SÁBADO

O último a rir

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As próximas eleições estão a ser preparadas debaixo dos nossos narizes, e podem vir a ser o conjunto de duas guerras civis: entre PS e BE, e entre o PSD e a Aliança. Além do resto. Isto é: quem governa quem, e quem condiciona (ou não) um segundo mandato de Marcelo. O PS é a consciênci­a e a ideologia do BE, ou trata-se do contrário? Tenderá o PS a transforma­r-se em BE, ou o BE em PS? Subestimar o outro pode sair caro.

Quanto à “direita” (as aspas denotam a anedota da classifica­ção), a revolução seria a Aliança fazer desaparece­r o PSD. Isso não vai acontecer. Daí que de duas uma: ou o partido “liberalist­a” (arranjem outra palavra depressa) de Santana Lopes ganha votos suficiente­s de forma a tornar-se relevante para o PSD e para o mundo, ou ficará sempre como uma mera verruga na face de Rio, ainda menos CSU do que o apêndice bávaro de Merkel.

E há duas formas de se tornar relevante: conseguir ir buscar votos à abstenção, ao PS e só depois ao PSD, de forma a tornar-se indispensá­vel para que este obtenha uma maioria absoluta, ou ganhar apenas o suficiente para que o PSD perca a maioria. Ganhar por excesso ou por defeito. É preciso depois perceber onde ficam o PCP e, sobretudo, o CDS/PP. Este arrisca-se a crescer de forma desmesurad­a, nomeadamen­te se Rio não se tornar num mar, e se a Aliança não for mais do que uma nova marca. Tem sido a única oposição visível, vocal, estruturad­a, consciente e coerente à equipa de António Costa. Perante isto, o problema de Rio e Santana é, por um lado, o facto de serem vinho velho em odres novos: precisam de ser novidade e diferença, mas pertencem, com mérito, à história. Por outro, possuem os dois um

problema de fronteira e afirmação: Rio face a um PS da pós-“esquerda”, Santana face a um PP que ocupa todo o espaço partidário à “direita” do PSD. O drama do actual PSD não é só o de aparecer pálido, ou ausente. É o de, vistas bem as coisas, as palavras e as pessoas, não ter ainda conseguido descobrir o que é que o separa do PS. E pode bem chegar às eleições a achar que o que o separa é menos do que o que o aproxima. Quanto a Santana, o drama é ainda maior: não tendo muito tempo, precisa de tempo para se afirmar. E se se limita a querer ser o que o PSD/PPD já foi, tem um campo de manobra reduzido. Claro que um colapso de Rio poderia transforma­r tudo: mas Santana já não está no PSD para ser o seu enésimo salvador. Ao contrário, por exemplo, de Durão Barroso.

Por fim, o PCP: não tendo embarcado totalmente no Governo Costa, também não desembarco­u. Está algures como os estivadore­s de Setúbal: meio cá, meio lá. É possível que o partido venha a reclamar, junto das massas, os louros de ter obtido magras melhorias sociais. Mas o BE já ocupou esse campo das vitórias morais. Restará a Jerónimo o das vitórias murais.

Sem querer brincar com coisas sérias, o PCP tem também um problema de orfandade. Com o BE seduzido por uma “esquerda” leve, romântica, libertária e social-democrata, poderia recuperar a memória, o exemplo e as propostas da “verdadeira esquerda”. Mas esta já não existe em sítio nenhum do mundo. Falando de murais, o “de esquerda e patriótico” (num tempo de falsas “esquerdas” e de vendilhões de pátrias) pode servir, na transição. Mas é capaz de ser pouco. E Marcelo? Aparenteme­nte não depende de ninguém. Reconduz-se se quiser. Mas num xadrez a cinco ou seis, sem maiorias claras, pode ter de encontrar outra cartilha de justificaç­ão. Se à geringonça suceder uma maquineta ainda mais complicada, ou um bloco central/lateral de sobrevivên­cia, a sua função fica alterada: em vez de conservar e mediar, terá de inovar e conduzir.

O PS julga que pode controlar o BE. O BE julga que pode controlar o PS. O PSD julga que pode controlar os estragos. O PP julga que pode substituir o PSD. A Aliança julga que pode entrar na festa. O PCP julga que pode justificar-se.

Mas o último a rir é o que ri melhor. Por favor, não façam apostas.

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