SÁBADO

O Natal dos Armandos Vara

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TALVEZ ARMANDO VARA MEREÇA PASSAR O NATAL EM CASA.

Talvez, como disse o advogado dele, a última decisão do Tribunal Constituci­onal, que lhe indeferiu uma reclamação, seja uma “porcaria”. Talvez, generaliza­ndo, as decisões dos tribunais sejam todas uma porcaria. Até são, sobretudo quando não vão ao encontro das nossas pretensões. Mas Tiago Bastos, um dos poucos bons advogados que ainda restam, tem razão: deixem Armando Vara passar o Natal em casa, até porque Oliveira e Costa, Luís Caprichoso, José Vaz Mascarenha­s e Francisco Sanchez (ex-BPN), Ricardo Salgado, Amílcar Morais Pires, Isabel Almeida (ex-BES), João Rendeiro, Fezas Vital e Paulo Guichard (ex-BPP) também vão consoar tranquilam­ente, sem a ameaça latente de um mandado de prisão a bater à porta. Se há coisa que os antigos banqueiros caídos em desgraça prezam é a consoada. É aquele momento em que, olhando para o presépio, podem imaginar-se como os três Reis Magos que levaram ouro, incenso e mirra. Só que, no caso dos tais ex-banqueiros caídos em desgraça, as atenções certamente concentrar-se-ão no ouro. Não para o Menino, mas em direcção ao próprio bolso, depois de um complexo esquema de transferên­cias por offshores. Ricardo Salgado achava-se o próprio Menino Jesus, vendo no construtor José Guilherme um Rei Mago do ouro, que actualment­e se chama uma “liberalida­de”, perfeitame­nte sancionada pelo Banco de Portugal, essa instituiçã­o que raramente sabe o que se passa.

Mas, voltando ao Natal destes simples, convém recordar as provações que todos estes antigos banqueiros passaram: horas de interrogat­órios no Ministério Público e, alguns deles, perante o juiz Carlos Alexandre. Sempre tratados por “senhor doutor”, com a melhor cerimónia processual-penal e não aos pontapés como faz a procurador­a Cândida Vilar aos seus arguidos. E bem, porque os arguidos desta magistrada, normalment­e, são suspeitos de terrorismo, sequestros, assaltos à mão armada. Não merecem o tratamento por “senhor doutor”. Este está reservado a quem afunda bancos ou é corrupto. Os arguidos da procurador­a Cândida Vilar nem sequer equacionam passar o Natal em casa, porque sabem que vão directos para a prisão. Os outros nem sequer lhes passa pela cabeça passar um Natal na cadeia, porque este é um lugar apenas para os arguidos da procurador­a Cândida Vilar. Mas se há algo que os arguidos “doutores” se podem queixar é da morosidade da justiça. Oliveira e Costa demorou cinco anos a ser julgado. Apesar de condenado a pena de prisão efectiva, ainda poderá desfrutar de mais uns anos em liberdade, já que os recursos, no caso dos “senhores doutores”, demoram sempre aquele tempo necessário para a ponderação. Em Agosto, faz 83 anos. Se algum dia a sua condenação transitar em julgado, será desumano conduzir este homem à cadeia. João Rendeiro, por sua vez, foi condenado a cinco anos de pena suspensa. Está bem inserido socialment­e, mora num condomínio privado, tem um blogue. Enviar um homem destes para a cadeia é desperdiça­r um valioso activo para a sociedade. Vem nos livros: a medida da pena deve ter em conta a posição do indivíduo na sociedade. E Ricardo Salgado, 74 anos? Acusado na Operação Marquês e um dos suspeitos naquilo a que se chama o “Universo Espírito Santo”, é mais provável que entre mais depressa no reino dos céus do que numa cadeia. Sim, há ainda quem recorra ao velho ditado “a Justiça tarda, mas não falha”. O problema é que a Justiça portuguesa tarda tanto para alguns, que o seu efeito é nulo. A não ser para um toxicodepe­ndente que foi condenado a seis anos de prisão efectiva por roubar 6 euros. O rapaz não teve a sorte de se chamar João Rendeiro. Se assim fosse, poderia passar o Natal fora da cadeia. Mas a reinserção social do arguido está fortemente indexada aos seus activos.

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Subdirecto­r Carlos Rodrigues Lima O

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