Pedro Marta Santos
O TEMPO É a única coisa que não temos tempo para pensar. Não é só o tempo subjectivo, como os dias distendidos, desesperantes, da espera dos resultados de um exame do qual pode depender a vida ou a morte (no espectro da morte, a subjectividade do tempo pouco importa). E o tempo ínfimo mas eterno, que emolduramos, do momento do beijo da primeira paixão na adolescência. Ou o longuíssimo tempo na educação de um filho – um dia, ele há-de desiludir-nos, e nós a ele; mas temos tempo para isso. O tempo parece simples. Passado. Presente (esse presenteia-nos pouco; fixamo-nos mais na certeza enganadora do que foi e na esperança de algo que não existe, o futuro). E o mais difuso dos tempos, o que acontecerá. Ou talvez não. No próximo dia 16 de Novembro – os dias são medidas finas e ténues que inventámos a partir de uma rotação completa da Terra sobre si mesma –, na Aula Magna, Lisboa, um dos sete mil milhões de humanos que melhor pensa sobre o tempo irá falar-nos das numerosas cronologias do cosmos, das partículas e da saudade que sentimos de umas e outras, mesmo sem o sabermos. Carlo Rovelli é um físico italiano obcecado pelas camadas da (in)temporalidade. É autor de A Ordem do Tempo (Objectiva, 2018), grande livro sobre verdades enormes. Ele sabe que o Mal é do reino da ética, mas reconhece que o tempo é o mal maior: incomoda e corrói tudo o resto, até o conceito de corrosão.
Rovelli trabalha no domínio da gravidade quântica, essa tentativa um pouco vaidosa de uma Teoria de Tudo. Acontece que ao nível muito pequeno, o das partículas fundamentais, o princípio da causalidade não existe. O tempo está suspenso: não é possível saber em simultâneo a posição e a velocidade de nada (em termos nano, até o nada é relativo). Já na caldeira arrefecida do Universo, a Teoria da Relatividade confirma que o tempo está ligado ao espaço como um berlinde numa colcha. Quanto mais depressa nos movemos, mais devagar passa o tempo. Quanto mais perto estamos de um objecto com grande massa, mais depressa o tempo passa. Entre o pequeníssimo e o incomensurável, resta a nossa percepção do tempo. É a medida de criaturas demasiado finitas e defeituosas para o colossal fluxo de energia que as rodeia. E chegamos ao segredo sem resposta: para além da sensação que dele temos, haverá tempo? ◯