OSENHOR4,725 MILMILHÕES DEEUROS
A conta pode chegar aos 10 mil milhões, mas ainda assim o ex-banqueiro tem a compaixão do Estado: até morrer pode viver na sua casa de luxo
Eram 18h45 de um fim-de-semana quando José de Oliveira Costa saiu da sua casa em Lisboa, entre o Largo do Rato e a Estrela. Era Novembro de 2018 e assinalavam-se exactamente 10 anos desde as primeiras notícias de irregularidades no Banco Português de Negócios (BPN) e o homem que geriu o banco entre 1998 e 2008 passava agora ao lado da marisqueira Sem Vergonha, situada ao lado de sua casa. Oliveira Costa mora no 5º andar de um prédio de luxo. Cá em baixo, à sua espera estava alguém que se identificou apenas como “um amigo de longa data”. O ex-banqueiro não quis falar com a SÁBADO eo amigo disse apenas que Oliveira Costa ia “fazer fisioterapia”.
Os dois homens viraram costas e seguiram lentamente, de braço dado, a conversar. Sobre os ombros de Oliveira Costa pesavam talvez dois números: 15 e 12 anos de prisão. O primeiro é a pena a que foi condenado por abuso de confiança, burla qualificada, falsificação de documentos, branqueamento e fraude fiscal qualificada no âmbito do processo principal do caso BPN. Na decisão de Maio de 2017 (rectificada há poucos dias, a 16 de Novembro), o Juízo Central Criminal de Lisboa não poupou nos termos: “culpa elevada (…) excepcionalmente grave ilicitude (…) estratégia pensada delineada e estruturada ao pormenor, que permitiu durante oito anos a omissão de registos contabilísticos (…) comportamento delituoso em vários negócios concretos (…) um montante de €9.253.246,09 de que se apropriou”. Também em Novembro, Oliveira Costa foi condenado a 12 anos de prisão por dois crimes de burla re-
TEM UMA REFORMA DE €2.600 DO BANCO DE PORTUGAL, MAS METADE FICA RETIDA PARA SALDAR DÍVIDAS
TEVE DUAS CONDENAÇÕES (15 E 12 ANOS) MAS AMBOS OS PROCESSOS ESTÃO PARADOS NOS RECURSOS
lacionados com negócios não financeiros, tendo a sentença termos como “gravíssimo dolo” e atitudes “oportunistas, gananciosas e sem escrúpulos”.
Os processos estão em sede de recurso e não há horizontes para saber se o ex-banqueiro alguma vez será preso. Em seu crédito tem oito meses de prisão preventiva (entre Novembro de 2008 e Julho de 2009) e 16 meses de prisão domiciliária (de Julho de 2009 a Novembro de 2010).
Usufruto em vida
Oliveira Costa reformou-se em Fevereiro de 2008, meses antes de rebentar o escândalo BPN. Em Março separou-se judicialmente de pessoas e bens, mas continuou a viver com a mulher, com quem tem dois filhos. Isolou-se socialmente e como trabalhou três décadas no Banco de Portugal tem uma reforma de €2.600 (metade retida para fazer face às dívidas).
Desde 2010, o Estado injectou 4,725 mil milhões de euros no BPN. Ou seja, há oito anos que cada português dá €59,06 todos os meses para pagar a gestão de Oliveira Costa. Para 2019, o Orçamento do Estado pede mais 548 milhões, e o enredo está a meio. Segundo o Jornal de Negócios, as sociedades-veículo criadas pelo Estado para ficarem com os activos do BPN (Parvalorem, Parups e Parparticipadas) tinham em 2017 capitais próprios negativos de 4,9 mil milhões de euros. O saldo final do BPN pode então custar mais de 10 mil milhões de euros – verba que daria para pagar toda a despesa com saúde pública prevista para 2019.
Apesar destes números desastrosos para as contas públicas, o ex-banqueiro conseguiu compaixão do Estado. Oliveira Costa mora no apartamento da Avenida Álvares Cabral em regime de usufruto em vida. O Estado – neste caso a Parvalorem – só vai alienar o imóvel quando Oliveira Costa morrer. O património foi um dos episódios do processo. Parecendo adivinhar o que aí vinha, Oliveira Costa fez uma partilha de bens com a mulher a 10 de Março de 2008. No documento, a que a SÁBADO teve acesso, o casal dividiu entre si 6,5 milhões de euros. Cada um ficou com metade, mas à mulher calhou o que era seguro (ver caixa). O Ministério Público (MP) não acreditou na bondade da separação e foi deitando a mão ao que pôde. Em 2013, Maria Yolanda acordou passar para a Parvalorem os imóveis, com um valor patrimonial tributário de 887 mil euros. Foi neste acordo que o Estado cedeu o usufruto em vida da casa de Lisboa. Um dos imóveis que passaram para o Estado, apurou a SÁBADO, foi vendido este ano (ver caixa). Oliveira Costa, nascido em 1935 em contexto rural e humilde, caminhou em frente até ao Jardim da Estrela, que atravessou vagarosamente e depois voltou para trás. Desceu para outra volta ao parque e seguiu depois para casa, uma hora após a partida. Estava feita a “fisioterapia”. O ex-banqueiro do BPN subiu depois no elevador até ao seu quinto andar, de onde, com vista para Lisboa e o rio, espera sentado.