DA LOTA AO PRATO, BEM FRESQUINHO
Mesmo confinado, não há razão para dispensar o que o mar dá. As peixarias reforçaram os serviços e o peixe que todos os dias chega fresco aos mercados pode também ir diretamente até sua casa.
CARLA ESTÁ na fila para o peixe. É uma fila modesta. Por estes dias não entram mais de 20 clientes no Mercado de Matosinhos que, ao contrário da azáfama das semanas de pré-confinamento, em que as pessoas se debruçavam e cirandavam livremente pelas bancas dos frescos, respira uma calma e um distanciamento que é respeitado por clientes e vendedores.
“Para grelhar, tem a dourada, o robalo, o regado ou o rodovalho; para fritar, uma fanequinha, umas azevias ou a marmota; e, para assar no forno, pode ir para o cantaril”
“Antes disto havia mais pessoas a vender”, nota Carla, que, sendo filha de uma família piscatória, não prescinde do peixe na sua dieta alimentar. “Como peixe umas cinco a seis vezes por semana”, diz, olhando do alto dos seus 43 anos para os tempos em que era pequenina e, tal como agora, se deliciava com as sardinhas e os carapaus da nossa costa.
Passando os olhos pelas bancas que se estendem no rés do chão do mercado veem-se escamas de vários géneros. “Para grelhar tem a dourada, o robalo, o pregado ou o rodovalho; para fritar uma fanequinha, umas azevias ou a marmota; e, para assar no forno, pode ir para o cantaril”, aponta Maria Carolina da Silva Santos, proprietária com bancada em nome próprio que, à semelhança de quase todas as bancas do mercado, faz entregas ao domicílio.
A variedade não é tanta como dantes – “pode ser do tempo, do mar que não está bom para sair para a pesca ou dos pescadores que foram obrigados a parar por causa do vírus”, explica prontamente – mas isso não afetou a procura, nota a vendedora de 64 anos.
“Pelo contrário”, ouvimos
desta feita a vizinha do lado, Rita Ferreira, enquanto amanha uma grande pescada. “Muita gente que dantes ia ao supermercado, agora vem aqui” – e as encomendas, acrescenta, ajudam a melhorar a faturação ao fim do mês.
“O nosso mar dá muito bom peixe” e Rita e a mãe, Helena Cadilho, tratam de o escolher na lota, arranjar e deixar pronto para quem ali o queira levantar ou encomendar para casa (pelo 914 530 768).
“AGORA JÁ SE COMEÇA A VER MAIS FREGUESES”
Contudo, nem todas as vendedoras partilham do ânimo de Rita e Maria Carolina. Ainda em Matosinhos, Cristina de Jesus lamenta a perda de receitas. “Tinha dois restaurantes para os quais vendia todas as semanas e que agora estão fechados. E os clientes, é o que se vê”, declara, apontando com desalento para o vazio. “Tenho os meus peixes com preço acessível”, defende, enquanto vai mostrando a vivacidade das suas cavalas, da pescada ou do peixe-galo, que, quando vem com as “mílharas” (termo usada no Norte para significar ovas) “dá para fazer uma boa açorda”.
Como está sozinha no negócio, não pode fazer entregas ao domicílio, mas o telemóvel anda sempre no bolso para Q
“O nosso mar dá muito bom peixe”, garantem Rita Ferreira e a mãe, Helena Cadilho, que trabalham juntas, escolhendo diariamente na lota o peixe que amanham no mercado
Q quem queira encomendar (pelo 910 092 872) e levantar o pedido à porta.
De Matosinhos para o Bolhão, no centro do Porto, sucedem-se as odes ao mar e as pragas ao novo coronavírus. “Esta é uma luta sem armas e contra um inimigo que ninguém vê”, resmunga Sara Araújo, segunda geração de três inteiramente dedicadas ao peixe. “Tenho 48 anos e já cá estou há 30, veja bem!”
Destas três décadas a vender no mercado, dificilmente se consegue lembrar de uma fase tão difícil para o negócio como esta: “Tive uma quebra de 70% na faturação.” A “culpa” é da falta de turistas e do fecho dos restaurantes. Ainda assim, não baixa os braços: “Os clientes de idade mantiveram-se comigo.” Porém, em vez de irem até à banca de
Sara Araújo teve “uma quebra de 70% na faturação”, por “culpa” da falta de turistas e do fecho de restaurantes, devido à pandemia de Covid-19
Sara, é Sara que lhes leva o peixe até casa (basta ligar para o 960 151 173).
O mesmo acontece com a peixaria Bininha, uns metros ao lado, que vai respirando com um pouco mais de alívio nestes últimos dias: “Agora já se começa a ver mais fregueses.”
Para esses fregueses, ora os que namoram a sua banca, ora os que ligam a encomendar (pelo 912 721 984), tem sempre uma montra recheada de peixe fresco de Matosinhos. W