SÁBADO

Entrevista a Philip Reeve, autor do livro que inspirou Engenhos Mortíferos

Chega ao cinema Engenhos Mortíferos, adaptação – por um braço-direito de Peter Jackson – do universo criado pelo escritor britânico Philip Reeve, um Star Wars na Terra, daqui a mil anos. Falámos com o autor.

- Por André Santos

HÁ ALGUM TEMPO que se sabia que Peter Jackson desejava adaptar ao cinema os livros de Philip Reeve, em volta das suas cidades predadoras. Depois de

O Senhor dos Anéis, Hobbit meteu-se no caminho e Engenhos

Mortíferos foi ficando para trás. Até que decidiu passar o projecto a um dos seus braços-direitos, Christian Rivers. Assim, chega às salas um dos mais ricos universos da literatura de ficção científica dos últimos 20 anos. O primeiro livro da saga Engenhos Mortíferos saiu em 2001. Seguiram-se mais três – que fecham a história principal – e algumas prequelas que explicam elementos de um futuro na Terra, um milénio à frente. O que distingue a criação de Reeve de muitos livros semelhante­s é a existência de um futuro de difícil classifica­ção: não é pós-apocalípti­co, distópico ou próximo de qualquer caracteriz­ação que se tenha tornado moda. Ao telefone com o autor dos livros, tornou-se inevitável começar por isso mesmo: como é que um mundo que existe após uma guerra nuclear – Guerra dos 60 Minutos – nunca se lê (ou vê, no caso do filme) como pós-apocalípti­co? Reeve responde: “Quando comecei a escrever, a ideia de um mundo pós-apocalípti­co causado por uma guerra nuclear já estava fora de moda: era muito mais comum as histórias começarem com uma praga ou um asteróide. Eu só queria escrever sobre um mundo com cidades que se moviam, não me interessav­a o pós-apocalipse e não conseguia ver a sociedade actual a evoluir para isso. Portanto, decidi livrar-me da sociedade que conheço. Para isso teria de ocorrer um apocalipse e uma guerra nuclear pareceu-me o mais simples e eficaz.” E tudo a bomba leva em 60 minutos. Nascem então as cidades predadoras, cidades que se movem e atacam as mais pequenas, pelos recursos e pelas suas pessoas. É a sobrevivên­cia do mais forte levada a um ponto que possibilit­a muitas metáforas, uma ideia fantástica, que nasceu de uma necessidad­e: “Foi difícil chegar aí. Queria construir um mundo com uma série de personagen­s que estivessem quase sempre juntas, numa estrutura, mas faltava-me uma ideia central, algo que consolidas­se tudo. Foi então que a ideia de cidades com rodas me surgiu. Depois tive de encontrar uma razão para as cidades terem rodas: a certa altura tornou-se óbvio que as cidades grandes andariam atrás das pequenas e que as pequenas cidades andariam atrás de aldeias. Foi quando tive essa ideia que percebi que tinha um livro, foi a melhor ideia que tive e só então decidi começar a escrever.” Ideia que tem tanto de caricato como de séria, o conceito de “cidade predadora” oferece-se a vários entendimen­tos, a metáforas, e sendo a cidade principal Londres, está aberto o caminho

“Só queria escrever sobre um mundo com cidades que se moviam, não me interessav­a o pós-apocalipse”, garante Philip Reeve

para piadas fáceis sobre o Brexit: há uma frase no filme que brinca exactament­e com isso. Os livros foram escritos antes de o Brexit ser sequer uma ideia, mas é impossível ignorar o facto de Londres ser a “cidade má”, a grande potência que engole as outras e que procura mais e mais recursos.

Para Reeve não é uma questão de boa ou má: “Não é particular­mente malvada, só está a fazer o que tem de fazer. Não é pior do que as outras cidades. Podia ter escolhido outra cidade, ou até outro planeta, mas na altura andava a ler muito Charles Dickens e não me passou pela cabeça que podia ser outra cidade que não Londres. A ideia em si já era tão estranha que necessitav­a de algo que as pessoas reconheces­sem, que estivesse conectada com o mundo real, senão tornar-se-ia tudo muito disperso. Necessitav­a de lugares que o leitor reconheces­se, a catedral de St. Paul, Trafalgar Square, o metro...” Evitando spoilers – quanto mais virgem se for para Engenhos Mortíferos, melhor -, pode dizer-se apenas que a segunda parte do filme é muito Star

Wars, numa emocionant­e versão na Terra: Christian Rivers, especialis­ta em efeitos visuais, que assina o filme, agarra bem a essência do ambiente, na verdade influencia­do pela saga de George Lucas, como o próprio Reeve confessa à SÁBADO: “Tinha 12 anos quando vi o primeiro filme e foi isso que me levou para a ficção científica. Quando estava a escrever, percebi que na segunda parte precisava de uma superarma como a Estrela da Morte da Guerra das Estrelas.

Mas foi só isso. No filme, concordo que há mais elementos, mas não me importo”. Mais não se pode dizer. Apenas isto:

Engenhos Mortíferos é uma aventura dos diabos.

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 ??  ?? A saga Star Wars influencio­u a escrita de Engenhos Mortíferos: “Tinha 12 anos quando vi o primeiro filme”
A saga Star Wars influencio­u a escrita de Engenhos Mortíferos: “Tinha 12 anos quando vi o primeiro filme”
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Londres é a cidade principal, a grande potência de Engenhos Mortíferos: “Necessitav­a de lugares que o leitor reconheces­se”, justifica Reeve
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