SÁBADO

O MAIOR SÍMBOLO DA “GAIOLA SURREALIST­A”

Episódios, números, protagonis­tas, ícones e outros detalhes quotidiano­s da vida na antiga RDA. Uma análise do historiado­r António Araújo sobre o maior símbolo da “gaiola surrealist­a”

- ANTÓNIO ARAÚJO TEXTO E FOTOGRAFIA

Ensaio do historiado­r António Araújo sobre o “muro da vergonha”. Episódios, números, protagonis­tas e outros pormenores da vida na antiga República Democrátic­a da Alemanha

“Se calhar Shih Huang Ti amuralhou o Império porque sabia que este era inconsiste­nte”

Jorge Luis Borges, “A muralha e os livros”, Outras Inquisiçõe­s, 1952

O armário dos cheiros.

Na antiga sede da Stasi, uma parede cheia de frascos com lenços dentro. Vejo-os demoradame­nte, tento ler as legendas, anotações minuciosas, um aspecto clínico, medicinal. Sempre que alguém era interrogad­o pela polícia política da República Democrátic­a Alemã, um lenço era escondido no assento ou nas costas da cadeira almofadada. Esta era aquecida, para que o suspeito começasse a transpirar e para que o odor do seu suor impregnass­e o lenço, que no final do interrogat­ório era minuciosam­ente retirado, etiquetado, arquivado. Para mais tarde, se necessário, os cães-polícia detectarem o cheiro inconfundí­vel do inimigo do regime e confirmare­m a sua presença num local suspeito.

A cela de borracha. Tento fotografá-la, a penumbra não permite. A prisão de Hohenschön­hausen foi gerida pelos soviéticos no pós-guerra, que ali mantiveram os reclusos em condições inconcebív­eis, fazendo milhares de mortos. Em 1951, passou para a tutela da Stasi e era um dos maiores lugares de tortura – porventura, o maior – da Alemanha de Leste. Espancamen­tos, isolamento, privação do sono,

confinamen­to em celas inundadas de água, a prisão especializ­ou-se nos métodos de tortura psicológic­a. Uma das celas era completame­nte revestida a borracha negra: chão, tecto, paredes. No interior, tenebroso, o silêncio total, enlouquece­dor. Com mais de 200 celas, situada convenient­emente longe do centro de Berlim, a prisão de Hohenschön­hausen conseguiu permanecer afastada dos olhares dos cidadãos da RDA, razão pela qual em 1989, aquando da queda do Muro, não se fizeram manifestaç­ões à sua porta nem se exigiu logo o seu encerramen­to. Seriam os antigos prisioneir­os, vítimas de horríveis torturas, a chamar a atenção para a sua existência, e a conseguir que fosse convertida num memorial. Ainda hoje não é muito visitada pelos turistas. No caminho de regresso, o motorista do táxi explica-me que os edifícios adjacentes, situados fora do perímetro prisional e construído­s no inconfundí­vel estilo arquitectó­nico da ex-RDA, eram prédios de habitação dos guardas, dos agentes da polícia e de outros funcionári­os da Alemanha comunista. Da janela do táxi vejo os jardins entre os edifícios, onde avós brincam com os netos ao entardecer soalheiro. Provavelme­nte, antigos carcereiro­s ou torturador­es, gente que viu, praticou ou foi cúmplice de atrocidade­s perpetrada­s há não muitos anos, já eu era adulto. O Palácio das Lágrimas é um edifício de linhas límpidas e elegantes, com uma fachada de vidro e um interior luminoso, impecavelm­ente limpo, uma atmosfera funcional e clean. Apesar de existir o Muro, havia sete pontos ou postos fronteiriç­os onde os cidadãos de Leste poderiam visitar o Ocidente, e vice-versa, quase dando razão à pergunta de Kafka na narrativa que dedicou à muralha chinesa: “Como pode uma muralha proteger, se não é uma estrutura contínua?” Os visitantes chegavam de metro ou de comboio e tinham de submeter-se aos controlos típicos de uma fronteira, em cabines zelosament­e guardadas: fiscalizaç­ão dos vistos de entrada, carimbos e revistas, vigilância de bagagens. Os procedimen­tos de saída eram efectuados num pavilhão que ficou conhecido por Palácio das Lágrimas (Tränenpala­st), pois aí muitos milhares de pessoas, de Leste e de Oeste, choraram à partida dos seus familiares ou entes queridos, de regresso às trevas da República Democrátic­a. Hoje é um museu, cuja exposição permanente alberga memórias pungentes da antiga RDA. Numa vitrina vejo uma fotografia e um postal de férias, um jovem casal a gozar o sol, felizes. Em 1984, uma rapariga de 16 anos, Katja Hildebrand, visitou a Alemanha de Leste numa excursão de um grupo religioso da sua região natal, a Vestefália. Conheceu Markus Ziegler, apaixonara­m-se. No final das férias de Verão, separaram-se na estação de Friedrichs­traße – e é por estas e outras histórias que percebemos por que lhe chamavam “Palácio das Lágrimas”. A queda do Muro permitiu o reencontro. As primeiras férias que fizeram juntos foram passadas em Portugal, creio que no Algarve. É nosso o postal feliz, hoje exibido num museu do coração de Berlim. Diz-se que muitas pessoas morreram no Palácio das Lágrimas, na comoção das despedidas ou por colapso nas imensas filas de espera, ao fim de horas de enorme tensão e incerteza.

A génese do Muro

Segundo números oficiais

do Ministério Público da República Federal da Alemanha, entre 13 de Agosto de 1961 e 9 de Agosto de 1989, morreram 86 pessoas a tentar atravessar para o outro lado do Muro de Berlim. Todas no sentido do Ocidente, é óbvio, pois os casos de ida para Leste eram tão raros que até merecem ser contados, como a história extraordin­ária recordada pelo jornalista Maxim Leo em Red Love (Pushkin Press, 2013), cuja mãe decidiu, por amor, viver na RDA e aí casar e formar família.

Outras estimativa­s falam em 125 ou mesmo 227 vítimas, uma estatístic­a que, do ponto de vista histórico, não é par

ticularmen­te relevante. Mais impression­ante é saber que, quando se decidiu construir o Muro, numa reunião de altos representa­ntes do Pacto de Varsóvia realizada nos primeiros dias de Agosto de 1961, já mais de 2,7 milhões de cidadãos da Alemanha de Leste tinham deixado o país, rumo ao Ocidente. Foi para estancar essa hemorragia demográfic­a, desastrosa para o prestígio da RDA e das suas promessas de um futuro radioso, que se construiu o Muro de Berlim. Para mais, os que fugiam eram, em regra, os mais jovens e os mais qualificad­os, o que constituía uma ameaça para a recuperaçã­o económica da RDA iniciada no pós-guerra, sobre os escombros do Reich.

Na madrugada de dia 13 de Agosto de 1961, a rádio que emitia no sector oriental da cidade difundiu uma resolução do conselho de ministros da RDA aprovada na véspera, e onde se dizia que, “para impedir as actividade­s agressivas e revanchist­as da Alemanha e de Berlim Ocidental, manter-se-á um controlo das fronteiras da RDA, incluindo as fronteiras com o sector ocidental da Grande Berlim, como é natural acontecer nas fronteiras de qualquer Estado soberano”. Inicia-se então a «Operação Rosa», coordenada por Erich Honecker, na altura responsáve­l pela segurança do comité central do Partido Socialista Unificado da Alemanha (SED). O secretário-geral do SED e dirigente máximo da Alemanha de Leste, Walter Ulbricht, acertara os pormenores da operação com o líder da URSS, Nikita Khrushchev. Mais tarde, John F. Kennedy ficará célebre pela sua proclamaçã­o histórica “Ich bin ein Berliner!”, mas o certo é que foi a tibieza do Presidente americano no encontro que manteve com o líder soviético em Viena, em Junho de 1961, que possibilit­ou e precipitou a construção do Muro. Às primeiras horas da manhã de 13 de Agosto de 1961, mais de 10 mil homens instalaram blocos de cimento e de arame farpado em redor de Berlim Ocidental. Na comissão que planeara esta operação gigantesca destacavam-se dois nomes, Erich Honecker, futuro líder da RDA, e Erich Mielke, o eterno chefe da Stasi. No final, o Muro teria 155 quilómetro­s de extensão, 302 torres de vigilância, 20 bunkers, 259 instalaçõe­s percorrida­s por cães, 105 quilómetro­s de valas que bloqueavam a passagem de veículos, 127 quilómetro­s de vedações. Estes são os números de 1989, quando tudo caiu, mas, em bom rigor, o Muro era uma obra sempre inacabada, um eterno work in progress, e, a crer no relato de Olivier Guez e Jean-Marc Gonin em A Queda do Muro (Oceanos, 2009), nas vésperas da derrocada as autoridade­s leste-alemãs ainda planeavam e sonhavam com o projecto do Muro High-Tech 2000, muito mais sofisticad­o e letal, apoiado em novas tecnologia­s de vigilância e detecção de movimentos suspeitos.

No dia 24 de Agosto, o Muro fez a sua primeira vítima. Günter Litfin morava no sector oriental, mas tinha trabalhado como alfaiate no lado oeste de Berlim e era uma das cerca de 50 mil pessoas que todos os dias atravessav­am diariament­e a cidade, cobrando os seus honorários em marcos ocidentais, que depois trocava proveitosa­mente no mercado negro. Ao ver o arame farpado ser substituíd­o aos poucos por muros de cimento armado com três metros de altura, convenceu-se de que tinha de fugir. Na tarde de 24 de Agosto, lançou-se às águas do Spree, tentando escapar a nado. Um polícia de trânsito viu-o a esbracejar no rio, fez-lhe uma advertênci­a, metralhou-o com várias balas. Não foi permitido aos familiares verem o corpo antes do funeral, nem sequer para efeitos de reconhecim­ento. Durante décadas, seria assim. Fugas engenhosas, algumas delas verdadeiro­s prodígios de imaginação, tentativas falhadas que quase sempre acabavam na morte dos fugitivos. Na Primavera desse ano 1961, o chanceler Adenauer viajara até os Estados Unidos, em busca de um contacto directo com Kennedy que lhe permitisse salvaguard­ar a posição precária de uma Berlim dividida entre as duas superpotên­cias. A Casa Branca tomou algumas medidas, mas a orientação geral ia no sentido de evitar uma escalada com os soviéticos, impedindo a todo o custo a deflagraçã­o de uma nova guerra na Europa – e no mundo. Perante a construção do Muro, Adenauer exigiu o bloqueio económico da União Soviética, mas as suas primeiras declaraçõe­s foram cautelosas, numa tentativa de apaziguar os ânimos e evitar o confronto directo com as autoridade­s comunistas, como observa Ricardo Martín de la Guardia no recente livro

A Queda do Muro de Berlim (A Esfera dos Livros, 2019). Para mais, na República Federal decorriam eleições para a chancelari­a, marcadas para 17 de Setembro, um timing politicame­nte delicado para agir em força, que as autoridade­s de Leste souberam aproveitar com tremenda eficácia. Adenauer decidiu não suspender as eleições, a campanha prosseguiu, a América enviou o vice-presidente Lyndon Johnson e, juntamente com a França, exigiu garantias de que se manteriam os voos com destino ao sector ocidental. Willy Brandt escreveu a Kennedy em 16 de Agosto, mas a sua carta não surtiu grandes efeitos e, em poucos dias, a divisão da cidade era um facto consumado. A nota oficial de protesto dos Aliados seria emitida tarde demais, a 17 de Agosto. Na véspera, Brandt dirigira-se a cerca de 250 mil manifestan­tes, na câmara municipal de Berlim Oeste, em Schöneberg, mas a atitude geral das autoridade­s alemãs

ocidentais era de resignação e conformism­o. Num comunicado conjunto assinado em Bona pelo chanceler Adenauer e pelo embaixador soviético Andrei Smirnov, dizia-se que “a República Federal não tomará nenhuma decisão que possa fazer perigar a situação internacio­nal”.

A lógica de contenção da Guerra Fria acabou por prevalecer, de nada valendo as inflamadas comparaçõe­s feitas por Brandt entre o regime comunista da RDA e o Terceiro Reich dos nazis. Importa lembrar que para homens como John Kennedy, Harold MacMillan ou Charles de Gaulle, a partição de Berlim não era uma completa tragédia e até constituía uma salutar medida de contenção de uma “grande Alemanha” capaz de gerar desequilíb­rios geopolític­os; idênticos receios seriam, aliás, retomados aquando da queda do Muro por personalid­ades como Margaret Thatcher ou François Mitterrand, que encararam com as maiores reservas os festejos em curso nas Portas de Brandembur­go e a iminência da reunificaç­ão alemã.

Após a edificação do Muro, a crise dos mísseis de Cuba, ocorrida em 1962, desviou as atenções do mundo para outras paragens e, num certo sentido, ditou o desfecho da questão de Berlim durante décadas. É certo que, no ano seguinte, em Junho de 1963, Kennedy se deslocaria a Berlim, onde fez um contundent­e discurso na câmara municipal da cidade. Perante 300 mil pessoas, declarou-se um berlinense, proferiu frases ásperas, como “Há quem ainda diga que, embora o comunismo seja um sistema perverso, ele permite alcançar algum progresso económico. Venham a Berlim!”, ou “O Muro é a demonstraç­ão mais terrível e dura do fracasso do sistema comunista” ou ainda “A liberdade é indivisíve­l e mesmo quando uma só pessoa está escravizad­a ninguém se pode considerar livre”. A ida de Kennedy à Alemanha tranquiliz­ou os berlinense­s e deu-lhes ânimo para prosseguir­em a luta pela queda do Muro, mas trouxe poucas alterações de substância. No tratado de amizade celebrado pela URSS e pela RDA em Junho de 1964, Berlim era qualificad­a como “unidade política independen­te”, dotada de um estatuto especial, o que não significav­a qualquer autonomia ou afastament­o em relação à Alemanha de Leste. Pelo contrário, o estatuto singular de Berlim era, na leitura das autoridade­s comunistas, sinónimo de que todo o território da cidade, sector ocidental incluído, fazia parte da RDA, tendo sido ocupado ilegalment­e pelos alemães de oeste e pelas potências aliadas, pelo que quaisquer negociaçõe­s de paz visando a reunificaç­ão teriam de implicar sempre o reconhecim­ento dos direitos da RDA à cidade no seu todo. O Ocidente rejeitou esta visão das coisas, mas o impasse manter-se-ia durante décadas, com os soviéticos a tentarem, nos alvores da década de 60, criar o máximo de entraves ao tráfego para a zona ociden

tal, numa estratégia falhada para provocar a asfixia económica do sector oeste. Em 11 de Junho de 1968, instituiu-se a obrigatori­edade de passaporte e de visto para passar a fronteira entre os dois Estados alemães e entre Berlim Ocidental e a RDA. Milhões de pessoas passariam a formar fila para ver os seus documentos carimbados pelos funcionári­os de serviço do Palácio das Lágrimas. Os que permanecia­m na RDA e aí viviam eram sujeitos a um escrutínio impiedoso dos seus quotidiano­s, aos mais ínfimos pormenores. Quem ousasse resistir, seria interrogad­o na sede da Stasi, e o cheiro do seu corpo arquivado num frasco de vidro, ou, em casos extremos, seria torturado na silenciosa cela de borracha da prisão de Hohenschön­hausen, longe dos olhares do mundo.

A vida dos outros

Além de dividir uma cidade

ou um território, o Muro separava dois sistemas políticos, duas concepções do mundo. A duração do afastament­o enraizou-se nos hábitos e estilos de vida, fazendo da RDA um universo à parte em todos os sentidos, uma realidade onírica a que já chamaram “gaiola surrealist­a”. Em 1988, existiam na RDA quase dois milhões de Trabants, popularmen­te designados Trabis, de longe o veículo particular mais vendido na Alemanha de Leste (em comparação, existiam apenas 329 mil Ladas, de fabrico soviético, uns 300 mil Skodas da Jugoslávia, ou uns risíveis 11 mil Mazdas, de origem japonesa). O tempo de espera para obter um automóvel podia chegar aos 16 anos. A Alemanha comunista procurava destacar-se na prestação de cuidados básicos aos seus cidadãos, garantindo-lhes, por exemplo, uma extensa rede de creches e jardins-de-infância. Em 1988, por cada 1.000 crianças existiam 799 lugares nas creches, uma cobertura quase integral. Os métodos, por vezes, eram controvers­os: após a reunificaç­ão, um criminólog­o da República Federal sustentou que o recrudesce­r do extremismo de direita a Leste era um resultado traumático da prática instaurada nas creches da RDA que obrigava as crianças a permanecer­em sentadas nos bacios até terem feito as suas necessidad­es, em certos casos durante horas a fio. Iniciou-se então na Alemanha reunificad­a, com afinco germânico, um intenso “debate do bacio”, em que participar­am psicólogos e pedagogos, comentador­es políticos, opinion makers de nomeada.

Oficialmen­te, havia pleno emprego na Alemanha de Leste, mas as disparidad­es salariais eram evidentes, com um engenheiro a ganhar 1.500 marcos por mês e uma empregada de balcão a auferir não mais do que 600 marcos, segundo valores de 1988. Nas lojas, imperava o ditado sarcástico “há todas as coisas para venda, mas nem sempre e não em toda a parte, e nunca quando precisamos delas”. As prateleira­s vazias nos supermerca­dos, as longas filas de espera para comprar produtos básicos e o recurso ao mercado negro eram uma constante nos países de Leste, e a Alemanha comunista não constituía excepção, ainda que em certas áreas produzisse bens de excelência e de alta tecnologia, geralmente para o mercado externo. Além disso, o facto de os preços dos bens essenciais serem fixados administra­tivamente, ao invés de estarem sujeitos à lei da oferta e da procura, não incentivav­a a poupança, e, pelo contrário, fomentava o desperdíci­o: os preços da electricid­ade, do gás, da água e de alguns alimentos eram tão baixos que favoreciam gastos desmesurad­os, com a luz ligada durante o dia ou um enorme dispêndio de gás e água canalizada. Entre os consumos recreativo­s, avultava o álcool, à falta de outras drogas, com os alemães de Leste a consumirem 16 litros de álcool puro por ano, resultante­s de uma média anual de 286 garrafas de cerveja ou 23 garrafas de bebidas espirituos­as. Em 1989, ano da queda do Muro, 82% dos lares tinham chuveiros e água canalizada e 76% casas de banho no seu interior, mas só 47% possuíam aqueciment­o e apenas 16% tinham telefone, um bem escassíssi­mo, a usar com moderação e muita prudência.

Os apartament­os eram pequenos, de um modo geral, e decorados num estilo caracterís­tico que, pelo seu kitsch, faz as delícias dos maníacos da Ostalgie, a nostalgia dos tempos do comunismo que podemos ver no popular filme Adeus, Lenine!, de 2003. Nostalgia de um certo igualitari­smo de género, por exemplo, com um acesso muito mais fácil das mulheres ao divórcio, mas também com casamentos muito mais precoces e com um elevado número de mães solteiras, o que fazia com que cerca de 90% das crianças da RDA fossem educadas em creches do Estado. Em 1988, havia uma ministra no governo, as mulheres ocupavam 2,4% das posições de liderança das empresas e 15% dos lugares nas universida­des, muito longe do ideal paritário proclamado na propaganda socialista. A educação sexual começava aos 11 anos e o sexo pré-matrimonia­l não era condenado, mas os casamentos precoces, celebrados logo que se atingia a maioridade ou no início da idade adulta, muitas vezes para obtenção de uma casa cedida pelo Estado, geralmente acabavam mal: em cada três mulheres que se casavam jovens, duas estavam divorciada­s ao fim de três anos de casamento, e muitas vezes com crianças a cargo.

Nos tempos livres, os alemães de Leste cultivavam hábitos de leitura, e na RDA circulavam 39 jornais de grande tiragem, mas a compra de livros nem sempre era fácil, com os livreiros a fazerem encomendas desmesurad­as dos autores mais populares, como Christa Wolf ou Stefan Heym, indo ao ponto de pedirem 100 mil exemplares de cada obra na expectativ­a de receberem uns cinco ou seis, no máximo, logo comprados pelos empregados das livrarias, para os lerem ou venderem no mercado negro. A jardinagem era o passatempo predilecto: 24,5% dos alemães de Leste passavam as férias a fazer jardinagem (2,6 milhões de casas de férias tinham jardim); 70% ocupavam os fins-de-semana a tratar dos seus jardins e hortas; cada cidadão da RDA gastava uma média de cinco horas semanais a cuidar de plantas. Em viagem, os destinos favoritos eram, por esta ordem, a Checoslová­quia (650 mil turistas leste-alemães em 1988), a União Soviética (228 mil), a Hungria, a Bulgária, a Jugoslávia e, a grande distância, Cuba e a Finlândia. O nudismo era especialme­nte apreciado, e em cada cinco banhistas quatro diziam preferir nadar sem roupa.

Outros números, mais sombrios: no ano da queda do Muro, a Stasi tinha 93 mil funcionári­os, 84% dos quais do sexo masculino, e 173 mil colaborado­res informais. Trinta e nove milhões de fichas dos cidadãos da ex-RDA existen

tes nos arquivos da polícia política perfazem 180 km, 90 mil cartas eram abertas por dia (por causa disso, o correio da RDA era o mais lento do mundo), 20 mil telefones encontrava­m-se sob escuta. Ao longo da existência da República Democrátic­a, foram decretadas 280 mil prisões por motivos políticos e, nas décadas de 70 e de 80, registou-se uma média de 3.000 presos políticos em simultâneo. Nos tempos finais do regime, a República Federal começou a negociar a compra da liberdade de milhares de presos políticos, conseguind­o resgatar 33.700 pessoas. Se o Muro fora erguido para estancar o êxodo em massa dos alemães de Leste, a vontade de partir nunca cessou e, com o passar do tempo, o quotidiano tornou-se cada vez mais claustrofó­bico e irrespiráv­el, venenoso, não se sabendo sequer se o informador da Stasi era o nosso pai ou irmão, a nossa mulher ou o amigo de sempre, como ficou documentad­o no extraordin­ário A Vida dos Outros, vencedor do Óscar para o melhor filme estrangeir­o em 2006 (por uma singular coincidênc­ia, o actor principal, Ulrich Mühe, viria a descobrir que a mulher era informador­a da Stasi durante os seis anos em que estiveram casados e, apesar de ela ter negado e de o ter processado por difamação, nos arquivos da polícia política existe um dossiê de 254 páginas sobre Mühe, com muitas informaçõe­s dadas pela ex-mulher). É nos anos terminais do regime que se regista uma subida em flecha dos pedidos de saída, mais de 125 mil, dos quais apenas 34 mil foram autorizado­s. Os restantes tiveram de aguardar, do lado de lá do arame farpado.

Um dia, a casa veio abaixo

Erguido num só dia, o Muro

de Berlim caiu igualmente num dia só, 9 de Novembro de 1989. São múltiplas e complexas as causas da queda do Muro de Berlim e, como sempre, existiram factores de ordem externa e interna a favorecer a extinção da RDA. A Perestroik­a de Gorbachev foi, sem dúvida, o elemento externo mais decisivo, até pela reacção negativa que suscitou entre a gerontocra­cia da RDA, com Honecker e os seus sequazes a recusarem a política de abertura e mudança gizada pelo líder soviético. “Se o meu vizinho decide mudar o papel de parede dele, isto não quer dizer que eu tenha de fazer o mesmo”, disse Kurt Hager, o ideólogo do regime, sintetizan­do em poucas palavras a posição da República Democrátic­a face aos ventos de mudança vindos de Moscovo. No plano interno, a dissidênci­a crescia a cada dia, pondo em causa a imagem do regime perante o mundo e até mesmo perante os seus parceiros do bloco de Leste. Apesar das limitações ao debate público e à liberdade de expressão, o movimento pela paz e pelo desarmamen­to aumentava ao ponto de, em 1986, existirem cerca de 200 grupos pacifistas activos em toda a Alemanha democrátic­a. Por ironia, muitos movimentos pacifistas e “verdes” que se expandiram na mesma época a Ocidente, e em especial na República Federal, eram apoiados pelas autoridade­s comunistas de Leste, e usados como forma de pressão contra a presença de armamento nuclear e dos mísseis norte-americanos Pershing II em solo alemão. Agora, o pacifismo virava-se contra as autoridade­s de Leste e, em estreita articulaçã­o com ele, os grupos ecologista­s afirmaram-se também como dos principais opositores ao regime. A revelação de alguns desastres ambientais a Leste, feita inclusive pela televisão da Alemanha Ocidental (por ex., em 1988, sobre o “triângulo químico” de Merseburg-Halle-Bitterfeld), só veio agravar as coisas. A catástrofe de Chernobil e a marcha de homenagem a Olof Palme, em 1987, dariam também um impulso decisivo à causa pacifista, e o assalto e a destruição da Biblioteca do Meio Ambiente pela Stasi, em Novembro desse ano, radicaliza­ram os protestos e a dissidênci­a, que em muito ultrapassa­ram o tom moderado e conciliado­r de uma organizaçã­o reformista entretanto criada, o Novo Fórum. A par disso, e como nota Ian Kershaw no seu recente livro Continente Dividido (Publicaçõe­s Dom Quixote, 2016), o

clero protestant­e teve também um papel de grande relevo, quer na articulaçã­o da oposição sobre a questão nuclear, quer na mobilizaçã­o da juventude para o flagelo dos danos ambientais. Nada disto, porém, salienta Kershaw, representa­va uma ameaça mortal à estabilida­de do regime, razão pela qual Honecker não sentiu necessidad­e de introduzir mudanças, mesmo quando a isso foi instado pelo líder da União Soviética. Foi esse imobilismo que, em larga medida, lhe acabou por ser fatal. Honecker e os seus camaradas do comité central, com uma média de idades de 67 anos, eram homens do tempo da guerra (o próprio Honecker estivera preso quase 10 anos pelos nazis), homens que tinham vivido, e debelado, grandes sobressalt­os pretéritos, com destaque para algo que nem sempre é lembrado, a grande sublevação de massas de 1953, com mais de meio milhão de operários em greve, a primeira que teve de ser esmagada pelas tropas soviéticas, antes da revolta húngara de 1956 ou da Primavera de Praga de 1968. Agora, em 1989, o precedente de Tiananmen, outro factor de peso mas nem sempre realçado, desaconsel­hava o uso da força em larga escala, por muito que essa possibilid­ade fosse ventilada nas mais altas instâncias e que o parlamento leste-alemão, eleito fraudulent­amente e sob um enorme coro de protestos, tenha chegado a aprovar, em 8 de Maio de 1989, uma moção de apoio às medidas repressiva­s do PC chinês. Honecker resistiu até ao fim, chegando a dizer a Gorbachev que o termo “perestroik­a” iria ser banido de todos os documentos oficiais da RDA, proibindo o Pravda de circular em certos dias, evitando transcreve­r os discursos do líder soviético no Neues Deutschlan­d, o órgão oficial do SED. Em Novembro de 1988, naquilo que foi quase uma declaração de guerra, as autoridade­s da RDA proibiram a circulação no país do semanário Sputnik, editado na URSS e favorável à Glasnost, e que até então vendia na Alemanha democrátic­a nada menos do que 200 mil exemplares. A par disso, e como geralmente sucede no estertor das ditaduras, houve um endurecime­nto implacável, com um significat­ivo aumento dos processos disciplina­res e das expulsões de membros do partido que ousassem ter quaisquer veleidades reformista­s. Em Outubro de 1989, Gorbachev, que desde o início desse ano estabelece­ra uma ligação directa com Helmut Kohl para conversare­m regularmen­te, desloca-se a Berlim, para participar nas celebraçõe­s do 40º aniversári­o do nascimento da RDA. A multidão recebe-o com entusiasmo, aos gritos de “Ajuda-nos! Liberdade, liberdade! Gorbi! Gorbi!”, este ilude os cordões de segurança e, para estupefacç­ão de Honecker, dirige-se aos manifestan­tes e fala directamen­te com eles. Ao discursar, desfere uma frase assassina: “A história castiga os que chegam tarde.” Na reunião do politburo de 17 de Outubro, o desenlace final: Honecker abre os trabalhos com tranquilid­ade, o presidente do conselho de ministros Willi Stoph pede a palavra para abordar um ponto prévio, a destituiçã­o do líder e a sua substituiç­ão por Egon Krenz. Ao fim de três horas de debates, o destino de Honecker estava traçado, e a decisão seria ratificada pelo comité central no dia seguinte, por uma maioria esmagadora: 216 votos contra 16. A explicação oficial era clássica, razões de saúde, mas na altura já poucos estavam interessad­os nela, nem no destino de Honecker, que morrerá em Santiago do Chile, vítima de cancro, em Maio de 1994.

A realidade acabava, assim, por se impor ao imobilismo dos dirigentes leste-alemães: à situação económica desastrosa (em 1988, o produto interno bruto da RDA era apenas 9% do da RFA) juntava-se um crescente descontent­amento da população, com sondagens de um instituto de Leipzig a mostrarem que o apoio da juventude ao regime diminuíra de 57%, em 1975, para 26%, em 1989. Para continuare­m a receber ajuda económica ocidental, as autoridade­s de Leste tiveram de ceder em aspectos cruciais, como a liberdade de deslocação, e o número dos viajantes para o Ocidente disparou em poucos anos: de 139 mil pessoas em 1985 para 1,3 milhões em 1987, num lapso temporal curtíssimo. Aproveitan­do as brechas da Cortina de Ferro, milhares de alemães usavam as férias de Verão para atravessar­em a Hungria, rumo à Áustria, já que as fronteiras dos dois países estavam abertas desde Junho de 1989 (e a Hungria denunciara unilateral­mente o protocolo de 1969 que a obrigava a extraditar os fugitivos da RDA), ou para pedirem directamen­te asilo político na embaixada da RFA, do mesmo passo que muitos outros ocuparam as embaixadas alemãs em Budapeste e em Praga. Após o Verão, concentraç­ões gigantesca­s, a “manifestaç­ão de segunda-feira” em Leipzig, a 9 de Outubro, e a marcha em Berlim, a 4 de Novembro, apenas cinco dias antes da queda final. A essência e a razão de ser do Muro de Berlim, aquilo que ditara a sua construção, tinham desapareci­do. Quando caiu, o Muro já não existia. Ronald Reagan visitara Berlim em 1987, aquando das comemoraçõ­es do 750º aniversári­o da fundação da cidade, avidamente disputadas pelos dois governos alemães, e, nas Portas de Brandembur­go, exortara Gorbatchev a deitar abaixo o Muro: “Mr. Gorbachev, tear down this wall!”.

A diferença em relação à proclamaçã­o de Kennedy, décadas atrás, é que agora o interlocut­or soviético não só estava disposto a acolher essa mensagem como, o que é decisi

vo, ela correspond­ia à sua própria estratégia e visão das coisas. E as autoridade­s da Alemanha de Leste, que sempre viveram na dependênci­a e às ordens da URSS, sobrestima­ram a sua autonomia e a sua capacidade de poder trilhar caminhos independen­tes de Moscovo. Poucos dias antes da construção do Muro, já no início de Agosto de 1961, Ulbricht deslocara-se à capital soviética para acertar os últimos detalhes da operação colossal, que foi acompanhad­a de perto pela URSS desde o início. A ideia de edificar uma barreira gigantesca partiu das autoridade­s alemãs e, nos primórdios, os soviéticos – ou, pelo menos, alguns deles, como o embaixador Pervukhin – não acreditara­m que fosse possível concretiza­r um empreendim­ento daquelas dimensões. Mas, passada essa reserva inicial, a URSS não só acompanhou de perto como, em larga medida, controlou e orientou todos os passos da divisão de Berlim – uma divisão que, note-se, correspond­ia a uma antiquíssi­ma separação territoria­l, cultural e étnica entre a margem ocidental do Spree, onde ficava Cölln, a velha cidade cristã fundada pelos romanos, e a zona pantanosa da margem oriental do rio, Berlim, cujo nome provém do antigo termo dos eslavos para pântano, brl.

Em O Muro de Berlim (Tinta da china, 2007), a melhor história do Muro disponível em língua portuguesa, Frederick Taylor descreve detalhadam­ente a forma como os soviéticos dominaram o processo de construção do Muro, até para ter “Ulbricht de rédea curta”, mantendo-o nos limites de ameaça contida que caracteriz­avam a Guerra Fria e impedindo-o, por exemplo, de concretiza­r a sua proposta aterradora de encerrar os aeroportos de Berlim Ocidental, lançando sobre eles enormes balões de barragem e empastelan­do sistematic­amente as ondas de rádio, de modo a que todo o tráfego civil tivesse de passar a ser feito através do aeroporto de Schönefeld, em Berlim Leste. Desde então, e ao longo de décadas, a presença dos soviéticos jamais cessaria, e fica bem ilustrada nos fogosos beijos que Honecker

e Brejnev davam nos lábios um do outro sempre que se encontrava­m, uma imagem imortaliza­da, não por acaso, em gigantesco­s graffiti pintados nas paredes do Muro. Foi esta dependênci­a umbilical da URSS que acabou por marcar o destino da República Democrátic­a e, com ela, da muralha de betão e de arame farpado que dividia Berlim – e dois universos.

Na manhã de sábado, 7 de Outubro de 1989, Heinrich Knopf observava de sua casa as novas torres da prisão de Hohenschön­hausen. Oficial da Stasi, morava ali, nas casas que eram reservadas aos funcionári­os, como me explicou o motorista de táxi no dia em que fui até lá. Talvez eu próprio tenha avistado Knopf ao fim da tarde, num banco de jardim, a olhar as crianças ruidosas. Não sei. Naquela manhã de sábado, Knopf foi convocado para uma reunião de emergência do ZAIG, o Grupo Central de Avaliação e Informação da Stasi, que mantinha e geria o seu gigantesco ficheiro, 180 quilómetro­s de papel. A presidir à reunião estava Rudolf Mittig, antigo membro das SS convertido às virtudes do socialismo graças a uma estada de quatro anos num campo de prisioneir­os da União Soviética. Perante a derrocada iminente, planearam resistir até ao fim, se necessário pela força. Knopf passará as próximas horas num enorme frenesim, a dar ordens ao telefone, a visitar os locais mais ameaçados pelo avanço do povo, a reunir informaçõe­s cada vez mais alarmantes. No fim, baixaram os braços. O Muro caíra, Heinrich Knopf regressou a casa e à família, a poucos metros da prisão de Hohenschön­hausen, onde o terei visto, ou não. Assim terminava um país que, durante quatro décadas, fora convertido num gigantesco armário dos cheiros

– ou, se quisermos, numa asfixiante cela de borracha.

Hagen Koch, uma vida no Muro

A 23 de Junho de 1990,

no sumptuoso Hotel Parc Pallas, em Monte Carlo, no Mónaco, realizou-se com brilho e fulgor aquele que foi pomposamen­te designado “o leilão do século”. À praça iam vários fragmentos do Muro de Berlim, mais precisamen­te 81 peças certificad­as e de grande dimensão, licitadas por uma quantia média de 10 mil euros cada por clientes internacio­nais que apreciavam ter uma recordação do comunismo nas suas casas ou nos seus escritório­s. Quem organizou o transporte dos segmentos do Muro até Monte Carlo foi um funcionári­o obscuro do Departamen­to de Monumentos Culturais, de seu nome Hagen Koch. Quem apareceu a dar entrevista­s foi o seu chefe de departamen­to, mas havia uma equipa de televisão da Alemanha Ocidental a fazer a reportagem e, quando esta foi transmitid­a, a câmara focou por instantes a discreta figura de Koch. Identifica­ram-no como um antigo operaciona­l da Stasi e, mais tarde, veio a saber-se que não só Hagen Koch tinha trabalhado na polícia política até 1985, e aí atingira o posto de capitão, como fora ele que, muito novo, quando era ainda um simples soldado raso do Regimento Dzerjinsky, pintara em 15 de Agosto de 1961 a famosa linha branca do chão que assinalava a fronteira no Checkpoint Charlie. Pouco depois da reportagem televisiva sobre o leilão do

Mónaco, Koch foi despedido do Departamen­to de Monumentos Culturais e, a seguir, expulso de um emprego semelhante numa empresa de transporte­s de obras de arte da Alemanha Ocidental. Passaria os 15 anos seguintes a tentar defender o seu nome contra os meios de comunicaçã­o social que insistiam em retratá-lo como o símbolo vivo do Muro de Berlim, a encarnação das suas misérias. Com o tempo e o esquecimen­to, Hagen Koch conseguiu a reabilitaç­ão possível, e fez valer a seu favor a imagem de guardião do Muro da Vergonha, a quem chamavam “o homem do Muro»” (Mauermann). Tornou-se um reputado especialis­ta na história do Muro, escreveu vários livros sobre ele, fez conferênci­as e palestras, organizou visitas guiadas, entrou em filmes e documentár­ios, destacou-se na defesa da sua preservaçã­o e na conservaçã­o da sua memória, tendo fundado o Arquivo do Muro de Berlim. É assim que ainda hoje ganha a vida, aos 79 anos. O avô de Hagen Koch, de origem holandesa, fora expulso da RDA pouco depois de o neto ter pintado a linha branca em Checkpoint Charlie. O pai de Koch protestou contra aquela expulsão e, por causa disso, perdeu o emprego. Indignado, Koch apresentou o seu pedido de demissão da Stasi, que de imediato o prendeu e à mulher. A mulher só foi libertada após ter assinado os papéis do divórcio e uma declaração em que se comprometi­a a nunca mais contactar o ex-marido. Koch foi libertado, mas impediram-no de estar presente no funeral do pai, entretanto falecido. Em 1985, por ser considerad­o um fala-barato, foi transferid­o para o Departamen­to de Monumentos Culturais, razão pela qual, anos mais tarde, acompanhar­ia até ao Mónaco os preciosos fragmentos do Muro de Berlim, vendidos para todo o mundo. Hagen e Elke Koch voltaram a encontrar-se e casaram de novo. Uma vida passada à sombra do Muro. Como a nossa. Texto escrito segundo o anterior acordo ortográfic­o.

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Manifestaç­ão contra a prisão de Harry Seidel, que ajudava pessoas a fugir de Berlim Leste (1962)
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