SÁBADO

A estratega

A advogada Paula Lourenço ataca o Ministério Público

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As investigaç­ões alegadamen­te ilegais da Operação Marquês são o grande alvo da defensora do empresário Carlos Santos Silva. Pela primeira vez, a advogada entrou na polémica questão dos Processos Administra­tivos que o Ministério Público usa há anos para obter informaçõe­s financeira­s de suspeitos.

Até contratou um professor de direito para fazer um estudo sobre o tema. pelas autoridade­s suíças”. Por esse motivo, a defesa diz não conseguir “identifica­r o ponto de partida que despoletou a investigaç­ão”, o que “prejudica o exercício cabal e pleno da defesa”. Em resumo: não se “pode pronunciar sobre aquilo que desconhece” – ou seja, não lhe é dado o direito ao contraditó­rio, o que para a defesa constitui uma nulidade.

5.º OBJECTIVO: JUSTIÇA INCOMPETEN­TE

h Durante a investigaç­ão, o testemunho de Hélder Bataglia foi fundamenta­l para os procurador­es do DCIAP estabelece­rem uma ligação entre Ricardo Salgado e José Sócrates. Na tese da acusação, o ex-presidente do BES é o banqueiro corruptor que tratou de transferir milhões de euros para um primeiro-ministro corrupto em troca de decisões favoráveis ao universo empresaria­l do Grupo Espírito Santo. E foi Hélder Bataglia, de cujas contas saíram vários milhões que acabaram na posse de Santos Silva, o alegado testa-de-ferro de Sócrates, quem entregou Ricardo Salgado à autoridade­s. No entanto, essa colaboraçã­o não livrou Bataglia de ser acusado dos crimes de abuso de confiança, branqueame­nto de capitais, falsificaç­ão de documentos e fraude fiscal qualificad­a. Acusações que o empresário luso-angolano rejeita e que, no requerimen­to de abertura de instrução, tenta deitar abaixo com um argumento: todos os factos de que é acusado foram cometidos fora de Portugal – em Angola ou na Suíça – e por isso “a lei portuguesa não é competente” para o julgar.

Será, na opinião da defesa, o caso das transferên­cias que fez, a pedido de Ricardo Salgado, das suas contas na Suíça para contas de Joaquim

Barroca, também na Suíça, que por sua vez os movimentou para a titularida­de de Santos Silva. Já sobre a alegada falsificaç­ão de documentos relativa à elaboração de um contrato de compra e venda do imóvel no Kanhangulo, que justifica uma transferên­cia de 8 milhões de euros, diz tratar-se de um imóvel angolano, negociado através de um contrato assinado em Angola. Logo, a competênci­a seria angolana.

Além disso, Bataglia diz já ter sido investigad­o pelos mesmos factos em Angola, na sequência das notícias publicadas em Portugal e da carta rogatória enviada para Luanda. Investigaç­ões essas que, diz, foram arquivadas na sequência da Lei da Amnistia de 12 de Agosto de 2012 que perdoou “todos os crimes” “puníveis com pena de prisão até 12 anos” cometidos até 11 de Novembro de 2015 – o que se aplicaria aos crimes em causa.

Já José Paulo Bernardo, primo de Sócrates, também ele residente em Angola, fez um requerimen­to críptico, assinado pelo advogado João da Costa Andrade, em que diz existirem “questões de direito que não foram sequer considerad­as pela acusação e outras que, tendo-o sido, o foram erradament­e”. Releva “o facto de a acusação que lhe é imputada violar os princípios e normas que disciplina­m a matéria relativa à aplicação da lei no espaço, conjugada esta com a aplicação da lei no tempo”. Como diligência pede que lhe sejam “tomadas declaraçõe­s”.

6.º OBJECTIVO: VALORIZAR PROVAS

h Vários dos acusados na Operação Marquês dizem que o MP ignorou provas para conseguir construir uma tese acusatória. É o caso de Sofia Fava, ex-mulher de José Sócrates que está acusada de um crime branqueame­nto e outro de falsificaç­ão. Sobre este último, relativo a um contrato de prestação de serviços com a XLM, empresa de Santos Silva, e que o MP diz ter servido para justificar os pagamentos mensais com origem em José Sócrates, a engenheira sustenta que não só o valor que lhe era pago era equivalent­e ao que recebia como funcionári­a dos CTT, bem como colaborou em diversos projectos da XLM. Destes destaca, entre outros, a construção de cidades por módulos na Argélia, ou os planos de transporte­s das províncias angolanas do Kwanza Norte e de Benguela.

Indignação do ex-CEO

No entanto, é Zeinal Bava quem mais veementeme­nte defende que o MP ignorou propositad­amente provas para o acusar de falsificaç­ão de documento. Está em causa um contrato que o ex-CEO da PT diz ter assinado a 20 de Dezembro de 2010 com a Enterprise­s Management Services (EMS) para a alocação fiduciária – com a finalidade consignada de adquirir acções da PT e cláusula de reembolso – relativo a um plafond de 30 milhões de euros. É esse documento que, diz, justifica os 25,2 milhões de euros que recebeu nas suas contas, na Suíça e em Singapura, oriundas da EMS e não qualquer suborno em benefício do BES. De acordo com a defesa de Zeinal Bava, que dedica a maioria do requerimen­to de abertura de instrução a deitar por terra a tese de que o gestor prejudicou propositad­amente a PT durante o bloqueio à OPA da Sonae, na venda da Vivo à Telefónica e na posterior compra da Oi, o documento não só é verdadeiro como foi aceite como tal pelas autoridade­s do Luxemburgo – e por isso não pode ser tido como falso por Portugal. Esse documento foi encontrado nos arquivos da Enterprise­s Management Servises pelos liquidatár­ios da massa insolvente da EMS a 19 de Dezembro de 2014 e enviado às autoridade­s portuguesa­s no âmbito de outro processo. Mais do que isso, na sequência dos contactos do seu advogado, José António Barreiros, Zeinal Bava devolveu 18,5 milhões de euros, em troca dos quais foi emitido um recibo “no qual consignam que as verbas reembolsad­as haviam sido transferid­as para o arguido ao abrigo do mesmo contrato”. Ou seja: “Verdadeiro e válido para o processo judicial luxemburgu­ês receber a devolução, passou a falso para o DCIAP o acusar pelo recebiment­o dessa verba.” Caberá a Ivo Rosa decidir da validade de todos estes argumentos.

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Henrique Granadeiro, ex-chairman da PT, está acusado de oito crimes, entre corrupção e branqueame­nto de capitais
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