SÁBADO

COMO FOI O EXÍLIO AÇORIANO DE GUNGUNHANA

O mítico régulo foi capturado, exibido como troféu e “ocidentali­zado” em Angra do Heroísmo. A história do “leão de Gaza” é inacreditá­vel e vai ser contada num documentár­io inglês.

- Por Tiago Carrasco

A transladaç­ão para Moçambique foi acordada há 35 anos, mas no caixão não iam os ossos do último imperador de Gaza, território que resistiu 75 anos à expansão portuguesa. Uma história incrível

Nunca os moçambican­os tinham visto um caixão tão belo como aquele que aterrou em Maputo a 15 de Junho de 1985 com os restos mortais de Gungunhana: dois metros de compriment­o, 75 centímetro­s de altura, 225 quilos e baixos relevos do escultor Paulo Cosme. Uma obra de arte que desfilou num cortejo pela cidade, seguida por milhares de pessoas, até ao Salão Nobre do Conselho Executivo, de onde sairia mais tarde para a sua morada final, a Fortaleza de Maputo, com lápide de herói nacional. O que os moçambican­os não podiam ver era que dentro da urna não estavam os ossos de Gungunhana, o último imperador de Gaza – um vasto território que resistiu à expansão colonial portuguesa durante 75 anos. Havia apenas um punhado de terra do cemitério da Conceição, em Angra do Heroísmo, onde quase 90 anos antes o régulo fora discretame­nte enterrado, sem direito a lágrimas nem a tiros de canhão. Tinha morrido no exílio a 23 de Dezembro de 1906, 11 anos após ter sido capturado por um regimento português liderado por Mouzinho de Albuquerqu­e, em Chaimite, o último reduto da resistênci­a vátua (ou angune, etnia dos líderes de Gaza). A trasladaçã­o encerrava um dos episódios mais caricatos da diplomacia portuguesa. Tudo começara dois anos antes. Carlos Enes, historiado­r e ex-deputado natural da Terceira, estava em Maputo como professor cooperante na Universida­de Eduardo Mondlane e organizou uma exposição sobre Gungunhana: “A iniciativa provo-

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 ??  ?? Godide (filho de Gungunhana), Gungunhana, Molungo (seu tio) e Zixaxa, o outro régulo, em 1899, trajados a preceito, no dia do seu baptismo. Foram apadrinhad­os pela elite de Angra do Heroísmo
Godide (filho de Gungunhana), Gungunhana, Molungo (seu tio) e Zixaxa, o outro régulo, em 1899, trajados a preceito, no dia do seu baptismo. Foram apadrinhad­os pela elite de Angra do Heroísmo
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