MAIS DO QUE DUAS LÉSBICAS
Duas mulheres falam de si e sobre isto de estar no epicentro das artes do século XX: é Paris, há 100 anos, e é Gertrude Stein e Alice Toklas na sua sala de estar.
QUANDO as vidas de Gertrude Stein e de Alice B. Toklas se cruzaram em Paris em 1907 o mundo era um local bem diferente – e Paris uma capital do mundo, um ponto de encontro entre artistas que iriam influenciar
gerações. A peça de Win Wells, Gertrude Stein e
Acompanhante, com encenação, dramaturgia e versão cénica de Fernanda Lapa cria um ponto de encontro entre a vida de ambas, enquanto casal, mas também de como duas americanas, que se conheceram naquela Paris, viveram a cidade numa existência em constante diálogo com os seus artistas e com aqueles que por lá passavam.
A peça move-se ao ritmo de uma conversa entre as duas, improvável, inexistente, que vê a sua relação numa Paris e num mundo artístico que sobreviveram a duas grandes guerras.
Tanto uma como a outra deixaram – boas – memórias desses tempos. Gertrude Stein com as memórias, contadas pelas voz de Toklas, The Autobiography of Alice B. Toklas (1933) ou o brilhante Cookbook (1954) de Toklas, onde os seus dotes culinários são um pretexto para falar dos encontros sociais que as duas viviam.
Gertrude Stein e Acompanhante cria um espetáculo em que as duas existem não apenas como elas próprias, mas também como outras figuras com quem conviveram, como Picasso, Mabel Dodge ou Leo Stein, o irmão de Gertrude, um importante crítico e colecionador de arte. Apesar do selo gay colado à peça (Stein e Toklas foram um casal ao longo de 30 anos – Stein morreu em 1946, Toklas faleceria duas décadas depois), Gertrude Stein e Acompanhante resulta como um diálogo sobre o século XX, cimentado sobretudo nas artes – plásticas e literatura – e na influência do salão em
A peça, sobre a vidade Gertrude Stein e Alice Toklas, é um diálogo sobre o século XX, nas artes
Paris que Stein geria, frequentado por Picasso, Matisse, Ezra Pound, Hemingway ou Fitzgerald. Apesar da carreira de Gertrude enquanto artista ser literária, esta desempenhou também um papel enquanto colecionadora de arte, influenciada pelo seu irmão, um mestre a criar ligações e relações – artísticas, de negócio e não só – nas artes plásticas. Gertrude estava no momento certo, na época certa, para ser aquilo a que hoje chamamos influencer. Com um talento admirável na escrita,
enquanto romancista, poetisa e dramaturga, tinha também um gosto irrepreensível na escolha e compra de arte. Gertrude Stein e Acompanhante estará em cena no Teatro Municipal São Luiz e terá Nuno Vieira de Almeida em palco, ao piano, a tocar peças musicais do período modernista de compositores que conviveram com o casal.