Falar claro sobre a China
Adescoberta da origem exata do vírus SARS-CoV-2 não é, neste momento, uma prioridade. Mas virá a sê-lo, na ordem político-social e económica que se segue.
Na verdade, não será possível olhar a República Popular da China com olhos de normalidade, sem que haja um esclarecimento absoluto, transparente e independente de tudo o que se passou.
Isto é ainda mais importante para Portugal, um dos países da União Europeia com importantes investimentos chineses em diversos setores da economia e finanças.
Falemos sem papas na língua. A possibilidade de a China, como Estado, ter desencadeado uma ofensiva com uma arma biológica é injuriosa e difamatória, desmentida pelos factos e logicamente impossível.
Injuriosa: acusaria de guerra contra a humanidade uma nação antiga, membro da ONU, com relações diplomáticas em todos os países do mundo. Isto fica dito, independentemente das críticas ao regime de Pequim, que são muitas, profundas e conhecidas.
Sem factos: na verdade, todas as análises feitas à estrutura do vírus, comunicadas pelos centros de estudo especializado e combate a doenças, dos EUA, Coreia do Sul, Taiwan e Alemanha, afirmam ser o mesmo a combinação de diversos elementos presentes no VIH e na malária, em anteriores coronavírus, e aparentando uma construção “natural”, não laboratorial nem manipulada.
Ilógica: iria um Estado bioagressor começar por exterminar a sua própria população, infetar 83 mil almas de uma das zonas mais desenvolvidas do país, e matar cerca de 5 mil? Iria esse mesmo Estado, empenhado no projeto Rota da Seda e no co
mércio global, na venda externa dos seus produtos e tecnologias, destruir os mercados, as pessoas e os capitais de que precisa para se desenvolver? Iria a China correr o risco de se precipitar numa das maiores crises da sua história recente, com queda de 6,8% do PIB, e a primeira retração económica em quase 40 anos de modernização?
Dito isto, porém, existe um direito à verdade. Sempre no domínio dos factos, é indesmentível que o vírus seja originário de território chinês. E que preexistiu à infeção na Europa, mais vasta nos países com maiores comunidades, ou populações turísticas flutuantes, de origem chinesa.
No dia 17 de novembro de 2019, ter-se-á detetado, em Wuhan, o chamado “doente zero”. A 16, segundo a professora Ai Fen, chegou o primeiro teste laboratorial, no Hospital Central da cidade. Nos quatro dias seguintes, registaram-se 60 casos, nesta capital da rica província de Hebei. A 30, o Instituto Virológico de Wuhan (IVW) recebe a primeira amostra do vírus, e três dias depois descobre o seu genoma.
A 9 de janeiro de 2020, o vírus e a doença são integrados na base nacional de dados médicos. Dois dias depois, Pequim comunica o caso à OMS. Mas esta anuncia, três dias a seguir, que não há transmissão entre humanos. No dia 20, com ar grave, Xi Jinping revela a epidemia, já com 3 mil vitimados.
A tese comum, na altura, era a de que o vírus nasce da transmissão do morcego ao humano, através de um intermediário animal, provavelmente o pangolim ou a cobra, e que a ingestão de todos esses estava ligada ao chamado “mercado húmido” de Huanan, em Wuhan, nas margens do Yang-Tsé. Parecia também ser essa a teoria da professora Shi Zhengli, a investigadora do IVW que mais se dedicara ao estudo das infeções através de morcegos. Estes animais são sempre a chave: direta ou indiretamente estiveram na origem do Hendra (1994), Nipah (1998), SARS (2002), MERS (2012) e ébola (2014).
Mas há dois meses, o professor Xiao Botao, da Universidade Tecnológica do Sul da China (UTSC), sediada em Guangzhou, publica uma extensa investigação, na qual afirma que, entre as hipóteses de origem do vírus, tem de se tomar em conta a possibilidade laboratorial.
E explica que, além do IVW, existiam em torno da praça de peixe de Huanan, nada menos do que três centros de análise virológica, um deles a menos de 300 metros do mercado. W