SÁBADO

DA LOTA AO PRATO, BEM FRESQUINHO

Mesmo confinado, não há razão para dispensar o que o mar dá. As peixarias reforçaram os serviços e o peixe que todos os dias chega fresco aos mercados pode também ir diretament­e até sua casa.

- Por Filipa Teixeira

CARLA ESTÁ na fila para o peixe. É uma fila modesta. Por estes dias não entram mais de 20 clientes no Mercado de Matosinhos que, ao contrário da azáfama das semanas de pré-confinamen­to, em que as pessoas se debruçavam e cirandavam livremente pelas bancas dos frescos, respira uma calma e um distanciam­ento que é respeitado por clientes e vendedores.

“Para grelhar, tem a dourada, o robalo, o regado ou o rodovalho; para fritar, uma fanequinha, umas azevias ou a marmota; e, para assar no forno, pode ir para o cantaril”

“Antes disto havia mais pessoas a vender”, nota Carla, que, sendo filha de uma família piscatória, não prescinde do peixe na sua dieta alimentar. “Como peixe umas cinco a seis vezes por semana”, diz, olhando do alto dos seus 43 anos para os tempos em que era pequenina e, tal como agora, se deliciava com as sardinhas e os carapaus da nossa costa.

Passando os olhos pelas bancas que se estendem no rés do chão do mercado veem-se escamas de vários géneros. “Para grelhar tem a dourada, o robalo, o pregado ou o rodovalho; para fritar uma fanequinha, umas azevias ou a marmota; e, para assar no forno, pode ir para o cantaril”, aponta Maria Carolina da Silva Santos, proprietár­ia com bancada em nome próprio que, à semelhança de quase todas as bancas do mercado, faz entregas ao domicílio.

A variedade não é tanta como dantes – “pode ser do tempo, do mar que não está bom para sair para a pesca ou dos pescadores que foram obrigados a parar por causa do vírus”, explica prontament­e – mas isso não afetou a procura, nota a vendedora de 64 anos.

“Pelo contrário”, ouvimos

desta feita a vizinha do lado, Rita Ferreira, enquanto amanha uma grande pescada. “Muita gente que dantes ia ao supermerca­do, agora vem aqui” – e as encomendas, acrescenta, ajudam a melhorar a faturação ao fim do mês.

“O nosso mar dá muito bom peixe” e Rita e a mãe, Helena Cadilho, tratam de o escolher na lota, arranjar e deixar pronto para quem ali o queira levantar ou encomendar para casa (pelo 914 530 768).

“AGORA JÁ SE COMEÇA A VER MAIS FREGUESES”

Contudo, nem todas as vendedoras partilham do ânimo de Rita e Maria Carolina. Ainda em Matosinhos, Cristina de Jesus lamenta a perda de receitas. “Tinha dois restaurant­es para os quais vendia todas as semanas e que agora estão fechados. E os clientes, é o que se vê”, declara, apontando com desalento para o vazio. “Tenho os meus peixes com preço acessível”, defende, enquanto vai mostrando a vivacidade das suas cavalas, da pescada ou do peixe-galo, que, quando vem com as “mílharas” (termo usada no Norte para significar ovas) “dá para fazer uma boa açorda”.

Como está sozinha no negócio, não pode fazer entregas ao domicílio, mas o telemóvel anda sempre no bolso para Q

“O nosso mar dá muito bom peixe”, garantem Rita Ferreira e a mãe, Helena Cadilho, que trabalham juntas, escolhendo diariament­e na lota o peixe que amanham no mercado

Q quem queira encomendar (pelo 910 092 872) e levantar o pedido à porta.

De Matosinhos para o Bolhão, no centro do Porto, sucedem-se as odes ao mar e as pragas ao novo coronavíru­s. “Esta é uma luta sem armas e contra um inimigo que ninguém vê”, resmunga Sara Araújo, segunda geração de três inteiramen­te dedicadas ao peixe. “Tenho 48 anos e já cá estou há 30, veja bem!”

Destas três décadas a vender no mercado, dificilmen­te se consegue lembrar de uma fase tão difícil para o negócio como esta: “Tive uma quebra de 70% na faturação.” A “culpa” é da falta de turistas e do fecho dos restaurant­es. Ainda assim, não baixa os braços: “Os clientes de idade mantiveram-se comigo.” Porém, em vez de irem até à banca de

Sara Araújo teve “uma quebra de 70% na faturação”, por “culpa” da falta de turistas e do fecho de restaurant­es, devido à pandemia de Covid-19

Sara, é Sara que lhes leva o peixe até casa (basta ligar para o 960 151 173).

O mesmo acontece com a peixaria Bininha, uns metros ao lado, que vai respirando com um pouco mais de alívio nestes últimos dias: “Agora já se começa a ver mais fregueses.”

Para esses fregueses, ora os que namoram a sua banca, ora os que ligam a encomendar (pelo 912 721 984), tem sempre uma montra recheada de peixe fresco de Matosinhos. W

 ??  ??
 ??  ?? Cristiana trabalha na Topeixe, uma das bancas do Mercado de Matosinhos que aceita encomendas (918 271 278)
Cristiana trabalha na Topeixe, uma das bancas do Mercado de Matosinhos que aceita encomendas (918 271 278)
 ??  ?? Além das espécies regulares, Rita Ferreira tem sempre peixe da estação, como o sável e a lampreia
Além das espécies regulares, Rita Ferreira tem sempre peixe da estação, como o sável e a lampreia
 ??  ?? Vendedora no Mercado de Matosinhos, Maria Carolina Santos prepara o peixe para os clientes em banca e para as encomendas
Vendedora no Mercado de Matosinhos, Maria Carolina Santos prepara o peixe para os clientes em banca e para as encomendas
 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Portugal