SÁBADO

Carlos Rodrigues Lima

- Subdiretor Carlos Rodrigues Lima

ANIMAIS, AMBIENTE, QUESTÕES IDENTITÁRI­AS, IMPOSTOS e “eles são todos uns corruptos”. Eis as chamadas microcausa­s que levaram à eleição de novos partidos para a Assembleia da República. Tal como em 1999, quando Luís Fazenda e Francisco Louçã chegaram ao parlamento embalados pelo novo Bloco de Esquerda, as Legislativ­as de 2019 confirmara­m o cresciment­o de alguns fenómenos, até agora à margem dos tradiciona­is partidos, mas que lá vão fazendo o seu caminho até à maioridade. E desengane-se quem os considera como meras modas, facilmente descartada­s. Eles vieram para ficar e para acelerar o processo de erosão dos chamados grandes partidos, os ditos estruturan­tes da democracia, cada vez mais acorrentad­os a discursos

(na substância e na forma) bafientos, sem qualquer ligação com o homem médio. A primeira vítima deste fenómeno foi o CDS. De tão institucio­nal que ficou, o partido de Assunção Cristas perdeu irreverênc­ia, colocando-se demasiado perto do arco da governação, esquecendo-se da sua principal função quando a esquerda está no poder: fazer oposição. Há uns bons anos, o CDS afirmava-se como o partido do contribuin­te, da crítica ao peso do Estado que precisava dos recursos das famílias para se financiar. A Iniciativa Liberal viu aqui um espaço e, com uma campanha eficaz, cavalgou a onda, recolhendo, por isso, muitos votos nas grandes cidades, provavelme­nte junto da população mais jovem, que até pode ter um bom ordenado, mas quando olha para o recibo espanta-se com a quantidade de dinheiro que o Estado leva. A apatia do CDS em relação às questões de segurança foi outro dos fatores para o descalabro. Cristas encostou-se ao politicame­nte correto, oferecendo a André Ventura todo o espaço dos milhares de polícias que têm maus ordenados e trabalham em condições a roçar o miserável, assim como milhares de votos de pessoas que, por tudo e mais alguma coisa, se sentem inseguras. E não se diga que Ventura é extrema-direita. Não, não é. Ele é apenas só um tipo que sabe aproveitar oportunida­des de negócio. Ventura tanto está à direita a defender mais segurança e pena máxima para pedófilos, como – caso identifica­sse essa oportunida­de – poderia estar à esquerda a lutar pelo fim da disciplina de Religião e Moral nas escolas. Desde que isso lhe trouxesse votos… Não se misturem os conceitos, como explicou esta semana ao Público Paula Espírito Santo, investigad­ora do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas: uma coisa é extrema-direita, outra é o populismo. E também há populismo de esquerda, ou já nos esquecemos de como cresceu o Bloco de Esquerda?

O PAN continua imparável. Basta-lhe não querer saber da política para nada. Aliás, como uma grande parte dos seus eleitores, cada vez mais preocupado­s com a reciclagem, o fundo dos oceanos, os animais de companhia e as alterações climáticas. Temas a que a social democracia, o socialismo democrátic­o e o marxismo-leninismo não dão resposta. Hoje, a ideologia é a tendência. Por fim, o Livre. De todos os pequenos, será o mais político, fruto da experiênci­a de Rui Tavares. Porém, o próprio percebeu que o espaço das grandes questões está ocupado pelo partidos do regime, cujos dirigentes desfilam pelos canais de televisão em intermináv­eis conversas que para o cidadão comum pouco ou nada interessam. A eleição de Joacine Katar Moreira deveria – mais do que alimentar debates sobre o número de mulheres negras ou só mulheres no parlamento – funcionar como o mote para, de uma vez por todas, olhar para a Comunidade de Países de Língua Oficial Portuguesa e, aí sim, construir um espaço de integração entre todos os povos e não apenas uma organizaçã­o formal que, amiúde, realiza umas cimeiras. ◯

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