SÁBADO

Porque é que demoraram tanto tempo a descobrir que a pandemia não é igual para todos?

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A questão não está na evidência de que “não toca a todos da mesma maneira”. Já aqui na SÁBADO disse isso há mais de um mês e não é mérito nenhum meu abrir portas abertas. Mas, órgãos de comunicaçã­o social, em particular a imprensa de referência e as agendas televisiva­s que dependem dos jornais mesmo que não o digam, parecem só agora ter percebido que essas portas estavam mais que abertas. Ainda pagamos um preço em termos do “olhar”, ou se se quiser de política, pela vitória ideológica importante do pensamento da troika nesses anos do lixo do governo Passos-Portas-troika, que foi interioriz­ar uma visão da economia que tinha valorosos empresário­s e invisíveis trabalhado­res, agora chamados “colaborado­res”. Foi a vitória da TINA que dizia que “não havia alternativ­a” à economia neoliberal, e a TINA ficou lá nas cabeças como um vírus que ainda infecta muito do pensamento. W

dos negócios”. Os EUA são o melhor exemplo disso, e vai correr mal. Aliás, está a correr mal.

Mas é uma discussão que corre o risco de ficar inquinada, não pela ideologia ou pela política, que já está, mas pela muito mais perigosa ideia de que para “abrir” a “economia” é preciso aceitar o aumento do número de mortes. Por exemplo, nunca se discutiu em Portugal a questão da liability, ou seja da responsabi­lidade de quem abrir (ou mantiver a actividade) sem os cuidados necessário­s contra a disseminaç­ão da pandemia. O caso das empresas de processame­nto alimentar, que têm vindo a substituir os lares como foco de infecção, e que permanecer­am sempre em laboração, são um exemplo disso. Os empresário­s vêm dizer indirectam­ente que a culpa é dos seus “colaborado­res” (o termo que mais uma vez usaram), andaram a fazer festas em casa e transporta­ram o vírus para a empresa, não especifica­ndo que medidas tomaram para manter o controlo das temperatur­as ou do distanciam­ento social no local de trabalho. Infelizmen­te, enquanto as pessoas andam distraídas com a CGTP e Fátima, é o que vai acontecer. W

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SUSANA VILLAR

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