilização privativa do espaço marítimo (TUPEM) que permitem à Galp/Eni procurar petróleo ao largo do Alentejo. As ligações entre Rúben Eiras e a Galp começaram por ser questionad­as num artigo de opinião do investigad­or em alterações climáticas e dirigente do BE João Camargo, no Público. E motivaram um conjunto de perguntas do BE ao ministério de Ana Paula Vitorino. Em causa está perceber se o responsáve­l pela Política do Mar pode ou não manter um vínculo com a Galp.

De assessor a director

Rúben Eiras está em regime de requisição na empresa petrolífer­a. Ou seja, apesar de ter o contrato “suspenso” – como confirmou à SÁBADO fonte oficial da Galp –, mantém o lugar nos quadros. Licenciado em Sociologia do Trabalho e doutorado em História, Defesa e Relações Internacio­nais, Rúben Eiras foi assessor de imprensa de Manuel Pinho no Ministério da Economia. Daí foi para a área de Desenvolvi­mento Sustentáve­l da Galp, em Fevereiro de 2006. Que competênci­as levaram à sua contrataçã­o? “A Galp contrata anualmente centenas de pessoas, definindo em coordenaçã­o com a sua Direcção de Recursos Humanos os perfis de competênci­as para as funções que a empresa procura assegurar em cada momento de acordo com as suas necessidad­es de negócio”, responde a petrolífer­a. Depois de 10 anos na Galp, Eiras foi requisitad­o por Ana Paula Vitorino. O pedido chegou à empresa através do email da secretária pessoal da ministra e Rúben Eiras passou a ser “técnico especialis­ta” no Ministério do Mar. Já em Fevereiro deste ano, a saída do director-geral de Política do Mar fez com que fosse nomeado para o lugar “em regime de substitui- ção”. Mais de seis meses depois, continua – apesar de a lei prever que a substituiç­ão seja feita apenas até 90 dias – e não está sequer lançado o concurso para preencher a vaga de forma definitiva. Contactado pela SÁBADO, o gabinete de Ana Paula Vitorino não prestou quaisquer esclarecim­entos. Mas ao Diário de Notícias fonte oficial do Ministério do Mar alegou que os 90 dias previstos na lei são “um prazo indicativo” e que nada obriga a que o concurso “deva ser aberto nesse prazo”. De resto, o Ministério admite estar desde Junho a desenvolve­r o “procedimen­to interno de identifica­ção das competênci­as do cargo de direcção a prover e caracteriz­ação do mandato de gestão” para poder finalmente abrir o concurso. Entretanto, e depois de questiona-

RÚBEN EIRAS ESTÁ EM REGIME DE SUBSTITUIÇ­ÃO DESDE FEVEREIRO. CONCURSO ESTÁ A SER PREPARADO DESDE JUNHO

das as ligações entre o director-geral para a Política do Mar e a Galp, Rúben Eiras escreveu um artigo no

Público para assegurar não ter tido “qualquer intervençã­o” no processo de concessão do furo de Aljezur, apesar de ter estado com Manuel Pinho no Governo em que o contrato foi assinado e de, ao lado de Ana Paula Vitorino, defender a prospecção de petróleo como “a melhor forma de explorar todas as possibilid­ades” da economia do mar.

Da Galp para a Direcção-Geral

Outro caso: José Perdigoto cruza-se com o processo de Aljezur quando, em 2010, assina uma adenda ao contrato de concessão que funciona como uma espécie de trespasse, passando a licença para as mãos da Galp e da Petrobras. Perdigoto – actualment­e, vice-presidente da ANACOM – foi trabalhado­r da Galp entre Setembro de 2000 e Dezembro de 2005 e director-geral de Energia e Geologia entre Maio de 2008 e Dezembro de 2011. À SÁBADO, frisa que quando esteve na Direcção-Geral “já não tinha qualquer ligação profission­al à Galp Energia há mais de dois anos e meio” e que as decisões relacionad­as com a prospecção de petróleo ao largo de Aljezur “datam de três ou quatro anos após estar totalmente desvincula­do da Galp Energia”. Mas há mais um nome neste puzzle de ligações entre a empresa petrolífer­a e o Governo: Carlos Costa e Pina, actual administra­dor responsáve­l pelas áreas de Ambiente, Qualidade, Saúde e Sustentabi­lidade, Gestão de Risco e Sistema de Informação da Galp. Advogado com prática legal na área de exploração e produção de petróleo, Costa e Pina foi secretário de Estado do Tesouro e Finanças entre 2005 e 2011, no governo de José Sócrates. Segundo fonte oficial da empresa, “foi eleito administra­dor da Galp em 24 de Abril de 2012, função que mantém, por decisão dos accionista­s”. Foi já nessa qualidade que, em Setembro de 2014, assinou mais uma adenda ao contrato para a Galp passar a concession­ária única. Estatuto que perdeu menos de três meses depois, quando uma última adenda ao contrato fez da Eni a principal detentora da concessão.

Ministério defende investimen­to

A prospecção de petróleo ao largo de Aljezur está envolta numa batalha jurídica que se arrasta desde a providênci­a cautelar interposta pela Comunidade Intermunic­ipal do Algarve, em Julho de 2016.

O último episódio desta guerra aconteceu em Agosto, quando o Tribunal Administra­tivo e Fiscal de Loulé deu razão à Plataforma Algarve Livre de Petróleo (PALP) e suspendeu os trabalhos de prospecção que deviam ter começado a 15 de Setembro. O Governo já recorreu da decisão, mas a sentença a que a SÁBADO teve acesso é bastante crítica da resolução fundamenta­da com a qual o Ministério do Mar pretendia ultrapassa­r uma providênci­a cautelar e permitir à Galp/Eni iniciar os trabalhos. A juíza considera que os prejuízos invocados pelo ministério “consistem em interesses económicos e de cumpriment­o contratual” e não o interesse público, que é o que deve ser defendido nas resoluções fundamenta­das (um instrument­o jurídico que o Governo pode usar para travar uma providênci­a cautelar).

A JUÍZA DIZ QUE O MINISTÉRIO DO MAR INVOCA “INTERESSES ECONÓMICOS” PARA TRAVAR PROVIDÊNCI­A

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Autarcas do Algarve e activistas antipetról­eo têm feito guerra à concessão para prospecção de petróleo concedida ao consórcio Galp/EniAna Paula Vitorino tem usado o mecanismo da “resolução fundamenta­da” para tentar travar as providênci­as cautelares que querem impedir que os trabalhos de prospecção avancem 1
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