KOBE BRYANT: A MORTE DE UM ÍDOLO
Em 2016, Kobe Bryant terminou a carreira e afastou-se da NBA. Mas o Black Mamba decidiu voltar aos pavilhões por causa da filha Gianna, a Mambacita, que queria ser a sua sucessora.
O antigo jogador da NBA morreu num desastre de helicóptero. Com ele ia a filha Gianna, de 13 anos, que também jogava basquetebol
No dia 30 de abril de 2006, Kobe Bryant defrontou os Phoenix Suns num jogo dos play-offs da NBA. A 0,7 segundos do fim, a estrela dos Lakers empatou a partida, obrigando ao prolongamento, no qual a equipa de Los Angeles viria a ganhar com um cesto, nos últimos instantes, do Black Mamba (como ele se autoapelidou, numa referência a uma das cobras mais velozes e mortíferas do mundo).
Este seria apenas mais um grande momento da sua carreira, se não tivesse acontecido algo mais importante, que o fez sair a correr do Staples Center: a mulher, Vanessa, tinha entrado em trabalho de parto e na manhã seguinte nasceria Gianna Maria-Onore Bryant, a segunda filha do casal.
Quando Kobe Bryant venceu o seu último campeonato, em 2010, frente aos Celtics, nos festejos Gigi estava ao lado do pai a fazer o sinal de “cinco” – o número de títulos da NBA que ele tinha acabado de ganhar. No ano anterior estava ao colo do pai quando ele recebeu o troféu de MVP das finais depois de uma vitória frente aos Orlando Magic. No último domingo, dia 26, pai e filha morreram num acidente de helicóptero (que vitimou mais sete pessoas), unidos pela paixão do basquetebol: seguiam para um jogo de Gigi na Academia Black Mamba, fundada por Kobe.
A Baby Mamba, ou Mambacita – como ele lhe chamava – herdou do pai a mentalidade competitiva, o querer sempre ganhar. Em entrevista à revista New Yorker, Kobe contou
A MÃE VIU KOBE (CARNE JAPONESA) NA EMENTA DE UM RESTAURANTE E DECIDIU DAR ESSE NOME AO FILHO
um episódio em que se viu dividido entre vencer um simples jogo de tabuleiro ou deixar a filha, que na altura tinha 3 anos, levar a melhor. “Ela consegue ver que vou ganhar, por isso também vai saber se estiver a tentar não ganhar. Venci, ela ficou louca e virou o tabuleiro”, conta. “E eu pensei: ‘Bolas, é igualzinha a mim.’”
Gianna foi a única das quatro filhas – Natalia, a mais velha, tem 17 anos; Bianka tem 3 e Capri nasceu em junho de 2019 – a seguir as pisadas do pai no basquetebol, a verdadeira herdeira do talento e legado de Kobe. E nunca teve medo de o assumir. “Quando os fãs vêm ter comigo e me dizem que tenho de ter um filho para continuar a tradição, ela diz: ‘Ei, eu trato disso!”, afirmou no programa de Jimmy Kimmel.
O legado de Kobe Bryant
Com 41 anos, Kobe Bryant deixa o mundo como uma lenda do basquetebol: cinco campeonatos da NBA – apenas menos um do que o “irmão mais velho” Michael Jordan -; dois prémios de MVP [melhor jogador] nas últimas duas conquistas, em 2009 e 2010; MVP na época de 2008; e duas vitórias nos Jogos Olímpicos, em Pequim 2008 e em Londres 2012. Mas a sua carreira não é definida apenas pelas conquistas. Chegado à NBA com apenas 17 anos, rapidamente foi comparado a Jordan, o seu ídolo. Alheio a comparações, construiu o seu próprio caminho ao longo de 20 anos com a camisola dourada e roxa dos Lakers.
A sua ética de trabalho, os sacrifícios em prol do clube e a sua vontade de querer vencer sempre, a autodenominada Mentalidade Mamba, sobressaíram.
Na memória ficam momentos como os primeiros três campeonatos, entre 2000 e 2002, com Shaquille O’Neal e Phil Jackson; os 81 pontos frente aos Toronto Raptors em 2006 – ainda hoje a segunda maior pontuação individual de sempre num jogo da NBA, só atrás dos 100 de Will Chamberlain –; e
os dois últimos títulos, em 2009 e 2010, já como líder da equipa.
No dia anterior à sua morte, Kobe tinha sido ultrapassado pelo seu sucessor nos Lakers, LeBron James, na lista de melhores marcadores de sempre da NBA – passou para o 4º lugar, com 33.643 pontos. Depois de terminar a carreira, em 2016, num último jogo em que marcou 60 pontos já com os joelhos desgastados e um tendão de Aquiles acabado, virou costas à NBA e aos Lakers – mas a filha não deixou
que se afastasse do desporto.
A paixão pelo basquetebol
Numa entrevista, Kobe confessou que não gostava de ver jogos de basquetebol até a filha ganhar a mesma paixão e curiosidade pelo desporto. Tornou-se então treinador de Gianna, na academia fundada por ele, e até já tinha planos futuros para que Mambacita, que tinha 13 anos, entrasse na Universidade do Connecticut, onde jogaram lendas do basquetebol feminino como Diana Taurasi, com o sonho de se tornar uma estrela da WNBA. Gianna herdou também a coragem e o respeito e nunca se escondia na hora de o defender, como aconteceu numa visita à Disneyland. “Os fãs no parque de diversões estavam a gritar: ‘És o GOAT [bode, na tradução para inglês]! És o GOAT’”, contou Kobe Bryant. “Ela virou-se para mim e comentou: ‘Que malcriados!’” Foi nesse momento que lhe explicaram que GOAT era uma sigla de Greatest Of All Time [Melhor de Todos os Tempos].
A última aparição pública de ambos foi a 29 de dezembro de 2019, quando se sentaram na primeira fila do Staples Center, em Los Angeles, para o jogo entre os Lakers e os Mavericks de Luka Doncic, um dos jogadores favoritos da Baby Mamba. Na semana anterior, tornou-se viral um vídeo em que Kobe e Gianna discutiam táticas durante outro jogo, entre os Atlanta Hawks e os Brooklyn Nets, em Nova Iorque. Aí, mais do que o amor entre pai e filha, ficou demonstrada a paixão pelo basquetebol e a vontade de aprender cada vez mais, a Mentalidade Mamba que estava no sangue de ambos: entre a sabedoria de um dos maiores ídolos da NBA e a esperança de quem se queria tornar uma das melhores jogadoras que o desporto viu – um GOAT, tal como o pai. W