O GRANDE DESAFIADOR DA TESLA
Tem a Ford e a Amazon como sócios, é inovador e controlador e a sua tecnologia pode mudar o mercado. Conheça R. J. Scaringe. Ele andou 10 anos a preparar-se para isto.
SCARINGE E O PAI PEDIRAM CRÉDITOS DANDO A CASA COMO COLATERAL
Jovem com apelido de vilão de filme de James Bond, R. J. Scaringe tinha 26 anos quando fundou, em 2009, uma empresa de fabrico de carros. Na crise do subprime nenhum investidor queria estar perto da indústria automóvel e Scaringe e o pai pediram empréstimos dando a casa como garantia, juntando o dinheiro de familiares e amigos. O projeto quase morreu. Scaringe liderou a pequena equipa que trabalhou dois anos e meio no desenvolvimento de um novo desportivo com consumo energético eficiente e desistiu quando este estava pronto, depois de uma estirada final de quatro noites sem ir a casa dormir. A explicação do empresário para o passo dramático que surge em todos os media internacionais é romântica: “No meu coração e na minha cabeça eu sabia que não estava a responder à questão fundamental de saber por que razão o mundo precisa que esta companhia tivesse sucesso.”
Nove anos depois esse sucesso está em vias de se concretizar. Scaringe reuniu mais de 3,6 mil milhões de dólares de investimento, tem dois modelos de topo de carro elétrico em produção e ameaça incomodar a Tesla de Elon Musk.
Depois do abandono do modelo em 2011, o pequeno grupo de empregados de Scaringe ficou com ele, até quando a empresa foi deslocada para outro estado, o Michigan. O New York Times conta que a dada altura todos partilharam uma casa nos subúrbios de Detroit, em que falavam de carros “ao pequeno-almoço, ao almoço e ao jantar”. A empresa mudou de foco e passou a centrar-se no desenvolvimento de carros elétricos inovadores. O renascimento meticuloso do projeto trouxe talento – um engenheiro Q
Q da McLaren, um designer da Jeep – e novos financiadores: um grupo de investimento saudita com ligações fortes ao prestigiado MIT (o Instituto de Tecnologia onde Scaringe se doutorou), a japonesa Sumitomo e o Standard Chartered Bank, que juntos aplicaram 400 milhões de dólares.
A empresa mudou também de nome: Rivian, inspirada no condado Indian River, na Flórida, onde Scaringe cresceu. Se ainda não ouviu falar dela é natural: ainda não há carros na estrada, nem à venda (só em pré-encomenda). A empresa não levantou ondas durante a década em que esteve a trabalhar nos modelos e a marca só rebentou nos media em 2018, na apresentação dos carros na feira automóvel de Los Angeles.
Reconstruir Porsches
Os primeiros dois modelos são uma pickup desportiva (R1T) que transpira agressividade e um SUV desportivo de sete lugares muito à imagem de um Range Rover (R1S). Scaringe espera vender 20 mil carros no próximo ano e 45 mil em 2022, totalizando 4,2 mil milhões de dólares. A Rivian vai fazer ainda 100 mil furgonetas elétricas para um cliente especial: a Amazon de Jeff Bezos, que o ano passado se tornou acionista do fabricante ao investir 700 milhões de dólares.
Para Bezos, parte da ideia é reduzir a pegada de carbono da rede logística da empresa.
O retrato de R. J. Scaringe pintado nos media norte-americanos começa sempre no mesmo ponto: tinha 18 anos quando soube que queria começar uma companhia de automóveis, depois de já ter alguma experiência enquanto adolescente a restaurar Porsches, sob a batuta de um vizinho. “O meu favorito era um speedster do fim dos anos 50”, contou à Forbes. O jovem foi montando um plano ao longo da sua formação académica, que culminou no MIT onde ganhou armas técnicas para cumprir o sonho, ao doutorar-se em Engenharia Mecânica no prestigiado Sloan Automotive Lab.
O outro traço de Scaringe comum em todos os retratos é a tensão entre a sua paixão por automóveis e o papel destes na poluição e nas alterações climáticas. A mudança de foco da Rivian para os elétricos é atribuída pelo próprio à decisão de causar impacto positivo na indústria.
O design, o preço mais baixo (entre 68 mil e 72 mil dólares nos EUA), a potência (3 segundos dos 0 aos 100 km/h) e a autonomia até 640 quilómetros são pontos fortes do SUV e da primeira pickup elétrica do mundo, mas a ameaça principal para o líder Tesla vem de outro lado. O chassis, que apelida de skateboard – que junta bateria, suspensão, travões e outros componentes
A RIVIAN PODE VENDER CARROS E NÃO SÓ: QUER TER NO MERCADO A TECNOLOGIA DO CHASSIS
abaixo da altura das rodas baixando o centro de gravidade do carro e dando mais espaço e melhor condução – é um produto em si. Por outras palavras: a Rivian pode vendê-lo a outras empresas o que, se resultar, será um acelerador para vários fabricantes entrarem mais a fundo neste mercado, com os seus próprios elétricos. “Podemos alavancar a nossa tecnologia skateboard na totalidade ou vender partes, como o pack de bateria”, explicou Scaringe à Forbes.
Tudo isto dependerá do teste ao desempenho real dos carros que vão começar a chegar ao mercado no fim deste ano, se a crise de saúde pública do novo coronavírus não atrasar o plano.
O fundador da Rivian é descrito nos media nos tons habituais deste tipo de personalidade: suscita a admiração dos trabalhadores, gosta do lado da mecânica, mas também é craque no marketing e controla todos os aspetos do negócio. O New York Times indica que nem a cor dos azulejos da casa de banho passou sem Scaringe entrar no assunto. “É incrível a quantidade de informação que ele consegue absorver”, contou ao jornal em 2019 um dos diretores da empresa. O sacrifício é feito na vida pessoal: é casado e tem três filhos, o mais velho com apenas 3 anos. “A Rivian é 100% do meu tempo menos a família”, contou ao NYT.
Para a família, estima, ficam 5%. W