AOS 25 ANOS, MADISON STEWART MERGULHA COM TUBARÕES E CRIOU UM PROGRAMA QUE TRANSFORMA PESCADORES EM GUIAS TURÍSTICOS
Desde miúda que Madison Stewart mergulha e que se dedica a proteger a espécie mais temida e incompreendida. Quer acabar com o tráfico de barbatanas.
Faz festas a tubarões mas ainda tem os dedos todos. Mergulha com eles todas as semanas e já viu um tão grande que parecia uma baleia. Afinal era um tubarão-martelo com uma cabeça de quase um metro. Mesmo assim sabe que há riscos e que quando a água está turva não é seguro. Muito menos se os tubarões estiverem agitados e com muitos peixes por perto. Madison Stewart diz que os tubarões são incompreendidos e que um dos grandes mitos sobre eles é que assim que veem uma pessoa na água atacam. “Isso não é verdade, a maioria dos tubarões estão mais assustados connosco do que nós com eles. Aliás, assim que nos veem, fogem.” Caso isso não aconteça e note que algo não está bem, Madison – que mergulhou pela primeira vez aos 12 anos, na costa australiana – tem uma dica simples: basta sair da água. Mas há mais estratégias. “Estabeleça um contacto visual, não faça movimentos bruscos e aproveite.”
Depois de tantos filmes como o famoso Tubarão, de Steven Spielberg, é difícil encarar um peixe com 3 mil dentes em forma de serrilha e um porte de 2 toneladas como algo tão simpático como um golfinho. Mas a mergulhadora e ambientalista australiana quer ajudar-nos a pensar de outra forma. “Gosto de tubarões porque eles nunca recebem a atenção que merecem, são os underdogs, e merecem amor. As pessoas pensam Q
“A MAIORIA DOS TUBARÕES ESTÃO MAIS ASSUSTADOS CONNOSCO DO QUE NÓS COM ELES. ASSIM QUE NOS VEEM FOGEM”
Q sempre nos golfinhos como incríveis e fofinhos e que os devem proteger, nunca ouves ninguém a dizer isso dos tubarões”, explica por email à SÁBADO.
A verdadeira sharkgirl
A australiana reconhece que há riscos nos mergulhos que faz e diz que a espécie mais perigosa é o tubarão-galha-branca-oceânico. Porquê? “Eles vivem em oceanos abertos e profundos e são o tipo de tubarão que vasculha à procura de presas e muitas vezes fazem vítimas entre os que sofrem acidentes de avião e naufrágios.” Ainda assim, em 2019, apenas duas pessoas morreram vítimas de ataques de tubarão. Em 2018, tinham sido quatro.
Conhecida como sharkgirl (rapariga-tubarão), dá a conhecer o seu trabalho no Instagram na página sharkgirlmadison e junta mais argumento à defesa da espécie. Todos os anos são mortos 100 milhões de tubarões e a maioria é perseguida por causa das suas barbatanas – servidas em forma de sopa na Ásia e até vendidas como mezinhas para rejuvenescer. Um número tão grande deve-se ao facto de a família dos tubarões ser grande. Até inclui aquele que se come muito bem na sopa: o cação. Existem centenas de espécies diferentes. E sendo um animal que colhe pouco a simpatia, acaba mais rapidamente no prato ou ao pescoço
TODOS OS ANOS SÃO MORTOS 100 MILHÕES DE TUBARÕES E A MAIORIA É PERSEGUIDA POR CAUSA DAS BARBATANAS
de alguém em forma de colar.
É contra tudo isto que Madison luta. Diz que tem de agradecer aos pais, que descreve como “um pirata velho e salgado” e uma “hippie que bebe chá e faz ioga”, por lhe ensinarem a respeitar o oceano. Foram eles que a incitaram a mergulhar e chegaram mesmo a viver num veleiro.
Foi aos 14 anos que se apercebeu da situação dos tubarões. “Sempre mergulhei em recifes e vi os tubarões a desaparecerem.” O declínio das espécies é algo que tenta travar. Por exemplo, um estudo revela que entre 1970 e 2005, o número de tubarão-martelo e de tubarão-tigre diminuiu 97% só na costa leste dos EUA. Já este ano a União Internacional para a Conservação da Natureza revela que 17 espécies de tubarões e raias entraram na Lista Vermelha das espécies em risco.
Reconverter pescadores
Madison resolveu pôr mãos à obra com uma ideia, à partida, simples. Depois de ter mergulhado no mar da Indonésia, descobriu que aquele era o mercado com maior tráfico de tubarões (ver caixa) e decidiu começar por aí. “Primeiro fiz-me passar por turista, para ganhar a confiança dos pescadores locais, depois dei-lhes uma nova oportunidade de trabalho”, explica.
A australiana reconverteu pescadores de tubarões em guias turísticos. Foi em 2018 que reuniu uma pequena equipa e viajou até à aldeia piscatória de Lombok. Quando viu os mercados indonésios cheios de tubarões mortos e cortados às postas para vender as caudas ficou chocada. Então e como é que uma miúda de 25 anos convence pescadores habituados a pescar tubarões a mudar de vida? Com novos empregos e melhores ordenados. Em vez de ganharem 91 euros por duas semanas de trabalho a capturar tubarões, ela ofereceu-lhes mais. Não diz quanto, mas mais dinheiro. O Projeto chama-se Hiu (que quer dizer tubarão em indonésio) e já tem 30 trabalhadores e mais de 100 passeios realizados. Madison sabe que é uma gota no oceano, mas ajuda a mudar mentalidades e “melhora a forma como as pessoas olham para a conservação e lidam com estas questões: com compaixão e não com ódio”. W