SÁBADO

MONIZ: AS MAIORES POLÉMICAS

Aos 66 anos regressa à televisão com Deus e o Diabo, um programa de fact-checkingem que apura a veracidade dos factos e é questionad­o em directo. Prolonga o exercício nesta conversa sobre os processos do clube da Luz e outras polémicas.

- JOSÉ EDUARDO MONIZ Por Raquel Lito e Sónia Bento (texto) e Raquel Wise (fotos)

Em entrevista à SÁBADO, José Eduardo Moniz fala do Benfica, do processo E-toupeira, das novelas e até da sua vida pessoal

Foram duas horas a revisitar o passado de director-geral da TVI; o presente de consultor da mesma estação e vice-presidente do Benfica; e o futuro das novelas e do entretenim­ento. Uma entrevista em três tempos, em que o açoriano assumidame­nte competitiv­o também manifesta o lado familiar: a ligação à mulher (Manuela Moura Guedes) e aos três filhos (Eduardo Nuno, 41 anos; José Maria, 26; Madalena, 23). José Eduardo Moniz fala calmamente no seu habitat: um décor de um gabinete da PJ de A Teia ,a nova novela produzida pela Plural para a TVI. Os espaços do estúdio reinventam-se, tal como ele próprio. O seu regresso à antena na sexta-feira (dia 30) com DeuseoDiab­o não correu pelo melhor, devido a problemas de áudio. Como lida com as falhas técnicas? Num directo há riscos envolvidos. Mas sem risco a vida não tem graça. O que aconteceu ali é que nós fizemos os testes, às 19h, e estava tudo bem. Quando fomos para o ar, às 21h, houve duas falhas pela sobrecarga de utilização de Internet naquele horário. Vamos afinar. Fizemos o ensaio geral, já podemos começar a trabalhar. A ideia é tornar o programa ainda mais alargado. Quando nasceu na minha cabeça era um projecto que começava no canal principal, saltava para a TVI24 e prolongava-se pelas redes sociais. Quem me conhece sabe que gosto de um bom combate. Estava à espera que o tema do Benfica dominasse o programa?

Estava à espera que surgisse, mas não logo e com tanta intensidad­e. Foram momentos que acabaram por ser divertidos. Não ocultei nada, disse o que pensava. Teve feedback por parte de Luís Filipe Vieira? Estivemos juntos no sábado. Nem sequer comentámos o assunto e vimos o jogo [Benfica-Feirense] lado a lado. A nossa relação foi criada no Benfica e à volta dele. Não se pode dizer que é de amizade, mas somos duas pessoas que se respeitam mutuamente. Tem pretensões de ser presidente do clube?

O meu objectivo é ser útil ao Benfica. Ser presidente não é um objectivo. Devo dizer-lhe que a minha família ficaria felicíssim­a se me visse livre do futebol. Eu é que sou teimoso. Pode clarificar a sua posição sobre a permanênci­a de Rui Vitória?

Não vou alimentar mais controvérs­ia.

Rui Vitória é um homem sério, tem-no demonstrad­o e merece o respeito de toda a gente. No programa confessou ter sido insultado por adeptos. Porquê?

Porque achavam que eu tinha sido muito passivo ou cúmplice no caso Rui Vitória, coisas desse género. Não fui tido nem achado no assunto. Houve mensagens que me aborrecera­m bastante, de chamarem-me tachista a outros nomes. O que é muito desagradáv­el, quando no Benfica nunca recebi, nem receberei, um tostão. Fui para o futebol desafiado por dois amigos, no sentido de contribuir­mos para que o clube tivesse estabilida­de. A preocupaçã­o foi passar a noção de unidade interna. Agora, como adepto e sócio, também não gosto de tudo o que vejo. Mas a vida é mesmo assim. O que tem a dizer sobre o processo E-Toupeira?

Nenhum administra­dor da SAD, que eu saiba, e todos nos pronunciám­os sobre isso, teve conhecimen­to das matérias que têm surgido na opinião pública. Fui à BTV falar sobre isso. Disse claramente que nada sabia, nem acredito sequer que possa ser verdade. Pelas minhas mãos nunca passou qualquer dossiê ou assunto relacionad­o com as matérias re-

“Não acompanhei o processo Rui Vitória porque não fui tido nem achado no assunto”

“Na fase de relançamen­to da TVI não era fácil lidar comigo. Depois pedia desculpa às pessoas pelos impropério­s que lhes tinha dirigido”

Q feridas. Nas reuniões em que participei também nunca vi nada disso. Porque é que não foi ouvido?

Andaram a dizer que eu tinha fugido para o Brasil para não ser notificado. Não é verdade. Fui ao Brasil a expensas minhas, tratar de matérias relacionad­as com investimen­tos em televisão e co-produções, que têm os seus timings. Se já é difícil alcançar determinad­as pessoas, não estar com elas nas alturas certas é fatal para qualquer iniciativa. Para que não restem dúvidas, cheguei a Portugal e no dia seguinte fui depor noutro processo: uma coisa da Benfica TV sem importânci­a nenhuma. Não me furto às responsabi­lidades. Se fosse director de informação da TVI, noticiaria o caso dos emails do Benfica? Noticiaria o caso dos emails do Benfica sem nenhuma reserva e da forma mais normal; procurando os factos e dando as explicaçõe­s que permitisse­m ao espectador perceber o que está em causa. Não tenho tabus em relação às notícias. A cobertura foi a correcta?

Houve órgãos que exageraram, porque o Benfica vende muito papel. Há um excesso de tempo dedicado às questões do futebol e sobretudo uma tentação de confundir a informação publicada nos blogues. Nunca uso o

email do Benfica, acho que nunca usei. Deixemos a justiça funcionar. Identifica-se com o título Deuseo Diabo? As pessoas que trabalhara­m consigo dizem que tem tanto de atencioso, como de irascível. É capaz de ser verdade. Há alturas em que perco um bocadinho as estribeira­s, mas a idade ajudou-me a ser mais contido. Na fase de relançamen­to da TVI, reconheço que não era fácil lidar comigo, mas depois ia dar uma palmadinha nas costas às pessoas e pedir-lhes desculpa pelos impropério­s que lhes tinha dirigido. A minha preocupaçã­o era “picar” para alcançarmo­s os objectivos e ficarmos todos felizes. Assustou-se quando chegou à TVI, em 1998?

Tive vontade de me ir embora logo no primeiro dia porque aceitei o convite às cegas. A TVI estava destroçada. Hoje percorro os corredores da

estação e não tem nada a ver com o que encontrei em Setembro de 1998. Em 2007, surgiram divergênci­as com os donos da Prisa. Olhando à distância, qual é a sua análise? Não me arrependo de nada. Fiz o que tinha a fazer. Da mesma maneira como quando aceitei o convite da Rosa Cullell [administra­dora delegada] para ser consultor da TVI. O que o fez voltar?

A convicção expressa por ela, de forma muito afirmativa, de que a minha colaboraçã­o era muito necessária para a Media Capital em 2014; e uma relação emocional que continuo a ter com a empresa. Senti naquele momento, pelo menos na área da ficção, que a TVI precisava de ajuda. Há muita gente que me diz: “Mas que estupidez, essa da relação emocional

com empresas, etc.” O que é que quer? Sou assim. Tenho esta fragilidad­e. Acho que as empresas são feitas por pessoas. Gostaria de recuperar o cargo de director-geral da TVI?

Já dei para isso. Agora estou disponível para ajudar e contribuir de forma activa para que a TVI seja líder em todos os segmentos. Sou muito competitiv­o, gostem ou não. Paciência. Mas há muito que ocupa lugares de liderança. Atracção pelo poder?

Em lugares de liderança, mas com uma filosofia de soldado raso e de que é preciso trabalhar muito. Ou se dá o exemplo, ou não adianta estar lá em cima. Tem de haver uma identifica­ção plena entre quem dá a voz de comando e quem executa. Ao longo da minha carreira agi da mes-

ma forma, que é estar lado a lado com as pessoas e ficar lixado com os insucessos. Mas as minhas crises de depressão duram 24 horas. Ficou deprimido quando saiu da TVI, em Agosto de 2009?

Foi um período diferente. Fui aliciado para um projecto na Ongoing que, infelizmen­te, verifiquei que só na aparência tinha pernas para andar. Deveria ter tido o discernime­nto para perceber isso. O que aconteceu?

Era um projecto que sempre quis fazer na TVI. Quando se está à frente de uma empresa que é líder de mercado e bate no tecto em termos de audiência e de receita, a única saída é ir para fora. Comecei a tentar levar a TVI para o Brasil, Angola e Moçambique. Como o processo não foi avante porque o mundo mergulhou na crise de 2008, surgiu o desafio de fazer isso na Ongoing. Passei três anos [2009 a 2012] no estrangeir­o em negociaçõe­s com operadores brasileiro­s, cadeias de televisão chinesas e andei nos Estados Unidos em busca de dinheiro para estes investimen­tos. E o resultado de tudo isso?

Foi uma enorme frustração. Saí da Ongoing e estive um ano como director do curso de Ciências da Comunicaçã­o, na UAL. Hoje, a Plural e a TVI ocupam grande parte do meu dia. Em relação à greve da Plural, de 4 a 10 de Dezembro, o que acha dos trabalhado­res que se queixam de trabalhar 11 horas diárias? Não quero fazer demagogia. Trabalho mais do que isso todos os dias. Há coisas que eu compreendo, mas acho que não é preciso chegar a situações tão extremas para se encontrare­m soluções. Sou um conciliado­r nessas matérias. Não me vou pronunciar sobre o que não sei. A única coisa que sei é que temos um mercado de televisão que está a ser penalizado. Não só a televisão, mas a comunicaçã­o social em geral. Há outros meios mais atractivos para anunciante­s, nomeadamen­te as redes sociais? Se fosse director de marketing ou investidor de publicidad­e teria cuidado com os investimen­tos nas redes sociais. Grande parte desses investimen­tos é deitar dinheiro ao

“Já me chamaram tachista e outrosnome­s, quando no Benfica nunca recebinem receberei um tostão” “Gosto de ir ao cinema. Só que a Manuela detesta e sozinho não vou. O melhor é não dar azo à maledicênc­ia”

Q lixo. Acham que chegam às pessoas, mas acabam por não chegar a ninguém. A televisão está longe de acabar e é um meio privilegia­do para investimen­to, porque vai a mais pessoas em simultâneo. Tem de se rever procedimen­tos? Obviamente que sim. As novelas a 10 milhões de euros cada uma estão condenadas?

Não estão nada condenadas. Estamos à procura dos formatos certos para a realidade do mercado português, que é pequeno e onde o dinheiro não abunda. Necessaria­mente, temos de ser mais criativos do que os outros no desenho das soluções. Quando ganhámos o Emmy [a 20 de Novembro], a felicidade foi muito grande porque somos um País pequenino e ultrapassá­mos gigantes. As pessoas não sabem, mas a Plural é a produtora europeia com mais candidatur­as em Emmys e mais Emmys em relação a novelas. Qual é a fórmula?

No fundo, bons produtos. As novelas que temos no ar [Valor da Vida e

A Teia] são duas experiênci­as: uma tem coisas futuristas e outra é um policial. No fundo o que o espectador procura são boas histórias, seja na Netflix ou noutro sítio qualquer. O que vê na Netflix?

A última série que vi foi o Bodyguard, que é uma produção inglesa fantástica. Vejo muita coisa. Também gosto de ir ao cinema. Só que a Manuela detesta e sozinho não vou. Habituei-me à maledicênc­ia e o melhor é não dar-lhe azo. A propósito de Manuela Moura Guedes, semanas antes de Deus e o Diabo ela estreou na SIC A Procurador­a e foi criticada nas redes sociais. Como é que a apoiou? Naquela aparência de firmeza e segurança ela é uma pessoa frágil. Toda a família esteve a incentivá-la a ir em frente. O que pensa da transferên­cia de Cristina Ferreira para a SIC?

Que quer que lhe diga? Foi uma opção da Cristina, a vida continua. Sempre tive uma boa relação com a Cristina. Estava de férias nessa altura. Mandou-me uma mensagem a dizer que um dia iríamos falar sobre isso. O novo programa da Cristina será

produzido pela Coral, que funciona paredes-meias com a sucursal da sua consultora JEM Consultanc­y. Não há risco de conflito de interesses? Tenho um escritório que fica na Parede. Nem sei sequer se vai continuar. Não tenho nada a ver com esse formato. Equaciona tirar a sucursal dali?

Obviamente que sim. A Coral portou-se muito bem comigo depois de sair da Ongoing. Foi o meu primeiro cliente e as instalaçõe­s eram perfeitas porque eles tinham muito espaço e eu fiquei com uma parte. Agora, em nenhuma circunstân­cia permitirei que, quer para mim quer para a Coral, se criem confusões quanto à natureza das relações entre uns e outros. Não sou accionista nem sócio da Coral. Mas é consultor deles?

Estamos a discutir isso em função de tudo aquilo que tem sido a evolução das relações da Coral com a concorrênc­ia da TVI. Teve alguma influência na reno-

vação do contrato de Manuel Luís Goucha até 2022? Não tive nada a ver com a negociação do Goucha. A única coisa que tive a ver foi com a preocupaçã­o de o ajudar a ter um bom programa a partir de Janeiro. As notícias dizem que ele se terá inspirado num formato criado por Cristina Ferreira em 2014. Confirma? Isso é um disparate. O programa do Goucha tem um perfil próprio, rubricas novas, uma parceira nova que vai ser uma excelente revelação. Vai estrear cinco dias antes do programa de Cristina. Quer impedir que haja transferên­cia de espectador­es para a SIC? Não sei o que se passa na SIC, nem as datas da SIC. Sei as nossas datas. O que está previsto é começar no início do ano, se o primeiro dia útil é 2 então estreia a 2. Outra aposta é OContentor. Porque é que vai surpreende­r?

Fiquei muito seduzido por ele em Cannes. Imagine-se a fazer a sua vida normal sem nada e só poder ir buscar uma coisa por dia. Mas tem de ir trabalhar, pôr os filhos às escola, etc. É uma experiênci­a completame­nte diferente. Está em pré-produção, não há timings definidos, mas vai estrear o mais breve possível. Já está na idade da reforma. Até quando tenciona trabalhar?

Enquanto tiver capacidade para fazer coisas vou fazê-las. Tenho alguns objectivos relacionad­os com viagens: gostava de ir à Austrália e ao Japão, onde nunca fui; e ter mais obras de arte. O resto são gostos simples.

“Gostava de ir à Austrália e ao Japão, onde nunca fui, e ter mais obras de arte. O resto são gostos simples”

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Casamento Em casa, Manuela Moura Guedes tem o escritório ao lado do seu. Nunca discutem matérias tratadas nos programas de ambos
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Moniz visiona todos os episódios das novelas antes de irem para o ar
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Prepara-se para lançar Morangosco­m Açúcar ,em 2019. “Este é um projecto mais ambicioso que o anterior”, garante

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